terça-feira, 17 de março de 2020

Empregados de usinas nucleares terão protocolo com medidas de prevenção ao coronavírus


A estatal Eletronuclear anunciou, nesta terça-feira (17/03), que adotou um protocolo com medidas de prevenção ao coronavírus para seus empregados que atuam na área nuclear em Angra dos Reis. Permanecerão trabalhando na empresa, principalmente, os empregados essenciais ligados à operação das usinas Angra 1 e 2, à manutenção do canteiro de obras de Angra 3 e à implementação da Unidade de Armazenamento Complementar a Seco de Combustível Irradiado (UAS).

A instituição do trabalho remoto é também uma forma de proteger esses profissionais. No atual de crise, a Eletronuclear “considera fundamental seu papel de manter o fornecimento de energia para o Sistema Interligado Nacional (SIN), dentro dos melhores padrões de segurança e produtividade. Assim, estará contribuindo para a população enfrentar os desafios que se apresentam”. 

Segundo a empresa, será adotado o trabalho remoto sempre que possível, especialmente, para aqueles colaboradores que estejam no grupo de risco estabelecido pelo Ministério da Saúde ou convivam com pessoas que nele se enquadrem. Por essas razões, o Observatório Nuclear – centro de visitação da empresa em Angra dos Reis – será fechado até segunda ordem. 

O protocolo adotado pela Eletronuclear segue as recomendações do Ministério da Saúde e da Organização Mundial de Saúde (OMS). A empresa ressalta que, até o momento, não há nenhum caso confirmado de Covid-19 entre os empregados da companhia.
Foto: Central Nuclear em Angra dos Reis (RJ).

Para conter o avanço do coronavírus está cancelado o exercício simulado de emergência para a central nuclear em Angra dos Reis


A Eletronuclear decidiu cancelar o exercício do Plano de Emergência Local (PEL) que seria realizado hoje, terça-feira (17/3), em Angra dos Reis, onde estão localizadas as usinas nucleares Angra 1 e Angra 2. A decisão levou em conta as medidas que estão sendo tomadas em todo o país – e, particularmente, no estado do Rio de Janeiro – para conter o avanço do coronavírus. 

O evento reuniria um grande número de pessoas – incluindo equipes da companhia e do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro (CBMERJ). Portanto, iria contra “as recomendações das autoridades sanitárias federais, estaduais e municipais quanto ao comportamento adequado neste momento de crise epidemiológica”, informou a Eletronuclear. 

Segundo a direção da empresa, o cancelamento não representa qualquer prejuízo ao PEL: as equipes que atuam no plano são treinadas continuamente pela empresa. Dez exercícios de emergência, além de outras ações, são realizados por ano. 

sexta-feira, 13 de março de 2020

Usina nuclear Angra 1 volta a operar, depois de quase um mês desligada


Depois de quase um mês desligada por causa de um curto circuito na conexão da excitratriz (máquina elétrica que emite corrente) com o gerador elétrico, a usina nuclear Angra 1, no município de Angra dos Reis, (RJ), foi sincronizada ao Sistema Interligado Nacional (SIN), nessa quinta-feira (12), às 20h12. A informação é da Eletronuclear, gestora das usinas, que precisou repor as peças danificadas no episódio. 

A usina está em processo de elevação de potência, devendo alcançar 100% no domingo (15). A empresa não informou o valor do prejuízo. As peças danificadas foram compradas da alemã Siemens, localizada nos Estados Unidos. 

PARALISAÇÕES - 

Angra 1 havia sido desconectada do sistema elétrico no dia 11 de janeiro para o reabastecimento de combustível (urânio enriquecido); e voltou a operar na sexta (14/2). A volta à operação ocorreu com três dias de antecedência em relação ao que foi acordado com o Operador Nacional do Sistema Elétrico.  A usina estava em processo de elevação de potência e devia atingir 100% na segunda-feira (17/2). Mas precisou ser novamente desligada sábado, por conta do curto circuito. 

Desde o ano passado estão em andamento os estudos e trabalhados para que a vida útil de Angra 1 seja prolongada por mais 20 anos. O Brasil comprou a usina em 1970 da empresa norte-americana Westinghouse, que agora participa do projeto para o prolongamento da vida útil da central atômica.
Foto: Central Nuclear em Angra dos Reis. 

BNDES investiu R$ 10,8 milhões em projeto piloto sobre descontaminação de águas em mina de urânio da INB, em Caldas (MG). E depois?


A estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB) não aproveitou os resultados de uma pesquisa no valor de R$ 10,8 milhões, do Fundo Tecnológico do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES Funtec), visando tratar águas contaminadas por metais pesados, em consequência de mineração de urânio, em sua unidade em Caldas (MG), que serviu de “cobaia” para o experimento.  O projeto piloto da empresa privada Brasil Ozônio teve os recursos liberados em 2013. Teria tido êxito quando foi encerrado há dois anos. Até hoje, contudo, a INB se vê às voltas com problemas crônicos de contaminação radioativa para o meio ambiente, enfrentando ações judiciais aplicadas pelos Ministério Público Federal e Estadual. 

A unidade de Caldas, próxima ao município de Poços de Caldas, foi a primeira no Brasil, a operar oficialmente, com mineração de urânio, em 1982, segundo a INB. Mas bem antes o local já servia de depósito para rejeitos radioativos procedentes da Usina de Santo Amaro (USAM), em São Paulo. Em 1995, a INB encerrou as atividades em Caldas, considerando a operação economicamente inviável. Somente em 2005, foi iniciada a descontaminação de suas instalações e terrenos. O plano para reduzir o problema em Caldas com recursos do BNDES começou no ano seguinte. 

BENEFÍCIOS AMBIENTAIS E ECONÔMICOS - 

Apesar de ter sido encerrada a extração de minério, a unidade deixou um grande passivo ambiental: “45 milhões de toneladas de rejeitos - amontoados de terra, pedra, argila e metais pesados, como urânio e manganês – e água contaminada acumulada nas cavas da mina. Pela rota tecnológica tradicional, seriam necessários cerca de 700 anos para a descontaminação total do terreno”, informou o BNDES na época. De acordo com o Banco, tudo começou em 2006, quando foi elaborado um plano para reduzir esse prazo para 20 anos, com um custo estimado de R$ 400 milhões, “em razão da baixa eficiência da solução tecnológica” prevista naquela época. 

O projeto que o Banco apoiava, portanto, destinava-se à descontaminação dos solos e da água por meio da injeção de gás ozônio.  Caso a alternativa se mostrasse viável – o que teria acontecido em águas – traria “benefícios ambientais e econômicos a todo o setor de mineração”. 

Pelo sistema de tratamento proposto pela Brasil Ozônio para as instalações em Caldas, a água contaminada receberia uma injeção de ozônio para oxidação dos metais pesados, que seriam retirados para posterior reaproveitamento. “A água segue para um tanque, onde é adicionada (...) para decantação dos metais remanescentes”. 

Se dependesse do negócio, possivelmente os problemas de Caldas estariam todos resolvidos: “Para as montanhas de rejeitos, a solução proposta não encontra paralelo. A ideia é injetar diretamente o gás nas montanhas de resíduos para eliminar a bactéria Thiobacillus ferrooxidasn, catalisadora de reações que produzem ácido sulfúrico”, informou o Banco, na época da realização do negócio. 

PROJETO PILOTO - 

O projeto piloto foi estruturado para ser executado em 24 meses e destinava R$ 1 milhão para 12 bolsas, pagas a pesquisadores das instituições de ciência e tecnologia que participaram. Também seriam adquiridos equipamentos e contratados profissionais e serviços de consultoria. 

Os recursos do BNDES Funtec destinaram-se à Fundação Parque de Alta Tecnologia da Região de Iperó e Adjacências (Fundação Pátria), em São Paulo. Segundo o diretor executivo da Fundação, João Luis Marins, o trabalho passou por auditorias do BNDES em maio de 2014, fevereiro de 2015 e fevereiro de 2016. Segundo ele, a Fundação Pátria devolveu ao BNDES, R$ 89.215,92, no dia 9 de setembro de 2016. 

O BNDES informou ao BLOG, que cumpriu o seu papel no projeto piloto. “O objetivo do Funtec é desenvolver a tecnologia em estágio de laboratório para que seus resultados sejam aplicados no mercado. Esse projeto se mostrou viável técnica e economicamente. Toda a prestação de contas foi correta”. 

Até o fechamento da matéria, nesta manhã (13/03/2020), a INB não respondeu às perguntas solicitadas há quatro dias:  por que não aproveitou os resultados do projeto; qual a quantidade de rejeitos que ainda armazena em Caldas; e qual o valor do investimento previsto para 2020 para a descontaminação da unidade. O projeto teve como Instituição Tecnológica a Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc), região que enfrenta problemas com a mineração de carvão. A Unesc não respondeu a BLOG. 

SOBREVIVENDO À RECESSÃO -

O empresário Samy Menasce, fundador presidente da Brasil Ozônio Indústria e Comércio de Equipamentos e Sistemas Ltda, em São Paulo, há onze anos, disse desconhecer as razões pelas quais a INB não aplicou os resultados do projeto piloto em Caldas. A empresa funciona no Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia, dentro da Universidade de São Paulo (USP). Samy Menasce concedeu esta entrevista ao BLOG. 

BLOG: Fale um pouco sobre as atividades da Brasil Ozônio. 

MENASCE: A empresa pesquisa, desenvolve, projeta, fabrica, instala e oferece manutenção de soluções para tratamento, sanitização, esterilização e oxidação a partir do ozônio. A nossa tecnologia é 100% limpa, altamente versátil podendo ser aplicada no tratamento de poços artesianos, água servida, água de chuva, água de processo, efluentes, gases tóxicos, na oxidação de metais pesados e na sanitização de alimentos e de ambientes, na agricultura, na pecuária e em processos de esterilização de materiais cirúrgicos. Após mais de onze anos de história, a Brasil Ozônio já tem mais de três mil instalações de sistemas de ozônio no Brasil, Argentina e Peru. 

BLOG: A Brasil Ozônio teve contrapartida de R$ 1,2 milhão, em pagamento de realização do projeto, instalações, equipamentos, pesquisas em campo, a profissionais, viagens. O que mais? Como foi a participação da Brasil Ozônio? 

MENASCE: Toda a concepção do projeto para o tratamento da água foi da Brasil Ozônio, a partir de sua experiência no tratamento de águas contaminadas com metais pesados , principalmente Ferro e Manganês , ou seja , dimensionamento dos equipamentos, instalações, operação, “start up”, treinamento da equipe da INB para a operação do dia a dia . No decorrer da operação, em função dos resultados obtidos, “up grade” dos sistemas de geração e transferência de ozônio, a partir de pesquisas e desenvolvimentos, até se alcançar a solução técnica e economicamente viável. Tudo desenvolvido e aplicado na prática com equipe técnica de engenharia. 

BLOG: A empresa teria concluído o projeto piloto com êxito, conseguindo tratar 15 mil litros de águas contaminadas com metais pesados, entre eles, o manganês.  A pesquisa provou de fato que a solução para o problema é a utilização do ozônio? 

MENASCE: O resultado do projeto comprovou a alta eficiência da Tecnologia Brasil Ozônio de Geração e Transferência de ozônio no tratamento de água contaminada com Manganês e Ferro, descontaminando a mesma através da oxidação desses metais.

BLOG: Como assim? 

MENASCE: Pela aplicação de ozônio em alta concentração, convertendo um enorme problema ambiental em uma possibilidade de negócio. Além de garantir o atendimento à legislação da qualidade dessa água para ser descartada novamente na natureza. O processo gera a recuperação desses metais, através filtragem. Os metais se tornam matérias primas para a fabricação de aço, portanto são passíveis de venda. 

BLOG: Por que a INB não comprou o projeto para aplicar em Caldas e acabar com o problema? 

MENASCE: Esta pergunta infelizmente não sei responder. Nosso objetivo era comprovar o uso de uma nova tecnologia como solução, o que foi amplamente alcançado. A partir da comprovação, foi elaborado um projeto a quatro mãos: Brasil Ozônio, Rede Resíduo, UNESC (Universidade Estadual de Criciúma) e INB para o tratamento da necessidade total de 300 mil litros por hora, incluindo não só o Ozônio, mas outros processos referentes à retenção de urânio, de conhecimento da INB. 

BLOG: Quanto custaria? Qual foi a receptividade? 

MENASCE: Cerca de R$ 25 milhões. Houve a participação direta de engenheiros da INB no decorrer de todo o desenvolvimento do projeto e sua solução, assim como no projeto final, os quais com certeza o levaram ao conhecimento da diretoria. 

BLOG: O BNDES investiu no projeto que teve êxito, como o senhor afirma, mas que, em nada resultou de concreto para a INB, que até hoje vive o dilema de evitar desastre ambiental. A INB responde até a processo junto ao Ministério Público Federal por contaminação do meio ambiente. Como define essa falta de interesse da INB? 

MENASCE: Não sei se pode ser classificado como falta de interesse, pois uma equipe de funcionários especializados teve participação efetiva e absolutamente interessada do início ao fim do processo. 

BLOG: O que a Brasil Ozônio ganhou investindo nesse projeto? O que representa em termos de sustentabilidade? 

MENASCE: A Tecnologia Brasil Ozonio é 100% limpa, por utilizar o ar ambiente como matéria prima, tendo como resíduo final o “Oxigênio” e baixo consumo de energia. Isso, além de ser totalmente voltada à sustentabilidade ambiental e social, tratando água, alimentos, nas indústrias, desenvolvendo agora também novas tecnologias para o Agronegócio.  O projeto promoveu um enorme “up grade” na concepção de nossa tecnologia, com o desenvolvimento de equipamentos. Nos permitiu passar a tratar volumes até 10 vezes maiores de água, gases, alimentos, por exemplo. 

BLOG: Onde o projeto está sendo aplicado? 

MENASCE: Desde o ano passado estamos sendo procurados por algumas mineradoras para projetos de pesquisa em conjunto. Posso afirmar que o “know how” e desenvolvimento adquirido no projeto da INB nos permitiu sobreviver à recessão dos últimos anos. 

BLOG:  O senhor disse que, em função dos resultados, a Brasil Ozônio criou um projeto mais amplo, para tratar 300 mil litros por hora, de água contaminada com manganês, que seria na medida para a INB. O que aconteceu com esse projeto? 

MENASCE: O projeto foi encaminhado pela INB à FINEP e pelo que consta aprovado, com responsabilidade de aporte à INB. 

BLOG: O senhor também disse que o projeto foi entregue entre 2017 e 2018. Se aplicado, custaria cerca de R$ 25 milhões e resolveria o problema da água contaminada em Caldas...

MENASCE: A Brasil Ozônio teria participação de consultoria, se o projeto fosse aprovado, pois os sistemas de ozônio necessários para o tratamento de 300.000 lt/h estão aquém de nossas possibilidades. A INB teria que contratar uma multinacional. Teria que haver um projeto conjunto. 

BLOG: Como assim? 

MENASCE: A Brasil Ozônio produz sistemas de até 1 kg/h de produção, enquanto multinacionais, de até 50 kg/h.  Portanto, seria preciso dezenas de quilos de ozônio por hora para o tratamento dos 300 mil litros por hora. A execução do projeto piloto contou com os equipamentos da Brasil Ozônio e um sistema importado. O projeto conjunto objetivou justamente a avaliação de tecnologias e previsão correta dos dimensionamentos finais de equipamentos necessários. 

BLOG: Por que a UNESC participou? 

MENASCE: A linha FUNTEC-BNDES de fomento tem como formato a participação de uma Fundação reconhecida pelo BNDES, uma UNIVERSIDADE e uma empresa PRIVADA. A escolha da UNESC se deu pelo fato de a Universidade estar sediada em Criciúma (SC), cidade que em outros tempos foi uma das maiores em quantidade de minas de carvão, hoje com um enorme passivo ambiental, contaminando rios e lagos com água contaminada com o metal Ferro, portanto possibilitando a execução do projeto em paralelo. Foi o que realmente aconteceu. Com a instalação de Sistema de Ozônio de nossa empresa também em Criciúma, numa mina desativada de carvão com geração continua de água contaminada, que foi tratada com os mesmos resultados de sucesso. 

BLOG: O senhor disse que a INB não tem tecnologia para a descontaminação da água contendo metais pesados, principalmente o manganês, depois da eliminação do urânio. E a descontaminação do solo e das montanhas com rochas? O seu projeto é só para águas? 

MENASCE: Exato. No projeto também aconteceram testes e pesquisas com aplicação de ozônio no solo. No entanto, os resultados obtidos, mesmo interessantes, não indicaram viabilidade de execução, devido principalmente, à extensão das áreas e não definição de como aplicar o ozônio diferentemente da água. A UNESC, na verdade, continua pesquisando formatos, a partir de instalação de equipamentos de ozônio em uma área para tal. 

BLOG: O senhor lembrou que o manganês é matéria prima para a indústria do aço, siderurgia. No caso, extraindo o manganês das águas, seria um processo de sustentabilidade. Pode explicar melhor? 

MENASCE:  O manganês existente nas águas está diluído, ou seja, sem possibilidade de ser extraído neste estado. O ozônio, pelo seu poder de oxidação, oxida o manganês, lhe dando mais peso e mais volume, o que possibilita a sua filtragem e, consequentemente, e sua recuperação. Isso torna este processo um exemplo de sustentabilidade, com a descontaminação da água e devolução da mesma à natureza e reuso do metal manganês como matéria prima. 

BLOG: A tecnologia da Brasil Ozônio para descontaminação é nacional? Nenhum país domina essa tecnologia? 

MENASCE: Outros países dominam a tecnologia do ozônio, mas nenhuma outra empresa possui a diversidade de aplicações que a Brasil Ozônio já desenvolveu e tem em instalações. 

FOTO: Um dos galpões do projeto piloto permanece em Caldas. 

terça-feira, 3 de março de 2020

Reator nuclear para salvar vidas não saiu do papel



  Continua emperrado, em São Paulo, o projeto de construção do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), que tem motivado empolgados discursos políticos pela autossuficiência nacional na produção de radioisótopos e fontes radioativas, aplicados no diagnóstico e tratamento de doenças como o câncer. Os radioisótopos possibilitam que os médicos vejam o funcionamento de órgãos e tecidos vivos por meio de imagens como as tomografias, radiografias e cintilografias.

A falta de decisão de governos para destravar a construção do RMB levará o país este ano a gastar mais de R$ 60 milhões (de acordo com a alta do dólar), importando radioisótopos da África do Sul, Rússia, Holanda e principalmente da Argentina. 

O Brasil importa cerca de 4% da produção mundial anual do radioisótopo molibdênio-99. O decaimento radioativo do molibdênio-99 produz o radioisótopo tecnécio-99m, utilizado nos radiofármacos (substância química) mais empregados na medicina nuclear. 

Para se ter ideia da necessidade do RMB, cerca de dois milhões de procedimentos médicos são realizados, por ano, utilizando radioisótopos, pelo Sistema Único de Saúde (SUS), em 440 clinicas cadastradas para realizar o trabalho semanalmente. Cerca de 440 mil pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e o restante pela rede privada. 

O apelo social do projeto é que a partir do funcionamento do RMB, haveria um aumento significativo da utilização do serviço pelo SUS. As informações são do engenheiro civil, mestre em engenharia nuclear e doutor em tecnologia nuclear, José Augusto Perrotta, coordenador do RMB, tecnologista sênior da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), responsável pelo empreendimento. 

A construção do RMB foi orçada em US$ 500 milhões, quando idealizada em 2009. Até hoje foram aplicados apenas R$ 230 milhões. Para a sua entrada em funcionamento, teriam que ser aplicados, em média, cerca de US$ 100 milhões, ao longo de cinco anos. 

PROMESSAS - 

Em cerimônia disputada em 2018, o projeto do RMB teve até lançamento de pedra fundamental, com a presença do presidente   Michel Temer; ministros da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicação, da Saúde, entre outras autoridades. Não faltaram promessas e frases de efeito:

 “A área da saúde se fortalecerá muito. Hoje somos obrigados a importar radioisótopos para combater várias doenças, principalmente o câncer. O tratamento hoje fica mais complicado e mais caro, porque depende de fornecedores estrangeiros. Com o reator, isso vai mudar. Vamos produzir este material para o Sistema Único de Saúde, tornando os preços mais acessíveis”, prometeu Temer. “Ter tecnologia própria é ter independência”, declarou Ferreira. Tudo ficou na base da promessa. 

CRISE MUNDIAL - 

O projeto do RMB ganhou força em 2009, a partir da crise mundial provocada pela paralisação do reator canadense National Research Universal (NRU), que atendia na época a cerca de 30% da demanda mundial de molibdênio-99. “O problema gerou o primeiro desabastecimento internacional do medicamento, algo sem precedentes”, comentou Perrotta. 

Quatro reatores de pesquisa estão em funcionamento no Brasil. Somente o reator EIA-R1, instalado no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), produz radioisótopos. O EIA-R1 funciona há 63 anos, e espera-se que tenha mais 10 anos de vida. Contudo, ele não tem capacidade de produzir radioisótopos em escala necessária. 

Por isso, o IPEN, através da CNEN, importa todo o molibdênio-99 utilizado na produção de radiofármacos.  Segundo Perrotta, a CNEN gasta US$ 15 milhões por ano com essa importação, que gera um faturamento de R$ 120 milhões, ano, recursos que vão direto para o caixa do governo.

Sem o EIA-R1, o país ficará ainda mais dependente, alerta Perrotta, em seus mais de 40 anos de experiência no setor nuclear no Brasil e exterior. 

MAQUETE DE PANFLETOS - 

Em janeiro deste ano, a CNEN participou de reunião com o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, em Brasília. O RMB esteve na pauta. Avanços do projeto foram relacionados, como o desenvolvimento do combustível nuclear (CECON) do IPEN, com urânio enriquecido a 20% no Laboratório de Enriquecimento Isotópico (LEI) do Centro Tecnológico da Marinha. 

Na reunião, eles também destacaram os avanços dos projetos de engenharia que envolvem o RMB, que terá 30 Megawatts (MW) de potência. “O projeto detalhado do reator do RMB e das instalações associadas tiveram prosseguimento com a execução a cargo da empresa argentina INVAP e da brasileira Amazul”, informa o site da CNEN. 

Lá, consta que a vontade técnica permanece em alta: “Quase 6 mil documentos de engenharia já foram emitidos e analisados, estimando-se um total de 8 mil documentos” a passarem mesmo crivo, “o que corresponde a um esforço de trabalho de mais de um milhão de homens/hora de engenharia”. 

O RMB também foi o tema principal de Grupo de Trabalho 4 (Expansão da Medicina Nuclear) do Comitê de Desenvolvimento do Programa Nuclear Brasileiro, coordenado pelo gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Na reunião, porém, Perrotta voltou a bater na tecla sobre a falta de verbas. 

Afinal, enquanto o governo não liberar verbas, RMB continuará como maquete das ilustrações da CNEN, numa área de dois milhões de metros quadrados em Iperó, a 130 quilômetros de São Paulo, junto ao Centro Experimental de Aramar, da Marinha, onde está sendo desenvolvido o protótipo do submarino nuclear.  

“Alguns estádios para as olimpíadas custaram mais do que o valor do RMB”, comentou Perrotta. Lembrou que a Argentina iniciou projeto semelhante no mesmo tempo que o Brasil. Mas o projeto argentino já está com 70% das obras prontas. “Acreditamos que podemos recuperar o tempo perdido”, acredita.

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