quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Combustível usado (urânio) de Angra 2 é transferido para Unidade de Armazenamento a Seco (UAS)

 


O sétimo casco com combustíveis usados (urânio enriquecido) da usina nuclear Angra 2, em Angra dos Reis (RJ), acaba de ser transferido para a Unidade de Armazenamento a Seco (UAS). A transferência dos elementos combustíveis abre espaço na piscina de Angra 2, e também abrirá na usina Angra 1, para que outros elementos combustíveis usados possam ser armazenados nesses locais. As informações foram confirmadas pela Eletronuclear, gestora das usinas atômicas, que garante a segurança do empreendimento e das operações de transferência de combustíveis.  A construção da UAS envolve US$ 50 milhões. . 

Inicialmente, a UAS contará com 15 módulos. No total, 288 elementos combustíveis serão retirados de Angra 2 e 222, de Angra 1, abrindo espaço nas piscinas de armazenamento para mais cinco anos de operação de cada planta. O depósito comporta até 72 módulos, com capacidade para armazenar combustível usado até 2045. A tecnologia é da empresa norte-americana Holtec, que participa da operação com 50 profissionais; outros 20, são da Eletronuclear.

Chamados de Hi-Storms, os cascos são recipientes com duas paredes cilíndricas de aço preenchido com 70 centímetros de concreto de alta densidade, empregados para transportar os elementos combustíveis usados das piscinas das usinas à UAS. Segundo a Eletronuclear, os combustíveis usados são inseridos em cânisteres de aço inoxidável, totalmente selado, que, por sua vez, são inseridos nos Hi-Storms. E assim são transportados e armazenados sobre a laje da UAS. 

De acordo com a estatal, a transferência funciona da seguinte forma. Na piscina, os combustíveis usados são inseridos em um cânister, que, por sua vez, está acondicionado dentro de um recipiente chamado Hi-Trac. Cada cânister tem capacidade para conter 32 elementos combustíveis usados. Em seguida, o conjunto é retirado da piscina, o cânister é fechado e lacrado via solda, a água é removida de seu interior e gás hélio é inserido, para não haver corrosão no elemento combustível. 

“Esse container é transferido do Hi-Trac para o Hi-Storm, invólucro de concreto especial reforçado, que recebe uma tampa, parafusada no recipiente. Na sequência, o Hi-Storm é levado à UAS em um carro de transferência, é içado e posicionado numa laje, onde permanecerá, concluindo o processo. 

A construção da UAS foi anunciada pelo blog na edição de 4 de agosto de 2018. Desde então foram movidas ações na Justiça contestando a segurança do empreendimento e a transferência do combustível; enquanto ambientalistas alertavam contra os perigos de contaminação radioativa para a população. 

Leia no blog: Brasil constrói depósito para combustível nuclear de Angra 1 e Angra 2 (04/08/2018); Angra 1 recebe combustível nuclear – Usinas nucleares: construção do depósito de combustível usado vai começar (29/10/2019); Começa em outubro treinamento inédito de pessoal para transferir combustível  usado (urânio) de Angra 1 e Angra 2 para Unidade de Armazenamento a Seco (15/09/2020); Procurador da República quer informações sobre segurança do depósito para urânio irradiado de usinas nucleares Angra 1 e Angra 2 (16/09/2020); Procurador da República move ação visando parar obras de UAS para armazenar urânio usado de Angra 1 e Angra 2, por falta de licenças ambientais (13/10/2020). 

FOTO: Eletronuclear – Cascos UAS.

quarta-feira, 29 de setembro de 2021

Dois ministros, promessas antigas e um projeto de reator para salvar vidas parado

 


Poucos projetos nacionais são tão mencionados em discursos dentro e fora do Brasil, como o Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), que tornaria o país autossuficiente na produção de radioisótopos utilizados na Medicina Nuclear para o diagnóstico e tratamento contra o câncer. Pode ter passado despercebido, mas na semana passada, na Conferência Geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), em Viena, na Áustria, o ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque, fez questão de mencionar o RMB como prioridade de sua gestão. 

Em audiência na Câmara dos Deputados, anteontem (27/9), para explicar sobre a falta recursos destinados à produção de radioisótopo no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares da Comissão Nacional de Energia Nuclear (IPEN-CNEN), o ministro da Ciência Tecnologia e Inovações, Marcos Pontes, voltou a lembrar que o Brasil depende do RMB para alcançar a sua independência no produção dos radioisótopos. 

Quem está sentindo o problema na pele é a população doente que na semana passada esteve na iminência de parar o tratamento por falta de radiofármacos (medicamentos) produzidos a partir dos radioisótopos, lembrou um médico da área da medicina nuclear. Os radioisótopos possibilitam que os médicos vejam o funcionamento de órgãos e tecidos vivos por meio de imagens como as tomografias, radiografias e cintilografias. O problema da falta de verba foi resolvido momentaneamente com a liberação de R$ 19 milhões para o IPEN. 

Em 10 dias, se outros R$ 34 milhões não forem liberados, o risco do desabastecimento volta a ocorrer. Logo em seguida serão necessários R$ 55 milhões para atender à demanda dos pacientes até o final do ano, comentou Marcos Pontes.  O valor liberado pelo governo este ano foi de cerca de R$ 63 milhões, muito aquém do necessário. Na Câmara, os parlamentares criticaram Marcos Pontes, que não teria levado a gravidade do problema ao Congresso. 

IMPORTAÇÃO - 

O IPEN produz uma parte dos radioisótopos, mas gasta cerca de R$ 60 milhões (de acordo com a alta do dólar) importando o produto da África do Sul, Rússia, Holanda e Argentina. O Brasil importa 4% da produção mundial do radioisótopo molibdênio-99. O decaimento radioativo do molibdênio-99 produz o radioisótopo tecnécio-99m utilizado nos radiofármacos mais empregado na medicina nuclear. Até o ano passado o IPEN gastava US$ 15 milhões por ano com essa importação, que gerava um faturamento de R$ 120 milhões, ano, recursos que seguiram direto para o caixa do governo. 

Para se ter ideia da importância do RMB, basta verificar a demanda dos radioisotipos para a população. Cerca de dois milhões de procedimentos médicos são realizados, por ano, utilizando radioisótopos, em 440 clínicas cadastradas para realizar o trabalho semanalmente. Cerca de 440 mil pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e o restante pela rede privada. 

TIRADO DA CARTOLA - 

Por incrível que pareça, apesar de ser frequentemente lembrado e tirado da cartola quando interessa, o projeto do RMB, continua parado há anos. A construção do RMB foi orçada em US$ 500 milhões, quando idealizada em 2009. Até o ano passado, foram aplicados apenas R$ 230 milhões. Para a sua entrada em funcionamento teriam que ser aplicados, em média, cerca de US$ 100 milhões por cinco anos. 

Em cerimônia disputada em 2018 o projeto do RMB teve até lançamento de pedra fundamental, com a presença do presidente Michel Temer. Agora, enquanto o Brasil permanece na dependência de importação de radioisótopos, pacientes com câncer sofrem com a incerteza sobre a manutenção do tratamento. Mas o RMB permanece em alta nos discursos. O projeto (veja a maquete) está numa área de dois milhões de metros quadrados em Iperó, a 130 quilômetros de São Paulo. Parado. FOTO: Maquete - CNEN. 

terça-feira, 28 de setembro de 2021

Ministro alerta sobre urgência de liberação de recursos para produção de radioisótopos

 

   O Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações, Marcos Pontes, alertou ontem (27/9), na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados que, se o Congresso Nacional não aprovar a liberação de R$ 34 milhões nas próximas duas semanas, vai faltar novamente os radioisótopos utilizados na fabricação de radio fármacos para o diagnóstico e tratamento de pacientes com câncer. Os radioisótopos são produzidos pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares da Comissão Nacional de Energia nuclear (IPEN-CNEN). 

Na semana passada, por falta de verbas, a produção foi interrompida. A liberação ocorreu após a transferência de R$ 19 milhões destinados a projetos da CNEN, para a produção dos radioisótopos pelo IPEN. O Ministro disse que desde o ano passado reiterou solicitações ao Ministério da Economia e ao Congresso visando a liberação de recursos para a compra dos insumos (radioisótopos) para a produção dos radio fármacos usados pelas clínicas e o Sistema Único de Saúde (SUS). Para que o problema seja resolvido este ano há a necessidade de aprovação de outros R$ 55 milhões em breve. A aprovação para a liberação dos R$ 34 milhões está prevista para ocorrer na próxima quinta-feira.

 Deputados questionaram o ministro sobre o problema. Quiseram saber por que Marcos Pontes deixou o caso chegar a este ponto. Disserem também que nunca ocorreu nada igual em relação à falta desses insumos no Brasil. Para mostrar a gravidade do problema ao ministro, disseram ainda que pacientes chegaram a tomar conhecimento da falta do medicamento quando entraram nas clínicas para fazer o tratamento.  O ministro afirmou que conhece de perto a importância do tratamento, pois tem um filho que já teve câncer. FOTO: IPEN-CNEN.

Acidente com césio-137 em Goiânia, 34 anos depois. Por Célio Bermann

 


No último dia 10 de setembro tive a oportunidade de ouvir o depoimento da pesquisadora Célia Helena Vasconcelos, que em 2019 defendeu a dissertação de mestrado em Letras e Linguística na Universidade Federal de Goiás, com o título “Césio 137 trinta anos depois: silenciamento discursivo de uma tragédia”. 

O depoimento de Célia se deu num debate organizado pela Pastoral da Comunicação da Diocese de Floresta (PE) para lembrar os 34 anos do acidente radiológico de Goiânia / Césio 137. Vale assinalar que a Diocese de Floresta, município localizado no agreste pernambucano, na região do médio Rio São Francisco, onde a Eletronuclear planeja a construção, na cidade de Itacuruba, de uma central nuclear com seis reatores nucleares, busca auxiliar na organização de um movimento local e regional de resistência a este projeto, trazendo para o debate temas nacionais relacionados à energia nuclear. 

Em outra oportunidade voltaremos à discussão sobre a insanidade política, econômica, social e ambiental desse projeto, para nos dedicarmos ao relato de Célia Helena sobre a tragédia em Goiânia, que se inicia no dia 13 de setembro de 1987 e se estende até os dias de hoje. 

Célia Helena tinha 19 anos, era mãe de uma menina de poucos meses, e estava grávida da segunda filha quando, no dia 29 de setembro, técnicos da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), devidamente paramentados com roupas para proteção radiológica, bateram à sua porta de casa para proceder a “averiguações”. Sem maiores explicações e trajando macacões brancos que os assemelhavam a “marcianos”, passaram a percorrer os aposentos da casa com cintilômetros, instrumento de precisão utilizado para reconhecer a quantidade e o tipo de radiação. 

A casa de Célia Helena ficava na Rua 26, a 150 metros do depósito de ferro-velho de Devanir, local onde, no dia 15 de setembro, ou seja, 15 dias antes, uma caixa contendo  uma cápsula de cloreto de césio - um sal obtido a partir do radioisótopo 137 do elemento químico césio. A caixa foi aberta a marretadas naquele dia de 15 de setembro, expondo as radiações ionizantes a todas as pessoas próximas, objetos, roupas, alimentos e plantas. 

A caixa havia sido levada por dois rapazes que procuravam sobreviver como catadores de lixo. Dois dias antes, no dia 13 de setembro, eles haviam encontrado um equipamento radiológico que estava desativado havia dois anos, e que fora simplesmente abandonado no prédio onde antes estava localizado o Instituto Goiano de Radioterapia (IGR), e que naquele momento estava sendo demolido. 

Conforme o relato de Célia Helena, os dois rapazes já haviam tentado abrir a caixa, no domicílio de um deles, na Rua 57. Entretanto, apenas conseguiram fazer furos, o suficiente para que as radiações ionizantes de raios-gama do césio 137 se propagassem no ambiente. Um dos rapazes, inclusive, já no primeiro dia, teve enjoos e mal estar, e procurou um posto de saúde. 

Pois bem, a existência de problemas relacionados com a irradiação já era conhecida pelos órgãos de saúde de Goiânia desde o dia 14 de setembro de 1987, problemas que se tornaram mais evidentes depois do dia 15 quando a cápsula contendo o césio 137 foi aberta. Poucas horas após a exposição ao material radioativo, as pessoas que estavam no depósito de ferro-velho começaram a desenvolver sintomas: náuseas, seguidas de tonturas, com vômitos e diarreias. Alarmados, os familiares dos contaminados foram inicialmente a drogarias procurar auxílio, alguns procuraram postos de saúde e foram encaminhados para hospitais. 

Diagnosticados inicialmente com intoxicação alimentar, apenas quando o físico Walter Mendes Ferreira, suspeitando de que se tratava de efeitos da exposição à radiação, recomendou o isolamento dos pacientes, é que a identificação da gravidade do quadro por parte dos órgãos de saúde foi finalmente possível. 

Entretanto, a imediata divulgação à população da cidade de Goiânia da situação de intoxicação radiológica existente foi impedida pela ação do governo de Goiás, que jamais admitiu isto. Naquela mesma época estava sendo realizado em Goiânia o 1º GP Internacional de Motovelocidade no Autódromo Ayrton Senna, e o governador Henrique Santillo não queria que a divulgação causasse pânico e afastasse os participantes estrangeiros. 

Como já foi informado, apenas no dia 29 de setembro, ou 15 dias depois do início da contaminação radiológica, houve a divulgação do problema iniciando assim o processo de monitoramento nas áreas próximas daquelas que estiveram sujeitas aos efeitos das radiações ionizantes. 

Nos dias que se seguiram, os indivíduos identificados com a contaminação radiológica foram encaminhados ao Estádio Olímpico e acomodados em barracas de isolamento. Muitos receberam alta após tomarem banho com água, vinagre e sabão de coco.  Os casos mais graves foram transferidos para hospitais. 

Enquanto que o pânico e o caos se propagavam na cidade de Goiânia e nas regiões próximas, sabe-se que cerca de 112 mil pessoas foram examinadas. Destas, verificou-se que 271 apresentaram níveis significativos de material radioativo. Até hoje não há consenso sobre o número de vítimas do césio 137 em Goiânia. Quatro pessoas morreram um mês após a exposição à radiação. O governo de Goiás registra 66 mortos. O depósito de ferro-velho e dezenas de casas foram demolidos. Centenas de objetos, de refrigeradores a sofás, o pavimento de ruas inteiras, veículos, e até mesmo árvores e animais foram destruídos e descartados como lixo nuclear. 

Cerca de seis mil toneladas de lixo radioativo foram recolhidas e enterradas no município de Abadia de Goiás, a cerca de 20 km de distância de Goiânia, em um local posteriormente transformado pela CNEN no Centro Regional de Ciências Nucleares do Centro-Oeste (CRCN-CO), como Unidade Técnico-Científica para abrigar como Depósito Final os rejeitos radioativos do Césio-137. 

Quais lições podemos tirar da tragédia nuclear com o césio-137 em Goiânia? 

A sucessão de irresponsabilidades, primeiramente do Instituto Goiano de Radioterapia que não tomou nenhuma providência para o descarte adequado do equipamento radiológico; posteriormente dos diversos órgãos de saúde cujo conhecimento do risco foi demorado e não resultou na imediata divulgação para a população; do governo estadual, que preferiu preservar o calendário de um evento esportivo ao invés de privilegiar a saúde e segurança da população que estava sendo exposta aos efeitos da radiação. Ainda, os técnicos da CNEN, pela demora em iniciar o monitoramento, e por não disponibilizar para os indivíduos mais expostos os mesmos equipamentos e indumentária que estavam utilizando. 

Cabe assinalar que outro aspecto a merecer destaque é a invisibilidade que o desastre radiológico acabou por ser tratado na cidade de Goiânia. Como destaca Célia Helena, nos terrenos que tinham sido contaminados com a radiação, cujas construções foram derrubadas e cobertas com concreto, não há nenhuma placa, nenhum aviso sobre o que ali havia ocorrido. 

Mesmo a construção de um Memorial na Rua 51, que havia sido uma promessa da administração municipal na época da tragédia, nunca foi concretizada. O desastre radiológico em Goiânia, considerado de nível 5 pela Escala Internacional de Eventos Nucleares da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), como ‘Acidentes com consequências de longo alcance’, segundo nomenclatura da agência, está sendo deliberadamente “esquecido”. Pelo bem da saúde e segurança da população brasileira, não podemos esquecer! 

Artigo de Célio Bermann - Doutor em Engenharia Mecânica na área de Planejamento de Sistemas Energéticos pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), mestre em Engenharia de Produção na área de Planejamento Urbano e Regional pela COPPE/UFRJ e professor associado do Instituto de Energia e Ambiente da USP.

quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Governo libera R$ 19 milhões para a compra de insumos destinados à medicina nuclear. Valor é considerado insuficiente para o tratamento de pacientes com câncer até o final do ano

 


O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações acaba de liberar R$ 19 milhões para o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares da Comissão Nacional de Energia Nuclear (IPEN-CNEN) destinados à compra de insumos (radioisótopos), para a produção de medicamentos com radiação (radiofármacos) vendidos às clinicas. 

A informação foi confirmada há pouco (22/09) pelo presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN), George Coura, que havia denunciado o desabastecimento do diagnóstico e tratamento de pacientes com câncer por causa da interrupção da entrega do produto. “Foi uma vitória parcial, mas ainda não soluciona o problema até o final do ano”, avisou. FOTO - IPEN/CNEN

Rejeitos radioativos em Caldas (MG): parlamentares protestam; ações de segurança em caso de emergência são consideradas por técnicos da área nuclear

 


Parlamentares mineiros já decretaram que não querem rejeitos radioativos em seu território. O prefeito Ailton Goulart avisou ao presidente da estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB), Carlos Freire, que não aceitará o “presente de grego”. Fica cada vez mais acirrado o impasse sobre o destino dos rejeitos radioativos. Eventuais ações de segurança em caso de situações de emergência levaram técnicos do Sistema de Proteção ao Programa Nuclear Brasileiro (Sipron) à Caldas.

 Nesta terça-feira (21/09), a Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (Alemg) bateu o martelo: nada de mais rejeitos na cidade. Enquanto isso, a INB começa a elaborar um plano Ambiental por exigência do Ibama, visando descomissionar a unidade em Caldas.

Conhecidos como Torta II, chegam a 15 mil tambores os rejeitos existentes na unidade da INB, em Caldas; e outros, que podem ultrapassar uma tonelada, armazenados na Usina de Interlagos (USIN) da INB, em São Paulo, estão na iminência de serem transferidos para Caldas, também. As toneladas de Torta II são provenientes da paulista Usina de Santo Amaro (USAM), da Nuclemon, desativada em 1992. 

Com barragens de águas e rejeitos que afetam também Poços de Caldas e cidades vizinhas, no passado recente ocorreram casos de contaminação de solo e água. 

A situação vem se agravando com as informações a partir dos Ministérios Públicos de Pouso Alegre (MG) e de São Paulo, publicadas pelo blog em 27/8, sobre a intenção da INB de transferir mais rejeitos para Caldas, para esvaziar a USIN visando a venda do terreno. 

SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA - 

O presidente da INB, depois de receber o prefeito de Caldas, no Rio, prometeu visitar a instalação no dia 14, mas cancelou a visita. Esta semana, a INB começou a convidar moradores de Andradas, Caldas e Poços de Caldas, para participarem da “construção do Programa de Educação Ambiental (PEA) da Unidade em Descomissionamento de Caldas (UDC)”. Segundo a estatal, de 21 a 23 de setembro, estão sendo realizadas oficinas que fazem parte da elaboração do Diagnóstico Socioambiental Participativo, que irá subsidiar o PEA. 

O caso dos rejeitos está envolvendo o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI/PR), que integra o Sistema de Proteção ao Programa Nuclear Brasileiro (Sipron). Eles visitaram Caldas na última semana a fim de informações sobre as etapas do processo de descomissionamento da instalação nuclear. Segundo a INB, o Sipron visa "prever, planejar, aperfeiçoar e atuar com eventuais ações de segurança em casos de emergência”.

 O capitão de mar e guerra Alexandre Souza de Aguiar, titular de Emergência Nuclear do Departamento de  Coordenação do Sipron, anunciou que a intenção é fazer a mesma visita com outro grupo  em 2022. Se for o caso, disse, inserir  no programa um exercício de emergência na unidade de Caldas. 

Pegamos alguns subsídios da equipe técnica da UDC para que, numa situação de emergência na área  radiológica ou de segurança física, possamos contribuir para tentar mitigar ou prevenir qualquer dano à instalação”, comentou.  

FOTO – BARRAGEM DE REJEITOS – ARQUIVOS -

Senado aprova a MP -1049 criando a Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN). Acabou o poder de fiscalização da CNEN.

 


O Senado Federal aprovou ontem (21/09) a Medida Provisória nº 1049, criando a Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN), autarquia federal com autonomia administrativa, técnica e financeira, originada da cisão da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). Cabe à ANSN a responsabilidade pelo licenciamento e a fiscalização da pesquisa, lavra, posse, produção, utilização, processamento, enriquecimento, armazenamento, transporte, transferência, comércio, importação e exportação de minérios, minerais e materiais nucelares. 

Caberá a ANSN a responsabilidade por instalações nucelares, radioativas e minero-industriais que contenham materiais radioativos, assim como depósitos e gestão de rejeitos radioativos, resíduos sólidos radioativos e planos de emergência nuclear e radiológica. 

A CNEN foi fundada pelo presidente da República Juscelino Kubitschek, no dia 10 de outubro de 1956. Teve em seu comando o físico nuclear Rex Nazareth, um dos principais protagonistas do programa nuclear paralelo (militar) brasileiro, de 1982 a 1990. 

A atividade de fiscalização da CNEN sempre foi combatida por especialistas do setor, principalmente quando o Brasil se viu às voltas com o drama provocado pelo acidente com uma cápsula de césio-137, em Goiânia, em 1987. O acidente provocou a morte de quatro pessoas e um número nunca devidamente conhecido de contaminados; além de gerar seis toneladas de lixo radiativo armazenados em depósito na região. 

Conforme o blog já publicou, são diversas as atribuições que saem do guarda-chuva da CNEN para da nova autarquia. A MP-1049 transfere da CNEN para a ANSN o exercício do poder de polícia sobre atividades de sua competência, que, por sua vez, constitui fato gerador da taxa de licenciamento, controle e fiscalização de instalações e matéria nucleares e suas instalações. 

A ANSN deverá ainda criar e manter cadastro nacional do histórico de doses de radiação dos indivíduos expostos nas atividades reguladas. 

COMPETÊNCIA PRIVATIVA - 

Não será da ANSN e sim do Comando da Marinha, a competência privativa para regular, licenciar, fiscalizar e controlar os meios navais com plantas nucleares, embarcações, quanto a segurança nuclear; proteção radiológica; segurança física. Transporte do combustível nuclear. Quando o Brasil tiver o seu submarino nuclear, a fiscalização, portanto, será do Comando da Marinha. 

INFRAÇÕES - A MP-1049 estabelece que as infrações administrativas às normas de segurança nuclear, proteção radiológica e de segurança física serão classificadas como infrações leves, graves ou gravíssimas, conforme o risco de dano aos indivíduos, propriedades e ao meio ambiente. Os valores das multas serão fixados pela Diretoria Colegiada da ANSN, entre o mínimo de R$ 5.000,00 e o máximo de R$ 100.000.000,00. 

Caberá a CNEN e à Indústrias Nucleares do Brasil (INB) a comercialização exclusiva de materiais nucleares, compreendidos no âmbito do monopólio da União. 

Pela MP-1049, aprovada agora, a nova autarquia terá patrimônio próprio, autonomia administrativa, técnica e financeira. Sua sede e foro serão na cidade do Rio de Janeiro e sua atuação será em todo o território nacional.

O Blog tem divulgado artigos e matérias sobre o tema.  Leia “Governo estuda separar funções da Comissão Nacional de Energia Nuclear” (09/08/2019); artigos do engenheiro/servidor da CNEN, Sidney Rabello (24/5/2021) e (26/5/2021); e nota oficial da Marinha (25/5/2021); Câmara dos Deputados debate a criação da ANSN (12/08); e Câmara dos Deputados aprova Medida Provisória criando a ANSN (3/9). FOTO: Usinas nucleares - Eletronuclear/Eletrobras.

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Falta de verba na medicina nuclear começa a paralisar o diagnóstico e tratamento contra o câncer. Ricos só terão atendimento em outros países

 


Brasileiros portadores de tumores neuroendócrinos (pulmão, sistema respiratório e gastrointestinal), sejam ricos ou pobres, não puderam realizar nesta segunda-feira (20/9) o tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), clínicas particulares e até mesmo no Instituto Nacional do Câncer. A informação é do presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN), o médico nuclear George Coura, que desde a semana passada vem alertando sobre o desabastecimento de radioisótopos (substância radioativa) produzida pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares  da Comissão Nacional de Energia Nuclear (IPEN-CNEN), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, pela falta de verbas. O problema vai afetar outros tratamentos, avisou. 

Segundo fontes do setor, há quatro anos o orçamento do Ipen para a produção do radioisótopo vem sofrendo importantes cortes. Este ano, por exemplo, o orçamento seria de R$ 63,9 milhões – considerado insuficiente. 

É com o radioisótopo como o lutécio-177, que o Ipem produz o radiofármaco usado no tratamento de tumores neuroendócrinos.  O presidente da SBMN alerta que a cada semana a paralisação de um dos vários radioisótopos vai afetar a um tipo de tratamento contra o câncer. 

“Estamos diante de um potencial desabastecimento generalizado e de crise sanitária, na impossibilidade de o paciente ser tratado ou de realizar os exames. Só não terá o problema quem puder pegar um avião para ser tratado em outro país”, comentou. 

A cada semana a situação vai se agravar, afirmou, porque outros medicamentos essenciais deixarão de ser produzidos. O Brasil importa radioisótopos de produtores da África do Sul, Holanda e Rússia, além de aquisição de insumos nacionais.  

Os radioisótopos possibilitam que os médicos vejam o funcionamento de órgãos e tecidos vivos por meio de imagens como as tomografias, radiografias e cintilografias. Cerca de dois milhões de procedimentos médicos são realizados por ano utilizando radioisótopos, em 440 clínicas cadastradas para realizar o trabalho semanalmente. Cerca de 440 mil pelo SUS e o restante pela rede privada. 

A SBMN reitera que a falta de parte dos insumos já está sendo extremamente prejudicial aos pacientes – que ficam sem alternativas para seguirem com diagnósticos e tratamentos – e a notícia de que não há previsão da retomada regular da produção dos radiofármacos possa agravar mais ainda a situação. 

MINISTRO PEDE DINHEIRO - 

Em entrevista ao “Pânico”, programa de TV, o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações, Marcos Pontes, admitiu que vai faltar o medicamento no Brasil. A situação é de emergência, avisou. Segundo ele, o orçamento para a compra é de R$ 90 milhões – maior do que o orçamento do Ipem. O ministro informou que para tentar resolver o problema, pediu ao ministério da Economia R$ 18 milhões para esta semana; e que vai tentar uma liberação de R$34 milhões junto ao Congresso; mais R$ 55 milhões até o final do ano.  

FOTO:  IPEN -

sexta-feira, 17 de setembro de 2021

Acidente de Goiânia, 34 anos depois. Casas foram demolidas. Famílias tiveram que sair deixando tudo: fotos, brinquedos, lembranças. Por Heitor Scalambrini Costa e Odesson Alves Ferreira

 


O fenômeno da radioatividade descoberto pelo físico francês Henri Becquerel em 1896, mostrou que o núcleo de um átomo muito energético tende a se estabilizar, emitindo o excesso de energia na forma de partículas e ondas. As radiações emitidas por esses núcleos chamadas de partículas, alfa e beta (pouco penetrantes) possuem massa, carga elétrica e velocidade. Os raios gama são os mais perigosos por serem mais penetrantes (energéticos), e de efeitos extremamente nocivos para a vida, são emitidos na forma de ondas eletromagnéticas, não possuem massa, e se propagam com a velocidade de 300.000 km/s. 

Portanto, quando temos a presença indesejável de um material radioativo em local onde não deveria estar, existe assim a contaminação radioativa que gera irradiações. Para descontaminar um local, retira-se o material contaminante. Sem o contaminante o lugar não apresentará irradiação, nem ficará radioativo. Irradiação não contamina, mas contaminação irradia. 

Feito este preâmbulo, relembramos o ocorrido há 34 anos, naquele 13 de setembro de 1987, no município de Goiânia (GO), considerado o maior acidente radiológico do mundo. Um aparelho de radioterapia contendo o material radioativo césio-137 (produzido em reatores nucleares) encontrava-se abandonado no prédio do Instituto Goiano de Radioterapia (IGR), instituto privado, no centro de Goiânia, desativado há cerca de 2 anos (isto mesmo, havia 2 anos que o equipamento estava abandonado no local). Dois homens, Roberto e Wagner, à procura de sucata, entraram no prédio do Instituto sem nenhuma dificuldade, pois o mesmo se encontrava em escombros, sem portas e nem janelas, e levaram o aparelho até Devair, dono de um ferro-velho. 

Durante a desmontagem do aparelho, foram expostos ao ambiente 19 g de cloreto de césio-137 (CsCl), pó semelhante ao sal de cozinha. O encontrado não era exatamente na forma de pó, mais parecia como uma pasta, de cor acinzentada, e virava pó quando friccionado. Mas o que chamava muita atenção é que no escuro, brilhava intensamente com uma coloração azulada. Encantado com o brilho do material, Devair, passou a mostrá-lo e até distribuí-lo a amigos e familiares, inclusive para os irmãos Odesson e Ivo, que levou um pouco de césio para sua filha, Leide. 

Expostas ao material radioativo, as pessoas começaram a desenvolver sintomas da contaminação (tonturas, náuseas, vômitos e diarreia), algumas após horas de exposição e outras após alguns dias, levando-as a procurarem farmácias e hospitais. Foram medicadas como portadoras de uma doença contagiosa. Os sintomas só foram caracterizados como contaminação radioativa em 29 de setembro, depois que a esposa do dono do ferro-velho, Maria Gabriela, levou parte do aparelho desmontado até a sede da Vigilância Sanitária. No dia 23 de outubro daquele ano morria Maria Gabriela, esposa de Devair e sua sobrinha Leide. Devair, juntamente com outras 15 pessoas, foram encaminhadas para tratamento de descontaminação no Hospital Naval Marcílio Dias no Rio de Janeiro, vindo a falecer em 1994. 

Nestes 34 anos seis pessoas da mesma família Alves Ferreira morreram. 

Para a verdade dos fatos, é necessário deixar registrado que o governo na época não sabia ainda o que estava acontecendo. Até que no dia 29 de setembro, um dia após Maria Gabriela e Geraldo (catador de recicláveis que morava no ferro-velho) terem levado a peça que continha o césio a Vigilância Sanitária. O físico Walter Mendes, de férias na cidade, solicitou um contador Geiger do escritório da Nuclebrás de Goiânia, emprestando-o à Vigilância Sanitária. E aí sim, foi constatado a radioatividade. 

A propagação do césio-137 para as casas próximas onde o aparelho foi desmontado se deu por diversas formas. Merece destaque o fato de o CsCl ser higroscópico, isto é, absorver água da atmosfera. Isso faz com que ele fique úmido e, assim, passe a aderir com facilidade na pele, nas roupas e nos calçados. Levar as mãos ou alimentos contaminados à boca resulta em contaminação interna do organismo, o que aconteceu com Leide de seis anos de idade. 

Oficialmente, segundo a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), quatro pessoas morreram, e além delas, das 112.800 pessoas que foram monitoradas, em 6.500 foram encontradas contaminação discreta: desse total 250 apresentaram contaminação corporal interna e externa que mereceram maior atenção e acompanhamento. Destas, 49 foram internadas e 21 exigiram tratamento médico intensivo. 

Os trabalhos de descontaminação dos locais afetados produziram cerca de seis mil toneladas de lixo contaminado com 19 gramas de césio-137. O lixo armazenado em caixas, tambores, contêineres eram constituídos de roupas, utensílios domésticos, plantas, solo, animais de estimação, veículos, materiais de construção (algumas casas foram implodidas, sem que pudesse tirar nada de dentro, nem brinquedos, fotografias). Todo este lixo radioativo foi armazenado em um depósito construído na cidade de Abadia de Goiás, vizinha a Goiânia, onde deverá ficar, pelo menos, 180 anos. 

Quatorze anos depois, o governo de Goiás incluiu mais 600 pessoas na lista de vítimas. O Ministério Público Estadual (MPE) chegou à conclusão que, policiais e funcionários que trabalharam durante o período da tragédia foram contaminados e alguns morreram em consequência de doenças provocadas pelo césio. E estas mortes nunca entraram nas estatísticas oficiais. 

Por outro lado, o Centro de Assistência Leide das Neves Ferreira (em homenagem à menina vítima fatal do acidente), criado pelo governo do estado para acompanhar os contaminados, não admitia relacionar o acidente com o césio, as mortes e as doenças denunciadas pelo MPE. Foi então assinado um acordo entre o Estado e o MPE para que as novas vítimas, seus filhos e netos recebessem assistência médica e indenização. 

Após trinta e quatro anos do desastre radioativo, as várias pessoas contaminadas pela radioatividade não recebem os medicamentos, que, segundo leis instituídas, deveriam ser distribuídos pelo governo. E muitas pessoas envolvidas diretamente com o ocorrido, ainda vivem nas redondezas da região do acidente, entre as Ruas 57, Avenida Paranaíba, Rua 74, Rua 80, Rua 70 e Avenida Goiás, sem oferecer nenhum risco de contaminação. 

Este desastre deixou marcas profundas nas pessoas mais diretamente afetadas e que sobreviveram, e em todo município. O que caracterizou este episódio, e deixou evidente a sociedade, foi o despreparo, a inoperância, o improviso e o desinteresse demonstrado pelo poder público com a saúde das pessoas, principalmente manipulando informações. 

A Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) ficou desnudada diante do grave desastre de Goiânia. Mas não é somente a CNEN: todas as atividades nucleares no Brasil continuam surpreendendo negativamente, pois transcorrido 34 anos as atitudes e a postura de hoje são semelhantes a do passado. Pouca coisa mudou, em relação à transparência e a prepotência. E o descrédito é cada vez mais percebido pela população, quando as atividades desenvolvidas na área nuclear permanecem sob sigiloso. 

Os exemplos mais recentes que acontecem, ou podemos dizer tragédias anunciadas, é o que atingem as populações vizinhas da barragem de resíduos radioativos (área equivalente a 100 Maracanãs) no município de Caldas em Minas Gerais, e da mina de urânio de Caetité na Bahia. Mas estas são outras histórias que devemos estar atentos para evitar que a população padeça e morra pela irresponsabilidade de governantes. 

Artigo de Heitor Scalambrini Costa, professor associado aposentado da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), graduado em Física pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP/SP), Mestrado em Ciências e Tecnologias Nucleares na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Doutorado em Energética, na Universidade de Marselha/Comissariado de Energia Atômica (CEA)-França. Ativista antinuclear; e Odesson Alves Ferreira, da Associação das Vítimas do Césio 137/AVCésio.

quinta-feira, 16 de setembro de 2021

Governo adia construção de reator capaz de produzir insumos para a medicina nuclear. Desabastecimento em clínicas de tratamento contra o câncer pode ocorrer nos próximos dias

 


Enquanto o governo adia a construção do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), em Iperó (SP), que daria independência à produção de material radioativo para a realização de exames e tratamento contra o câncer e outras doenças, os centros de medicina nuclear correm o risco de ficar desabastecidos. O drama para pacientes que dependem de tratamento deve ocorrer a partir da próxima segunda-feira (20/09), quando o Instituto de Pesquisa em Energia Nuclear (IPEN), da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) terá a produção suspensa de todos os fármacos e de isótopos radioativos por falta de verbas. 

À noite, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações divulgou  nota  informando que desde junho de 2021 vem trabalhando com o Ministério da Economia para a maior disponibilização de recursos para a produção de radiofármacos pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), vinculado a esta pasta por meio da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN/MCTI). Para a recomposição do orçamento do Instituto, o Governo Federal por meio do MCTI está sensibilizando o Congresso Nacional pela votação e aprovação do PLN 16/2021 prevista para a próxima semana. 

“Tão logo tenhamos a informação quanto ao recebimento dos recursos orçamentários extras e, consequentemente, à normalização nos fornecimentos, entraremos em contato imediatamente por meio do Serviço de Gestão Comercial do IPEN-CNEN”, consta parte de comunicado do IPEN/CNEN enviado  aos serviços de medicina nuclear.  

O problema é gravíssimo e pode afetar milhares de pessoas. Cerca de dois milhões de procedimentos médicos são realizados, por ano, utilizando radioisótopos, pelo Sistema Único de Saúde (SUS), em 440 clinicas cadastradas para realizar o trabalho semanalmente. Somente o RMB, dará autonomia ao Brasil na área de produção de radioisótopos. Mas o projeto não recebe nenhuma verba há anos, conforme o blog vem divulgando desde março do ano passado. 

A suspensão da produção anunciada pelo IPEN agora, segundo a Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN), “causará importantes danos à sociedade como um todo”, seja em pacientes atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), seja por permitir diagnósticos mais precisos para cirurgias, por exemplo. Na nota da SBMN, o IPEN anunciou que depende da liberação de verbas orçamentárias extraordinárias para a retomada de seu funcionamento. “Até que isso aconteça, a Medicina Nuclear Brasileira fica de mãos atadas e os pacientes, sem seus devidos procedimentos médicos”, afirmo presidente da SBMN, George Coura Filho. 

EMPOLGADOS DISCURSOS - 

O projeto de construção do Reator Multipropósito Brasileiro (PMB) costuma motivar empolgados discursos políticos pela autossuficiência nacional na produção de radioisótopos e fontes radioativas, aplicados no diagnóstico e tratamento de doenças como o câncer. Mas o projeto não sai do papel. Os radioisótopos possibilitam que os médicos vejam o funcionamento de órgãos e tecidos vivos por meio de imagens como as tomografias, radiografias e cintilografias. 

A falta de decisão de governos para destravar a construção do RMB levará o país este ano a gastar mais de R$ 60 milhões (de acordo com a alta do dólar), importando radioisótopos da África do Sul, Rússia, Holanda e principalmente da Argentina. O Brasil importa cerca de 4% da produção mundial anual do radioisótopo molibdênio-99. O decaimento radioativo do molibdênio-99 produz o radioisótopo tecnécio-99m, utilizado nos radiofármacos (substância química) mais empregados na medicina nuclear. Para se ter ideia da necessidade do RMB, cerca de dois milhões de procedimentos médicos são realizados, por ano, utilizando radioisótopos, pelo Sistema Único de Saúde (SUS), em 440 clinicas cadastradas para realizar o trabalho semanalmente. 

Cerca de 440 mil pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e o restante pela rede privada. O apelo social do projeto é que a partir do funcionamento do RMB, haveria um aumento significativo da utilização do serviço pelo SUS. As informações são do engenheiro civil, mestre em engenharia nuclear e doutor em tecnologia nuclear, José Augusto Perrotta, coordenador do RMB, tecnologista sênior da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), responsável pelo empreendimento. A construção do RMB foi orçada em US$ 500 milhões, quando idealizada em 2009. Até hoje foram aplicados apenas R$ 230 milhões. Para a sua entrada em funcionamento, teriam que ser aplicados, em média, cerca de US$ 100 milhões, ao longo de cinco anos. 

CRISE MUNDIAL – 

O projeto do RMB ganhou força em 2009, a partir da crise mundial provocada pela paralisação do reator canadense National Research Universal (NRU), que atendia na época a cerca de 30% da demanda mundial de molibdênio-99. “O problema gerou o primeiro desabastecimento internacional do medicamento, algo sem precedentes”, comentou Perrotta. Quatro reatores de pesquisa estão em funcionamento no Brasil. Somente o reator EIA-R1, instalado no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), produz radioisótopos. O EIA-R1 funciona há 63 anos, e espera-se que tenha mais 10 anos de vida. Contudo, ele não tem capacidade de produzir radioisótopos em escala necessária. Por isso, o IPEN, através da CNEN, importa todo o molibdênio-99 utilizado na produção de radiofármacos.  

Segundo Perrotta, a CNEN gasta US$ 15 milhões por ano com essa importação, que gera um faturamento de R$ 120 milhões, ano, recursos que vão direto para o caixa do governo. Sem o EIA-R1, o país ficará ainda mais dependente, alerta Perrotta, em seus mais de 40 anos de experiência no setor nuclear no Brasil e exterior.  “Alguns estádios para as olimpíadas custaram mais do que o valor do RMB”, comentou Perrotta. Lembrou que a Argentina iniciou projeto semelhante no mesmo tempo que o Brasil. Mas o projeto argentino já está com 70% das obras prontas. “Acreditamos que podemos recuperar o tempo perdido”, acredita.

FOTO: Ilustração da maquete do RMB - CNEN 

Acidente com cápsula de césio-137 em Goiânia faz 34 anos. Foi "batismo de fogo": deixou mortos, medo e seis mil toneladas de lixo radioativo

 


“Batismo de fogo”. É assim que diretores da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) definem o maior acidente radiológico do mundo – fora de usina nuclear - ocorrido em Goiânia com uma cápsula de césio-137 (material radioativo), em setembro de 1987. A tragédia que provocou a morte de quatro pessoas e contaminou outras 271, mostra hoje - 34 anos depois - que pode ter servido de alerta à população brasileira, a partir do medo provocado pelo acidente, que gerou seis mil toneladas de lixo radioativo.

No réveillon de 2017, por exemplo, a CNEN foi acionada para recolher um material estranho caído do espaço numa fazenda em Mato Grosso. “Por favor, venham logo, estamos com medo de morrer contaminados”, disse o fazendeiro. No local, técnicos constataram que estavam diante de uma peça de satélite, sem radiação. Rebates falsos acontecem e são registrados nos sistemas da instituição, disse o diretor de pesquisa e Desenvolvimento, Madison Coelho de Almeida.

Madison e o físico Walter Mendes Ferreira, coordenador do Centro Regional de Ciências Nucleares do Centro-Oeste, da CNEN, livram a Comissão de qualquer responsabilidade no caso. Em entrevista ao blog disseram que o Instituto Goiano de Radioterapia (IGR), “tinha o dever de comunicar o encerramento de suas atividades para que o local fosse descomissionado, mas abandonou o equipamento com o césio 137, sem qualquer aviso”.

No momento, segundo a CNEN, o Brasil possui 2.800 instalações radioativas nas áreas de medicina, indústria, pesquisa e produção de rádio fármacos; mais 30 instalações nucleares e outras 40, minero-indústrias. Todas são fiscalizadas, afirmaram. Afinal, qual a periodicidade de fiscalização? “A fiscalização ocorre a cada autorização concedida e tem um prazo para o vencimento que leva a renovação ou não da autorização. No caso de Goiânia, os operadores da clínica falharam”, afirmaram.

MEMÓRIA DO ACIDENTE

A história que chocou a opinião pública não pode ser esquecida. Uma cápsula de césio-137 – substância radioativa componente de um aparelho usado no tratamento de câncer, de propriedade do Instituto Goiano de Radioterapia (IGR), foi deixada na antiga sede do já desativado instituto. De acordo com as notícias da época, no dia 13 de setembro de 1987, os catadores de papel Wagner Motta Pereira e Roberto Santos Alves entraram no local, retiraram o aparelho, abriram algumas partes e venderam uma delas, a que continha a cápsula com o césio-137, para Devair Alves Ferreira, dono de um ferro-velho. Ao arrombar a cápsula, a golpes de marreta, Devair liberou o césio, um pó brilhante, parecido com purpurina. A cápsula com o césio 137 passou de mão em mão, em várias casas de família.  Por fim, foi levada de ônibus à Vigilância Sanitária por Maria Gabriela Ferreira, mulher de Devair. Ela suspeitou que os problemas de saúde da sua família tivessem alguma relação com o equipamento.

O então presidente da República, José Sarney, mandou prender os culpados pelo acidente e visitou dez pessoas contaminadas, internadas no Hospital Geral do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps) em Goiânia. O diretor-geral da Polícia Federal, Romeu Tuma, anunciou a abertura de inquérito. O presidente da CNEN, Rex Nazaré, admitiu a necessidade de rever as normas de licenciamento e fiscalização de instituições de Medicina Nuclear o país. O ferro-velho e as moradias dos pacientes mais contaminados foram demolidos. O Exército deslocou pessoas para região.  Funcionários da CNEN ainda sem saber a dimensão do acidente, não tomaram precauções de segurança ao medirem a radiação: usavam calça jeans, tênis e sapatos.

Os médicos Orlando Alves Teixeira, Criseide Castro Dourado e Carlos Bezzerril, sócios-proprietários do Instituto de Radioterapia; e o responsável técnico do instituto, físico hospitalar Flamarion Barbosa Coulart, foram indiciados pela Polícia Federal (PF). Na CNEN, só houve um indiciado: o chefe do Departamento de Instalações Nucleares e Materiais Nucleares, físico José Rosental. Mais tarde, a Procuradora da República solicitou a exclusão de Rosental do caso e a Justiça acolheu o pedido.

Enquanto a CNEN afirmava que o caso estava sob controle, a cada dia apareciam outros focos de contaminação. No dia 23 de outubro de 1987 ocorreram as duas primeiras mortes. A menina Leide das Neves Ferreira, de 6 anos, filha de Ivo Alves Ferreira e sobrinha de Devair, foi uma das quatro vítimas fatais. Com as mãos contaminadas, Leide havia comido um pedaço de pão. Ela teve ulcerações na língua, boca e garganta, e lesões internas. A segunda vítima foi a tia da menina e mulher de Devair, Maria Gabriela, de 38 anos. Ambas morreram no Hospital Naval Marcilio Dias, no Rio de Janeiro, onde foram internadas com outros contaminados.   No dia 27 de outubro daquele ano morreu a terceira vítima: Israel Batista dos Santos de 22 anos, que trabalhava no ferro-velho e ajudara Devair a abrir o aparelho. No dia seguinte, morreu o empregado do ferro-velho Admilson Alves de Souza, de 18 anos. O catador de papel Roberto Santos Alves, de 21 anos, sobreviveu, mas teve o antebraço amputado por causa das lesões provocadas pela contaminação.

O medo da contaminação levou a uma atitude violenta os moradores da vizinhança do Cemitério-Parque, em Goiânia, onde a menina Leide foi sepultada. Eles atiraram pedras e pedaços de cruzes de concreto contra o cortejo, em protesto pela escolha do local para enterrar as vítimas da contaminação radioativa.  O presidente da CNEN, Rex Nazaré Alves culpou os donos da clínica, que não teriam comunicado a Comissão a desativação do aparelho radiológico. Os donos, por sua vez, culparam os catadores de papel e a própria CNEN, que deixou de fiscalizar o equipamento na antiga sede do instituto.

Cerca de 112 mil pessoas que temiam estar contaminadas foram examinadas durante dois meses no Estádio Olímpico de Goiânia. Para atender às vitimas do acidente, o governo de Goiás criou a Fundação Leide das Neves. Segundo a médica Maria Paula Curado, que presidiu a Fundação naquela época, 244 pessoas estavam realmente contaminadas e 50 delas tiveram que receber tratamento hospitalar. Entre as 50 pessoas, 28 tiveram lesões e queimaduras causadas pela radiação. Desse grupo, 10 pacientes foram submetidos a cirurgias plásticas reparadoras, das quais oito sofreram síndrome aguda da radiação, depressão da medula, hemorragias e distúrbios de comportamento.  

No grupo de pessoas mais graves, cinco pessoas contraíram câncer e duas estavam em tratamento, naquela época. “Mas não existe um exame sequer capaz de provar que o câncer foi provocado pelo acidente”, avisava a médica. Devair morreu em maio de 1994 de insuficiência renal e hepática, conforme atestado médico.

LIXO RADIOATIVO

Hoje, mais de três décadas depois da tragédia, a direção da CNEN afirma que seus protocolos de fiscalização e segurança foram aprimorados, mas não admite falha no caso do acidente de Goiânia.  “Todos os recursos humanos e materiais foram utilizados, como 315 servidores, além do apoio de equipes do Exército, Marinha e Aeronáutica. “Somos referência internacional no atendimento de acidente radiológico”, afirmaram os diretores. Segundo eles, “o acidente de Goiânia foi um batizado de fogo”.  

Na verdade, além de famílias destroçadas e outras que lutam na Justiça para serem indenizadas, o acidente deixou um grande problema para o futuro: seis mil toneladas de rejeitos radioativos armazenados no depósito em Goiânia com atividade radioativa por pelo menos 300 anos. Nesse total, estão 1.343 caixas metálicas; 4223 tambores de 200 litros; 10 contêineres marítimos; e oito recipientes de concreto.   

FOTO: Técnicos vistoriam locais contaminados. Arquivos imprensa na época .   

segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Rejeitos radioativos: INB cancela visita à Caldas; prefeito aguarda justificativa e avisa que tomará providências

 


O presidente da Indústrias Nucleares do Brasil (INB), Carlos Freire Moreira, cancelou a visita agendada para ocorrer nesta terça-feira (14/09) ao município de Caldas (MG), onde a empresa estoca mais de 15 mil tambores com material radioativo e deverá receber pelo menos mais uma tonelada procedente da Usina de Santo Amaro (USIN), em São Paulo. 

A visita havia sido agendada com o prefeito de Caldas, Ailton Goulart, dias após a informação ter sido divulgada pelo blog no dia 27/8. O prefeito esteve na INB e cobrou providências a Freire Moreira: avisou que não aceitará o lixo radioativo na cidade. “Se for preciso, tomaremos medidas jurídicas”, afirmou.  

O prefeito disse que aguarda a confirmação sobre os motivos que levaram o presidente da INB cancelar a visita. É possível que ele esteja às voltas com os preparativos para a sua viagem a Viena, na Áustria, participando da 65ª Conferência da Agência Internacional de Energia Nuclear (AIEA), que será realizada de 17 a 25 deste mês. 

ANTPEN LUTA NA JUSTIÇA - 

Os rejeitos radioativos fazem parte do estoque acumulado da Nuclemon, no Brooklin (SP), empresa da INB, que manuseou torta II e outros materiais nucleares, desde a década de 70.  A longa história gerou prejuízos materiais e humanos incalculáveis, como a contaminação de trabalhadores da empresa, que durante décadas, sem saber, manusearam elementos radioativos. Até hoje o caso da Nuclemon gera sofrimento e prejuízos aos ex-funcionários da empresa, fechada em 1992. 

Abandonados pelo poder público, as vítimas e familiares – pois muitos já morreram-, em 2006, fundaram a ANTPEN (Associação Nacional dos Trabalhadores da Produção de Energia Nuclear), para lutar pela causa. São dezenas de pedidos de indenização na Justiça Paulista. Até hoje, o máximo que as vítimas conseguiram foi o pagamento de um plano de saúde. 

USIN: TERRENO VALIOSO - 

No próximo dia 16/9, o prefeito terá reunião com a equipe do governador Romeu Zema. A Câmara de Vereadores já se manifestou com nota de repúdio contra a decisão da INB.  O caso de Caldas corre na Justiça paulista e de Pouso Alegre (MG). Na Justiça, a INB indica Caldas para receber mais material radioativo, alegando que o lugar é excelente para este objetivo. Indica também o município de Buena, em São Francisco de Itabapoana (RJ). 

Assim como o governo vendeu o terreno da Nuclemon no Brooklin por R$ 12.279,00 o metro quadrado; segundo fontes, a intenção da empresa é esvaziar e fazer o mesmo com o terreno da USIN avaliado hoje em cerca de R$ 3.469,55 por metro quadrado. 

TELHADO TROCADO - 

Com o encerramento das atividades da Nuclemon, em 1992, uma grande parte do material radioativo foi levado para Caldas. Lá, recentemente, INB teve que trocar o telhado de galpões que se deterioraram com o tempo. 

Segundo o cronograma de transferência da INB, conforme documentos do Ministério Público Federal – Procuradoria da República de São Paulo - a Torta II será transportada para o local neste primeiro semestre de 2021 e primeiro semestre de 2022 e, ainda, no primeiro bimestre de 2023. O transporte efetivo desse material está previsto para o primeiro semestre de 2025. 

Leia no blog: Destino de mina de urânio em Poços de Caldas é tema de seminário (18/9/2019); Lixo radioativo enterrado em Poços de Caldas tem que ser eliminado, exigem especialistas (21/09); Primeira mina de urânio é “herança maldita”: barragem pode se romper (20/11/2019); Primeiro exercício simulado em Caldas, para caso de acidente em barragem e mina e urânio desativada (17/12/2019); Risco de contaminação radioativa na troca de cobertura que abriga 15 mil tambores com Torta II, em MG (10/06/2021) – FOTO – INB - Caldas - 

Governo cria empresa para usinas nucleares e Itaipu Binacional

 


O governo federal acaba de criar a Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional S.A – ENBpar, vinculada ao Ministério de Minas e Energia, com sede em Brasília, que abarca as usinas nucleares e Itaipu Binacional. A decisão que vinha sendo analisada desde 2019, visa à privatização da Eletrobras. O Decreto nº 10.791, de 10/09/2021, do presidente Jair Bolsonaro, foi publicado nesta segunda-feira (13/09/2021) no Diário Oficial da União (DOU).  

O governo destinou R$ 4 bilhões no Orçamento de 2021 para a criação da nova estatal, recursos que serão usados para a aquisição do controle da Eletronuclear e da parte que a Eletrobras possui no capital da Itaipu. A EBNpar passará a ser a controladora da Eletronuclear, ou seja, será majoritária no capital votante.  

As usinas nucleares Angra 1 e Angra 2, em operação, e Angra 3, em construção, além da Unidade de Armazenamento a Seco (UAS), para guardar os elementos combustíveis usados das centrais atômicas, são de responsabilidade da Eletronuclear. Para concluir Angra 3, a empresa precisa de R$ 15 bilhões, para que a unidade atômica entre em funcionamento comercial em 2026. Mesmo que empresas privadas nacionais ou internacionais injetem dinheiro na usina, pelo Decreto 10.791, a unidade permanece sob o controle da União.   

FOTO: Central Nuclear - Angra dos Reis - Acervo Eletronuclear.

sexta-feira, 3 de setembro de 2021

Câmara dos Deputados aprova Medida Provisória criando a Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN); agora, é com o Senado

 


A responsabilidade pelo licenciamento e a fiscalização da pesquisa, lavra, posse, produção, utilização, processamento, enriquecimento, armazenamento, transporte, transferência, comércio, importação e exportação de minérios, minerais e materiais nucelares ficarão a cargo da nova Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN). A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira (2) a Medida Provisória (MP-1049) criando a ANSN, autarquia federal com autonomia administrativa, técnica e financeira, originada da cisão da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), cuja vinculação deverá ser estabelecida por meio de ato do Poder Executivo. 

Caberá a ANSN a responsabilidade por instalações nucelares, radioativas e minero-industriais que contenham materiais radioativos, assim como depósitos e gestão de rejeitos radioativos, resíduos sólidos radioativos e planos de emergência nuclear e radiológica. O texto da MP-1049 seguirá para o Senado. 

A CNEN foi fundada pelo presidente da República Juscelino Kubitschek, no dia 10 de outubro de 1956. Teve em seu comando o físico nuclear Rex Nazareth, um dos principais protagonistas do programa nuclear paralelo (militar) brasileiro, de 1982 a 1990. A atividade de fiscalização da CNEN sempre foi combatida por especialistas do setor, principalmente quando o Brasil se viu às voltas com o drama provocado pelo acidente com uma cápsula de césio-137, em Goiânia, em 1987. O acidente provocou a morte de quatro pessoas e um número nunca devidamente conhecido de contaminados; além de gerar toneladas de lixo radiativo armazenados em depósito na região. 

PODER DE POLÍCIA -

 São diversas as atribuições que saem do guarda-chuva da CNEN para da nova autarquia. A MP-1049 transfere da CNEN para a ANSN o exercício do poder de polícia sobre atividades de sua competência, que, por sua vez, constitui fato gerador da taxa de licenciamento, controle e fiscalização de instalações e matéria nucleares e suas instalações. 

A ANSN deverá ainda criar e manter cadastro nacional do histórico de doses de radiação dos indivíduos expostos nas atividades reguladas. 

COMPETÊNCIA DA MARINHA - Por outro lado, não será da ANSN e sim do Comando da Marinha, a competência privativa para regular, licenciar, fiscalizar e controlar os meios navais com plantas nucleares, embarcações, quanto a segurança nuclear; proteção radiológica; segurança física; e o transporte do combustível nuclear. Quando o Brasil tiver o seu submarino nuclear, a fiscalização, portanto, será do Comando da Marinha. 

INFRAÇÕES - 

A MP-1049 estabelece que as infrações administrativas às normas de segurança nuclear, proteção radiológica e de segurança física serão classificadas como infrações leves, graves ou gravíssimas, conforme o risco de dano aos indivíduos, propriedades e ao meio ambiente. Os valores das multas serão fixados pela Diretoria Colegiada da ANSN, entre o mínimo de R$ 5.000,00 e o máximo de R$ 100.000.000,00. 

Caberá a CNEN e à Indústrias Nucleares do Brasil (INB) a comercialização exclusiva de materiais nucleares, compreendidos no âmbito do monopólio da União. 

PAÍS ESTÁ ATRASADO - 

A proposta aprovada pelos deputados prevê sabatina do Senado Federal para a nomeação do diretor-presidente e dos dois diretores da diretoria colegiada da ANSN. Os membros da diretoria exercerão mandatos de cinco anos não coincidentes, sendo vedada a recondução. 

Para o relator, deputado Danilo Forte (PSDB-CE), o país está atrasado nas atividades de regulação e fiscalização do setor nuclear e a separação das demais atividades do setor nuclear já é adotada em países desenvolvidos. 

"No caso dos Estados Unidos, país que detém o maior número de reatores nucleares para geração de energia elétrica no mundo, a regulação do uso civil de materiais nucleares é exercida pela Comissão de Regulação Nuclear – NRC (Nuclear Regulatory Commission), agência independente do governo federal americano, instituída pela Lei de Reorganização do Setor de Energia de 1974, que iniciou suas atividades em 1975. Da mesma forma, as atividades de regulação e fiscalização do setor nuclear são exercidas por entidades independentes na França, Reino Unido, Canadá e, atualmente, no Japão", afirmou o relator. 

Pela MP-1049, a nova autarquia terá patrimônio próprio, autonomia administrativa, técnica e financeira. Sua sede e foro serão na cidade do Rio de Janeiro e sua atuação será em todo o território nacional. A ANSN não exercerá atividades de regulação econômica, comercial e industrial, nem desenvolverá pesquisas ou levantamentos para esse fim. 

O Blog tem divulgado artigos e matérias sobre o tema.  Leia “Governo estuda separar funções da Comissão Nacional de Energia Nuclear” (09/08/2019); artigos do engenheiro/servidor da CNEN, Sidney Rabello (24/5/2021) e (26/5/2021); e nota oficial da Marinha (25/5/2021). 

FOTO – Unidade de Produção de Hexafluoreto (urânio em forma de gás) em Aramar - Marinha – SP).

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