O Brasil continuará refém dos Estados Unidos na área nuclear, caso não desenvolva sua própria tecnologia, alertavam alguns cientistas na década de 50. Para se ter ideia, pelo transporte aéreo de 90 toneladas de equipamentos para Angra 1, produzidos pela indústria norte-americana, mais precisamente a Westinghouse, a Eletronuclear pagou R$ 8 milhões, visando prorrogar por mais 20 anos a vida útil da usina nuclear inaugurada em 1985. Quanto custaram os equipamentos, que esta semana chegaram no Aeroporto de Cabo Frio (RJ), procedentes de Miami?
Por caminhões, seguirão de Cabo Frio à Central Nuclear de Angra dos Reis (RJ) para onde serão transportados 3.900 itens, distribuídos em 34 volumes, incluindo dez contêineres de 20 pés.
As peças chegaram dos EUA em dois voos fretados, em três aviões Boeing 747, um dos maiores aviões de carga do mundo. A parada de manutenção de Angra 1, provavelmente em abril, será utilizada para “cumprir algumas das condicionantes estabelecidas na renovação da licença por mais 20 anos”, concedida em novembro pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN, que até hoje mantém as funções de legislar, executar e fiscalizar o setor nuclear. No transporte de Miami a Cabo Frio foram envolvidos funcionários da área técnica e da equipe de Logística Internacional e Comércio Exterior, segundo a Eletronuclear. Desde a década de 90, técnicos, inclusive da CNEN previam que Angra 1 poderia operar até mais 24 anos, ou seja, até 2018, enquanto outros, apostavam em 2008.
A usina norte-americana batizada de brasileira continuou operando com as suas diversas paralisações, que envolvem cifras nunca reveladas como esta agora, de Miami para o Aeroporto de Cabo Frio.
BREVE HISTÓRIA -
Angra 1 tem capacidade para produzir 640 Megawatts, quando funciona com 100% de sua potência, o equivalente a 10% da energia elétrica consumida na cidade do Rio de Janeiro. A história do nascimento da usina começou no final da década de 60, em plena ditadura militar. Mas foi em 1970 que a Westinghous se juntou a Empresa Brasileira de Engenharia (EBE) e venceu a concorrência pública internacional realizada por Furnas (então gestora do projeto) para construir Angra 1.
A Westinghouse vendeu ao Brasil um reator PWR (Pressurized Water Reactor). O Eximbank concedeu à Furnas um crédito de US$ 138 milhões. No dia 7 de abril de 1972, o governo brasileiro assinou um dos seus contratos no valor de U$S 102 milhões para o pagamento de equipamentos e a fabricação do combustível nuclear (urânio enriquecido) para Angra 1. O combustível seria assim obtido o yelloucake viria da África do Sul, a Inglaterra transformaria o produto em hexafluoreto (urânio em forma de gás) e aos EUA caberia realizar o enriquecimento.
Na avaliação de muitos especialistas, naquela época, o governo brasileiro consolidou a sua dependência perante os EUA, ao escolhe este país como único fornecedor de combustível para Angra 1. Não tardou para acontecer o esperado pela comunidade cientifica independente: por conta da crise do petróleo em 1973, os norte-americanos deram os primeiros sinais de que suspenderiam a garantia do fornecimento de combustível, que acabou sendo importado da África do Sul. Muita coisa aconteceu até a inauguração da usina em 1981, adiada depois para 1985.
RENASCEM POLÊMICAS: DA NUCLEP À FORMAÇÃO DE PESSOAL -
Com as transações brasileiras com os EUA envolvendo mais 20 anos de vida útil para Angra 1 renascem polêmicas sobre o abatimento da indústria nacional e da falta de investimento em recursos humanos para a área nuclear, por exemplo. O BLOG consultou experientes técnicos e um deles questionou a não utilização da NUCLEP, em Itaguaí (RJ), criada pelo acordo nuclear Brasil-Alemanha, em 1975, para suprir com equipamentos os projetos das centrais nucleares de Angra dos Reis.
A Nuclep chegou a produzir equipamentos para Angra 3 (obras paradas), por exemplo, mas pouco avançou na tecnologia para manter o setor como se queria no passado. O País continuou refém da indústria norte-americana, no caso de Angra 1; e da Framatome francesa, sucessora da Siemens, alemã, no caso de Angra 2. Até mesmo na fase de troca de combustível dessas usinas nucleares, o Brasil precisa contratar centenas de técnicos estrangeiros, pelo fato de não dominar totalmente todas as tarefas e por ser “mais barato trazer esse pessoal de fora”, argumentam alguns. Se continuar assim, quais os avanços que o país terá mais adiante? Engenheiros nuclear formados pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) estão sendo contratados pela Westinghouse e outras empresas internacionais e dificilmente voltarão ao Brasil.
O país, aliás, sequer oferece concursos público no setor nuclear. E os que acontecem oferecem reduzidos número de vagas, como ocorre agora com a CNEN, que tem déficit de mais de mil servidores e anuncia concurso para apenas 150 vagas, via Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). O Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN/CNEN), em São Paulo, responsável pela produção de radioisótopos (medicamentos para diagnóstico e tratamento contra o câncer), já teve mais de 1600 funcionários e hoje são menos que 600 por falta de reposição das vagas. “Laboratórios estão encerrando atividades e a manutenção e transferência do conhecimento estão comprometidas”, comentaram especialistas. Caso continue nesse ritmo, nos próximos anos, até para desmontar Angra 1 o preço será infinitamente alto, comentaram técnicos do BLOG.
(FOTOS: Equipamentos/Cabo Frio/ Eletronuclear; Angra 1 – começo – acervo Furnas; e Angra 1 – Eletronuclear - acervo CNEN/IPEN) -
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