quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Pela primeira vez reator nuclear de pesquisa de 68 anos produz radioisótopo para combater o câncer, via convênio entre Marinha e IPEN

 


Militares da Marinha e técnicos do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), conseguiram produzir um radioisótopo (medicamento) para combater o câncer, em especial o de próstata, através do reator de pesquisa IEA-R1, que passou a operar em turnos de revezamento, de forma continua, na semana em que completa 68 anos. O material produzido pela primeira vez no reator passa a ser utilizado na Radiofarmácia do IPEN, dando origem a radiofármacos vitais para a medicina nuclear. 


A operação pode contribuir para reduzir a dependência externa no país na produção de radioisótopos. O IEA-R1 começa a funcionar na forma experimental produzindo pequenas quantidades de Lutécio-177, radioisótopo utilizado na marcação de moléculas específicas de alto valor terapêutico, considerado referência no tratamento de tumores neuroendócrinos e no combate ao câncer de próstata. O convênio entre Marinha e IPEN, válido até 2027, prevê ainda a produção nacional de Iodo-131 e a realização de novas pesquisas sobre elementos químicos a serem irradiados. 

Apenas em 2023 e 2024, o Brasil importou cerca de US$ 50 milhões em radioisótopos como Molibdênio-99, Iodo-131 e o próprio Lutécio-177, segundo o IPEN. A produção em grande escala tem potencial para gerar economia anual significativa, reforçar a soberania científica e tecnológica e ampliar o acesso da população a terapias nucleares avançadas. 

O Diretor-Geral de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico da Marinha, Almirante de Esquadra Alexandre Rabello de Faria, ressaltou a importância da formação dos militares: “Esse processo de qualificação é muito especial para o Programa Nuclear da Marinha. A gente fica feliz porque é um processo difícil e eles conseguiram. Isso demonstra que nosso pessoal tem potencial e muita capacidade. Essa formação vai ao encontro da natureza da profissão militar, que é servir. Esses militares estão servindo e prestando um serviço para produzir o bem, colaborando com a produção de radiofármacos e com sua entrega ao serviço de saúde”. 

O presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), Francisco Rondinelli Junior, destacou que a iniciativa simboliza um marco de cooperação institucional e de entrega direta à sociedade. “Este momento entrega para a sociedade profissionais capacitados, capazes de explorar o potencial da área nuclear em termos de aplicações, desenvolvimento e saúde. A utilização na medicina é apenas um dos exemplos, mas o alcance é muito maior. É, sem dúvida, um momento de muita satisfação e de celebração, fruto de uma parceria que deve continuar por muito tempo”, afirmou Rondinelli. 

A coordenadora do Centro de Radiofarmácia do IPEN, Elaine Bortoleti, destacou que a operação contínua do reator representa um marco após mais de uma década. “Já fazia mais de dez anos que o reator não operava de forma contínua. Essa retomada possibilita a produção de amostras de material radioativo que servem como matéria-prima essencial para a fabricação de radiofármacos utilizados na medicina nuclear. Produzir localmente traz autonomia, já que hoje praticamente quase tudo precisa ser importado. Mesmo sendo ainda uma produção experimental e em pequenas quantidades, é um primeiro passo muito importante, que abre expectativa de crescimento e de atender parte da nossa demanda por esses insumos fundamentais para a saúde”. 

A produção em grande escala tem potencial para gerar economia anual significativa, reforçar a soberania científica e tecnológica e ampliar o acesso da população a terapias nucleares avançadas, segundo o coordenador do contrato de parceria, designado pela Marinha, capitão de mar e guerra Enéas Tadeu Fernandes Ervilha, e o gerente do reator, Frederico Genezini, que destacaram  os avanços obtidos na cooperação entre a Marinha e o IPEN. “O progresso decorre do Acordo de Parceria para Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação, firmado entre o CTMSP e o IPEN/CNEN, cujo objetivo é capacitar operadores de reator nuclear e fomentar a pesquisa aplicada à produção de radioisótopo”. 

O comandante Enéas frisou, ainda, que a experiência dos operadores atende a parte dos requisitos de qualificação técnica nuclear exigidos aos futuros candidatos a operadores do Laboratório de Geração de Energia Nucleoelétrica (LABGENE) Este equipamento faz parte do projeto do primeiro submarino nuclear brasileiro. 

Eles falaram sobre o desempenho dos militares da Marinha no êxito do reator para a obtenção dos radioisótopos. Em 2023, quatro operadores sênior e seis operadores de reator foram licenciados pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN); em 2024, outros nove conquistaram a habilitação. Neste ano, um supervisor e quatro técnicos de proteção radiológica já foram credenciados, enquanto cinco candidatos aprovados na prova escrita aguardam a avaliação prático-oral marcada para setembro. Os militares da Marinha alcançaram 100% de aprovação nos processos de licenciamento da CNEN. Esse resultado permitiu a formação de equipes de turno compostas por operadores da Força Naval e do IPEN, altamente qualificadas e em número suficiente para viabilizar o início da operação destinada à produção do Lutécio-177. 

Para o coordenador do programa de treinamento e professor José Roberto Berretta, a formação do IPEN é fundamental para preparar operadores de reatores. Ele destaca que a estratégia do curso é compartilhar ao máximo as informações sobre a instalação, proporcionando um aprendizado prático e aprofundado. 

O professor também ressalta que um bom operador de reator deve ter um conhecimento amplo de diferentes reatores, e não se limitar a apenas um. Essa abordagem, segundo ele, eleva os padrões de segurança operacional. Informaram que desde o início de agosto, a operação em regime contínuo, com turnos de vinte e quatro horas tem sido conduzida por equipes da Marinha e do IPEN. Após a obtenção da licença, os militares passaram a integrar oficialmente a rotina operacional do reator. 

“O Grupo de Proteção Radiológica é essencial para garantir que a operação em turnos ocorra com total segurança, tanto para o reator quanto para as equipes envolvidas. O trabalho assegura que cada etapa da produção do Lutécio-177 seja conduzida dentro dos mais rigorosos padrões de proteção radiológica e segurança nuclear”. 

A superintendente do IPEN, Isolda Costa, ressaltou que os resultados alcançados demonstram a importância da complementaridade entre as instituições, especialmente para garantir a transferência e a preservação de conhecimentos para as novas gerações. 

“O benefício dessa parceria é enorme. Sem o IPEN, não haveria transferência de conhecimentos, e sem os militares da Marinha não teríamos pessoal capacitado para operar o reator de forma contínua, inclusive, durante a madrugada. Essa sinergia é fundamental, pois garante a preservação do conhecimento, ao mesmo tempo em que forma novas gerações capazes de levar adiante esse legado para o futuro”, afirmou Isolda. 

“Com a validação concluída, a Marinha e o IPEN iniciaram a produção nacional de Lutécio-177, insumo essencial no tratamento do câncer. A iniciativa reduz a dependência de importações e amplia a oferta de radiofármacos, fundamentais para pacientes em todo o País”. 

BREVE HISTÓRIA DO REATOR, POR FREDERICO GENEZINI. 

"Na madrugada de 16 de setembro de 1957, o reator nuclear de pesquisas IEA-R1, do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen/Cnen-SP), atingiu sua primeira criticalidade e permanece, desde então, operando com segurança. São inumeráveis as contribuições do reator na ciência, impulsionando o Programa Nuclear Brasileiro (PNB) há mais de seis décadas. 

O IEA-R1 é um reator de pesquisas tipo piscina, moderado e refrigerado à água e que utiliza elementos de berílio e de grafite como refletores. Operou nas duas primeiras décadas a uma potência de dois megawatts (2 MW), atualmente é licenciado para operar a uma potência máxima de 5 MW. Atua em P&D e serviços de irradiação com nêutrons para as seguintes finalidades: produção de radioisótopos para uso em Medicina Nuclear, produção de fontes radioativas para gamagrafia industrial e de radioisótopos para uso como radiotraçadores, irradiação de amostras para a realização de análises multielementares, pesquisas em Física Nuclear, serviços de neutrongrafia e treinamento de pessoal licenciado para operação de reatores".

(FOTOS E FONTES – AGÊNCIA DE NOTÍCIAS e ASSESSORIA DE IMPRENSA MARINHA) – FOTO IPEN – ARQUIVO BLOG) – 

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