quinta-feira, 28 de novembro de 2019

Carência de recursos humanos para operar usinas nucleares faz acender "luz amarela", diz diretor do MME


Além da falta de recursos financeiros para finalizar as obras da usina nuclear Angra 3, em Angra dos Reis (RJ) e construir outras quatro no Nordeste, o governo tem mais um nó para desatar: a carência de recursos humanos específicos e qualificados para operar as centrais atômicas. Por conta das interrupções no programa nuclear, não houve investimento visando à formação dessa mão de obra. Além disso, muitos profissionais se aposentaram, enquanto outros entraram no programa de demissão voluntária. 

A Eletronuclear, gestora das usinas, contrata cerca de 250 técnicos especializados estrangeiros para dar suporte nas paradas para reabastecimento de combustível (urânio enriquecido) e manutenção de Angra 1 e Angra 2. Foi o que aconteceu em abril, na parada de Angra 2, e vai acontecer em janeiro, quando Angra 1 for desligada com o mesmo objetivo.

Em junho de 2020, será a vez de Angra 2, com outra contratação de estrangeiros. Hoje, 21 estrangeiros e 64 brasileiros trabalham no projeto de extensão de vida útil de Angra 1, a maioria da norte-americanos da Westinghouse, que vendeu a usina para o Brasil em 1970. 

Segundo a Eletronuclear, cerca de 600 empregados concursados trabalham em cada uma das duas usinas. Os concursados para operar Angra 3 “foram relocados em outras áreas da empresa por conta da paralisação das obras”. 

BOLSAS DE ESTUDO 

“A luz amarela” está ligada, comentou o diretor do Departamento de Informações e Estudos Energéticos, do Ministério de Minas e Energia (MME), André Luiz Rodrigues Osório, no 5º Seminário sobre Energia Nuclear, realizado dias 26 e 27/11, na UERJ, no Maracanã (RJ).  Segundo ele, que apontou a carência de recursos humanos, apenas para operar, atuar na área de sistemas e manutenção, serão necessários cerca de 500 profissionais altamente qualificados, que ainda terão de ser formados. “São necessários oito anos, no mínimo, para se capacitar um técnico operador”, observou.

“Nós perdemos muito capital humano”, acrescentou o diretor do Ministério. A carência desse capital, ocorre também porque “ninguém esperava” que as obras de Angra 3 fossem interrompidas durante mais de 20 anos. Lembrou que a construção retornou em 2010, mas foi novamente paralisada em 2015, por falta de recursos, de denúncias de corrupção envolvendo a operação “lava jato”, por exemplo.

Para o coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), professor Nivalde de Castro, que participou do seminário, uma das soluções para o problema é a concessão de bolsas de estudos para capacitação nas diversas áreas prioritárias do setor. 

IMBRÓGLIO - 

Angra 3 faz parte do acordo nuclear Brasil –Alemanha, firmado pelo Governo do general Ernesto Geisel, em 1975, com a criação da extinta Nuclebras, considerada “elefante branco”, que chegou a ter cinco mil empregados. Outras empresas, projetos e seis usinas integravam o “pacote” do acordo, mas apenas Angra 2 começou a operar comercialmente em 2001, com capacidade de gerar 1.350 megawatts (MW). 

Angra 3 tem cerca de 60% de suas obras civis concluídas e os principais equipamentos prontos, nas instalações da Eletronuclear, em Angra. A terceira usina já consumiu cerca de R$ 7 bilhões e precisa de outros R$ 15 bilhões para ser inaugurada em 2026, conforme o governo tem anunciado. Sem caixa, o governo busca parcerias internacionais. A mais recente expectativa é de que as obras comecem em 2020, se o imbróglio for resolvido. Técnicos do setor convivem também com a expectativa de a holding Eletrobras seja privatizada. 

IATO - 

A falta de capital humano pode ir mais longe, abrangendo outras categorias profissionais.  “Os engenheiros que fizeram Angra 1 e Angra 2 foram formados na década de 70”, comentou o diretor da área de geração da Eletrobras, Pedro Jatobá. “Há todo esse iato desde a década de 80”, observou. Para se ter ideia do tempo passado entre acordos e finalização das obras,  Angra 1, comprada na década de 70,  entrou em operação comercial em 1985, gerando 650 MW, quando funciona 100% sincronizada à rede elétrica. Naquela época, houve grande impasse porque os EUA se negaram a vender o combustível para a usina. O governo teve que comprar na África do Sul.  

SEMINÁRIO - 

O evento foi promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia do Instituto de Geografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IGEOG-UERJ), com correalização da Eletronuclear. Teve como objetivo debater temas diversos, desde a geração de energia ao Programa de Submarinos Nucleares, a retomada das obras de construção de Angra 3 e de novas usinas no país, além de outros temas como a aplicação da radiação na medicina, indústria e agricultura. Visava ainda estimular o interesse de novos profissionais neste mercado de trabalho e incentivar o desenvolvimento tecnológico e a inovação. Foi organizado pela Caa Viva em parceria com a Pressway Produções.

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