segunda-feira, 22 de dezembro de 2025

Justiça condena a INB em Ação Civil Pública com denúncias de contaminação radioativa de alto risco

 


A Juíza do Trabalho substituta, Nara Duarte Barroso Chaves, do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região da Vara do Trabalho de Guanambi, na Bahia, acolheu na quinta-feira (18/12) a Ação Civil Púbica (ACP) nº 0010140-28.2015.5.05.0641, proposta pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), e pelo Sindicato dos Mineradores de Brumado e Microrregião, (SINDIMINE), contra a Indústrias Nucleares do Brasil (INB). No processo que está completando 10 anos, a empresa é acusada de diversas irregularidades praticadas contra trabalhadores e o meio ambiente da unidade de Concentração de Urânio (URA), em Caetité (BA). 


A ACP foi proposta em decorrência de um processo investigativo complexo e prolongado, instaurado a partir de diversas denúncias formuladas por trabalhadores, sindicatos e organizações sociais sobre as condições precárias de saúde e segurança do trabalho na unidade de Caetité. A INB é vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTI), responsável por toda a cadeia produtiva do urânio no país, desde a extração do minério até a fabricação do combustível nuclear utilizado em usinas brasileiras. A unidade integra a etapa intermediária dessa cadeia, dedicada ao beneficiamento do urânio para obtenção do concentrado denominado yellowcake (urânio em pasta ou pó amarelo). 

Para o advogado do SINDIMINE, João Gabriel Pimentel Lopes, “o resultado da ação é extraordinário” porque a Justiça reconheceu a “negligência da INB”. Ele enfatizou que é a reafirmação do compromisso do Sindicato e do Ministério Público com os direitos dos trabalhadores. “É importante destacar também a relevância de uma decisão que reconhece o dano pela exposição radioativa a milhares de pessoas que conviverão o resto de suas vidas com o medo da contaminação”, comentou o advogado. Para a auditora fiscal e engenheira do trabalho aposentada, Fernanda Giannasi, assistente no processo naquela época, a investigação revela parte de uma grande “caixa preta” fruto dos tempos da “ditadura militar, quando ninguém podia divulgar nada”. 

A INB pode recorrer. O Blog aguardou retorno da empresa até o fechamento desta matéria às 18h30h. Ás 19h37 a INB  enviou nota ao Blog afirmando que "o andamento mais recente do processo, de 2015, ainda não foi publicado. Declarou que "sempre atuou em estrita observância à legislação trabalhista e que, ao longo de toda a sua trajetória, manteve como prioridade a segurança e integridade de seus trabalhadores, cumprindo rigorosamente todas as determinações dos órgãos de fiscalização e controle".  E acrescentou: "Convicta de que não houve qualquer descumprimento normativo, a empresa informa que, assim que for formalmente notificada, adotará todas as medidas processuais cabíveis para o pleno esclarecimento dos fatos e reafirma sua confiança na atuação justa e imparcial do Poder Judiciário para o julgamento do processo".  

 ALTISSIMO RISCO - 

A ação inicial destaca que a URA começou as suas atividades no ano de 2000, extraindo (na mina) e beneficiando em média 400 toneladas anuais de yellowcake, processo que envolve diversas etapas produtivas (lavra, britagem, lixiviação, separação, precipitação, secagem e entamboramento) todas permeadas por riscos ocupacionais severos. Afirma que, em todas essas fases, os trabalhadores estavam sujeitos a partículas alfa e gama, bem como a substâncias químicas utilizadas no beneficiamento do minério, fatores reconhecidamente capazes de provocar neoplasias malignas, leucemias, síndromes mielodisplásicas, infertilidade, hipoplasia medular, entre outras doenças graves. 

Ressalta, ainda, que não existem níveis seguros de exposição contínua à radiação ionizante, sendo presumido o nexo causal entre essa condição de trabalho e diversas enfermidades listadas pelo próprio Regulamento da Previdência Social. Segundo a narrativa, diversos órgãos públicos (a exemplo da SUVISA, CESAT, Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal e Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) constataram sucessivas irregularidades na unidade, tais como: acesso irrestrito a áreas controladas, ausência de higienização adequada de uniformes contaminados, níveis elevados de poeiras radioativas e sílica cristalina, inexistência de programas de proteção respiratória e uso de equipamentos de proteção individual insuficientes. 

As atividades da instalação, pela sua própria natureza, envolvem altíssimo grau de risco à saúde humana e ao meio ambiente, tendo em vista a manipulação de radiações ionizantes, radionuclídeos de elevada toxicidade, solventes químicos agressivos, ácidos concentrados e resíduos radioativos de longa duração. “Por esse motivo, sustenta-se que a INB está legal e constitucionalmente obrigada a adotar padrões máximos de segurança industrial, gestão ambiental, controle médico e prevenção de acidentes. No entanto, de acordo com a ação inicial, essa obrigação não tem sido cumprida. Ao contrário, o MPT sustenta que a operação da unidade de Caetité caracteriza um quadro institucionalizado de negligência e descumprimento”, destacou a magistrada.  

VAZAMENTO DE MATERIAL RADIOATIVO - 

No processo, o MPT relata que as primeiras denúncias acerca das condições de trabalho na INB chegaram ao órgão ministerial no início dos anos 2000. “Trabalhadores relataram a ocorrência de vazamentos de material radioativo, ausência de equipamentos de proteção individual adequados, falta de controle médico periódico, exposição a substâncias tóxicas e inexistência de barreiras de contenção”, consta no processo. 

Diante da gravidade dos relatos, o Ministério Público do Trabalho (MPT) instaurou procedimentos administrativos e passou a atuar em conjunto com outros órgãos públicos e entidades técnicas, incluindo o Centro Estadual de Referência em Saúde do Trabalhador (CESAT), a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB), a Universidade Federal da Bahia (UFBA), o Ministério Público Federal (MPF) e a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE). 

CENÁRIO ALARMANTE - 

“A partir desse esforço conjunto, foram programadas vistorias técnicas periódicas nas instalações da unidade de Caetité, com coleta de amostras ambientais, inspeções físicas nas áreas de risco, entrevistas com trabalhadores e análise de documentos internos da empresa. Os resultados das primeiras inspeções revelaram um cenário alarmante e generalizado de irregularidades. Em praticamente todos os setores produtivos, foram detectadas condições ambientais e organizacionais incompatíveis com as exigências legais e técnicas aplicáveis às atividades com risco radiológico e químico”, de acordo com a ACP. 

Segundo a ação inicial, uma das primeiras irregularidades constatadas foi a presença de material radioativo acumulado em superfícies internas das instalações industriais, incluindo pisos, paredes e equipamentos, além de depósitos de poeira radioativa sobre luminárias e sistemas de exaustão. “Esse achado foi interpretado pelos técnicos como indício inequívoco de que os sistemas de ventilação e filtragem do ar eram ineficientes para remover partículas contaminantes em suspensão. 

Ainda nas inspeções iniciais, foram identificadas aberturas estruturais e falhas de vedação em paredes e dutos, por onde partículas de urânio escapavam para áreas externas e comuns. Tais constatações, segundo o MPT, evidenciavam a inexistência de um sistema de contenção eficaz e a consequente dispersão do material radioativo para além dos limites das áreas controladas. “Com a continuidade das inspeções, passou-se a identificar irregularidades ainda mais graves”. 

O processo menciona diversas irregularidades. “Uma delas diz respeito às tubulações de ácido sulfúrico utilizadas no processo de beneficiamento. Segundo os relatórios técnicos citados na inicial, essas tubulações apresentavam níveis avançados de corrosão e múltiplos pontos de vazamento, permitindo que o ácido escorresse diretamente para o solo”. 

QUEIMADURAS QUIMICAS - 

O MPT sustenta que tais vazamentos não apenas representam grave risco à saúde dos trabalhadores, expostos a queimaduras químicas e inalação de vapores tóxicos, como também ameaçam o meio ambiente local, com potencial de contaminação do lençol freático e dos cursos d’água subterrâneos. O MP ressalta que, além do risco de contaminação direta dos trabalhadores, a ausência de contenção adequada poderia gerar vazamentos radioativos para o ambiente externo. 

O MPT afirma, também, que a área de britagem, onde ocorre a fragmentação do minério, não possui sistema de impermeabilização do solo. “Dessa forma, partículas contaminadas liberadas durante o processo penetram no solo e, em períodos de chuva, são arrastadas para o lençol freático, ampliando o risco ambiental e comprometendo a saúde pública”. E mais: “Com o avanço das investigações e a divulgação dos relatórios preliminares, novos trabalhadores passaram a relatar ao MPT situações preocupantes de exposição e omissão. Muitos denunciavam que não recebiam treinamento adequado sobre os riscos das substâncias manipuladas, que os equipamentos de proteção fornecidos eram inadequados ao tipo de agente perigoso presente e que uniformes contaminados eram levados para casa para lavagem doméstica, expondo familiares, inclusive crianças, a materiais radioativos”. 

Diante da crescente gravidade dos fatos, informa o MP, “ampliou-se o escopo das investigações, passando a analisar não apenas as condições ambientais, mas, também, a gestão médica ocupacional, a organização do trabalho, os programas de segurança coletiva e as práticas de vigilância pós-ocupacional”. O resultado dessa ampliação, informou, “foi a constatação de que as irregularidades não eram pontuais ou acidentais, mas, sim, estruturais e permanentes, fazendo parte do próprio modo de operação da empresa. Com o aprofundamento das investigações e a análise dos documentos apresentados pela ré, passou-se a sustentar que as irregularidades identificadas não se limitavam ao ambiente físico da planta industrial, mas alcançavam, também, a gestão médica ocupacional e os programas obrigatórios de saúde e prevenção”. 

De acordo com a ação inicial, a ré não implementa um Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) compatível com os riscos existentes na atividade de beneficiamento de urânio. O MPT afirma que o programa vigente é superficial, insuficiente e dissociado da realidade operacional da empresa, não contemplando protocolos específicos para trabalhadores expostos a radiações ionizantes, metais pesados, solventes tóxicos e agentes carcinogênicos. O MP alega que os empregados não são submetidos aos exames complementares obrigatórios previstos nas normas nacionais e internacionais. Em especial, não são realizados exames de bioanálise in vivo (como a contagem de corpo inteiro) e in vitro (análises radioquímicas de urina e fezes), tampouco dosimetria citogenética, todos essenciais para a detecção precoce de contaminações internas e para a adoção de medidas terapêuticas imediatas. 

O MPT sustenta que a situação se agrava diante da constatação de que, mesmo em casos de exposição acidental, planejada ou emergencial, a empresa não realiza os exames imediatos exigidos pela Convenção nº 115 da OIT e pelas normas da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). “Essa omissão impediria, por consequência, a correta identificação do grau de contaminação dos trabalhadores e comprometeria a sua recuperação clínica. O órgão ministerial também aponta falhas graves na periodicidade e abrangência dos exames clínicos regulares, afirmando que não há acompanhamento médico longitudinal ao longo da carreira dos trabalhadores, nem programas estruturados de vigilância pós-ocupacional. Ressalta que muitas das doenças associadas à exposição a urânio e radionuclídeos possuem longo período de latência, exigindo acompanhamento contínuo mesmo após o desligamento do trabalhador, o que não ocorre no caso da ré. 

CONTAMINAÇÃO EM FAMÍLIA -

 Ao longo das investigações, o MPT sustenta que foi possível identificar uma dimensão ainda mais preocupante das irregularidades: a exposição indireta de familiares e da comunidade ao redor das instalações da INB. Segundo a inicial, a ré permite que uniformes potencialmente contaminados sejam lavados fora do ambiente industrial, geralmente nas residências dos trabalhadores, expondo familiares a partículas radioativas. Essa prática, segundo o MPT, configura grave violação ao direito fundamental à saúde e ao meio ambiente equilibrado, uma vez que amplia o alcance dos riscos para além dos limites do ambiente laboral. 

O MPT afirma que também há risco de dispersão ambiental de radionuclídeos devido às falhas estruturais e à ausência de barreiras de contenção. “O acúmulo de material radioativo em pisos e estruturas internas, somado à inexistência de sistemas adequados de ventilação e exaustão, possibilita que partículas sejam transportadas pelo ar para áreas externas e se depositem em regiões próximas, potencialmente afetando a população vizinha. Além disso, a falta de impermeabilização em áreas de britagem e a corrosão em tubulações de ácido sulfúrico aumentariam o risco de contaminação do lençol freático, com efeitos que podem se estender a comunidades próximas e ao meio ambiente local”. 

Para o MPT, essa dimensão coletiva do risco reforça a necessidade de atuação judicial urgente e abrangente. Outro ponto importante da causa de pedir, segundo o MPT, diz respeito à exposição ocupacional a agentes físicos nocivos, especialmente o ruído. A inicial relata que a empresa não realiza medições representativas e contínuas dos níveis de ruído nos setores produtivos. Em vez disso, as medições são pontuais e esporádicas, não refletindo as reais condições de exposição dos trabalhadores. Mesmo assim, as medições realizadas indicam níveis alarmantes de pressão sonora, com vários registros. Registros na carpintaria e na sala de máquinas, valores que ultrapassam, em muito, os limites de tolerância previstos na legislação trabalhista e nas Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho. 

O MPT sustenta que, além de não realizar monitoramento adequado, a ré não adota medidas coletivas de controle, como enclausuramento de equipamentos, instalação de barreiras acústicas ou isolamento de fontes de ruído. Tal conduta, segundo a inicial, viola frontalmente a NR-9, que estabelece a prioridade das medidas de proteção coletiva sobre as individuais.  A ausência dessas medidas expõe os trabalhadores a um alto risco de perda auditiva induzida por ruído (PAIR) e outras doenças ocupacionais, configurando, segundo o MP, uma violação continuada do direito fundamental à saúde e à segurança no ambiente de trabalho. 

As investigações realizadas ao longo dos anos também permitiram, segundo o MPT, identificar graves deficiências ergonômicas e organizacionais na unidade da ré. Em vários setores produtivos, foram observadas condições precárias de conforto térmico, iluminação e ventilação, com temperaturas elevadas, ausência de isolamento térmico e circulação inadequada do ar. Tais condições impactam diretamente a saúde dos trabalhadores e reduzem a eficácia dos sistemas de proteção individual e coletiva. Além disso, a disposição dos equipamentos e a organização dos postos de trabalho obrigam os trabalhadores a permanecerem por longos períodos em posturas forçadas e a realizarem movimentos repetitivos sem pausas adequadas, aumentando o risco de lesões musculoesqueléticas e distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho. 

O MPT também denuncia a ausência de controle de acesso adequado a áreas classificadas como controladas ou supervisionadas. Segundo a inicial, trabalhadores e até terceiros circulam livremente por zonas onde há presença de material radioativo, sem barreiras físicas ou sinalização de risco. Essa prática aumenta exponencialmente a probabilidade de exposição acidental e viola as normas da CNEN. No tocante aos equipamentos de proteção individual, a inicial sustenta que eles são frequentemente inadequados ao tipo de risco presente. Por exemplo, máscaras com filtros apenas para partículas são fornecidas em locais onde seriam necessários filtros contra gases tóxicos. Tal prática evidencia, segundo o MPT, falta de gestão técnica dos EPIs e desrespeito às normas que regulam sua seleção e fornecimento. 

“À medida que novas fiscalizações eram realizadas e os relatórios técnicos se acumulavam, o MPT passou a sustentar que a situação na unidade de Caetité não era resultado de falhas isoladas ou pontuais, mas sim de uma cultura organizacional baseada na negligência sistemática e na desconsideração das normas de saúde e segurança”. 

Os documentos anexados à inicial demonstrariam que as irregularidades persistiam mesmo após diversas recomendações e notificações. O MPT afirma que o conjunto de fatos apurados demonstra uma violação direta e continuada aos direitos fundamentais dos trabalhadores, notadamente o direito à vida, à saúde, à integridade física e ao meio ambiente do trabalho equilibrado. 

O MPT requer, ainda, a condenação da ré ao pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais). Sustenta que o valor é proporcional à gravidade e à extensão das condutas ilícitas praticadas, ao porte econômico da empresa e ao número de trabalhadores atingidos. A inicial argumenta que a reparação pleiteada possui dupla função: compensatória, pela violação aos direitos fundamentais dos trabalhadores e da coletividade; e pedagógica, como instrumento de desestímulo a práticas semelhantes no futuro. 

A INB SE DEFENDE NA ACP- 

A INB apresentou contestação à Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Trabalho. Argumenta que todas questões ambientais formuladas na petição inicial “são desenvolvidas dentro dos mais elevados padrões de segurança, saúde ocupacional e respeito à legislação vigente”. “A empresa contextualiza a sua natureza jurídica e o papel que desempenha no cenário nacional, enfatizando a relevância estratégica de sua atuação e a submissão a regime jurídico especial em razão das funções que exerce no setor nuclear”. Justifica que por trata-se de atividade monopolizada pela União, desempenhada “em conformidade com o texto constitucional e com as leis que regem o setor nuclear, sujeita a intensa fiscalização de órgãos reguladores e a rígidas normas de proteção ambiental e de segurança do trabalho”. 

A empresa destaca que integra o Sistema de Proteção ao Programa Nuclear Brasileiro (SIPRON), coordenado diretamente pelo Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, o que evidencia a relevância estratégica e a responsabilidade institucional de suas operações. A defesa contesta a forma como a investigação foi conduzida pelo MPT e critica a ausência de diálogo institucional ou tentativa de solução extrajudicial prévia ao ajuizamento da demanda. Sustenta que sempre colaborou integralmente com os órgãos fiscalizadores, inclusive com o próprio Ministério Público do Trabalho, fornecendo todos os documentos e informações solicitados no curso do inquérito civil. 

A INB argumenta que diversas das irregularidades apontadas na inicial simplesmente não existem ou já foram integralmente sanadas há muito tempo.  

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domingo, 21 de dezembro de 2025

Projeto do Reator (RMB) para combater o câncer avança em 2026 com obras em andamento

 

Em artigo para o blog, publicado em 16/12/21, o deputado Alexandre Padilha (PT/SP), atual ministro da Saúde, condenou a PEC da privatização visando à produção dos radioisótopos pela iniciativa privada. E escreveu: “Além da área da saúde, a proposta (de privatização) dá uma facada no projeto do reator multipropósito, que garante soberania de produção do insumo para que o Brasil não precise mais importar”. 


Rio de Janeiro, 21 de dezembro de 2025 - As obras de infraestrutura de implantação do projeto do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), que dará ao Brasil soberania na produção de radioisótopos (medicamentos para diagnosticar e combater o câncer), iniciadas em fevereiro, estão previstas para serem concluídas no primeiro semestre de 2026, em Iperó, São Paulo. A informação é da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). 


Fotos das obras projeto foram divulgadas hoje com a entrega da ponte de acesso e terraplenagem do núcleo administrativo. A próxima fase, de construção civil, tem conclusão prevista para 2030. Segundo a CNEN, “o modelo de contratação está sendo estabelecido, tendo sido realizadas reuniões com a empresa argentina INVAP, fruto do Acordo Bilateral e Comitê Binacional Brasil-Argentina (COBEN), para esta definição”. Com o RMB o Brasil poderá produzir matéria-prima para a produção de radioisótopos que ainda são importados, evitando o desabastecimento, como ocorreu em 2021. 


Esta é a primeira vez que projetos na área de ciência e tecnologia entram nas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (Novo PAC). Em 2024, foram contratados mais de R$300 milhões para o RMB. E, até 2026, a previsão é de que o aporte total do MCTI seja de R$ 926 milhões. A construção do RMB foi orçada em US$ 500 milhões, quando idealizada em 2009. Até 2021, foram aplicados apenas R$ 230 milhões. Para a sua entrada em funcionamento teriam que ser aplicados, em média, cerca de US$ 100 milhões por cinco anos, conforme dados oficiais, já publicados pelo BLOG. 

O projeto inicial (veja a maquete) estava numa área de dois milhões de metros quadrados em Iperó, a 130 quilômetros de São Paulo. Na área de saúde, especificamente em medicina nuclear, o RMB garantirá a autossuficiência na produção do radioisótopo Molibdênio-99, essencial para a obtenção do Tecnécio-99m, utilizado em diagnósticos médicos, assegurando um fornecimento para atender a demanda da população brasileira. Também possibilitará a nacionalização de outros radioisótopos usados em diagnóstico e terapia. 

PESQUISA CIENTÍFICA 

Na área de reatores e ciclo do combustível nuclear, o RMB será uma infraestrutura essencial para o desenvolvimento de combustíveis nucleares e materiais utilizados em reatores, viabilizando a qualificação de combustíveis para propulsão nuclear, reatores das centrais nucleares brasileiras e novas tecnologias, como os pequenos reatores modulares (SMR). Na pesquisa científica e inovação, o RMB ampliará a capacidade nacional com a utilização de feixes de nêutrons, possibilitando análises avançadas por ativação com nêutrons, desenvolvimento de novos materiais e aplicações em nanotecnologia, biologia estrutural e outras áreas científicas, tornando-se um laboratório de referência na América Latina. 

COLABORAÇÕES - 

O RMB é um projeto do MCTI coordenado pela CNEN, com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), e conta com a colaboração de diversas instituições, incluindo a Fundação PATRIA, AMAZUL, INVAP (Argentina), Intertechne (Brasil), WALM, TRACTEBEL e, mais recentemente, a SCHUNCK (Brasil). 

O projeto de concepção foi elaborado no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), unidade da CNEN em São Paulo, sob a coordenação de José Augusto Perrotta e sua equipe, com apoio das demais unidades da CNEN: Instituto de Engenharia Nuclear (IEN) e Instituto de Radioproteção e Dosimetria (IRD), no Rio de Janeiro; Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN), em Belo Horizonte; e Centro Regional de Ciências Nucleares do Nordeste (CRCN-NE), em Recife. 

SAIU DO PAPEL - 

Poucos projetos nacionais foram tão mencionados em discursos dentro e fora do Brasil, como o RMB. Quem sentiu na o problema na pele foi a população doente que no ano de 2022 esteve na iminência de parar o tratamento por falta de radiofármacos (medicamentos) produzidos a partir dos radioisótopos. Os radioisótopos possibilitam que os médicos vejam o funcionamento de órgãos e tecidos vivos por meio de imagens como as tomografias, radiografias e cintilografias. 

O IPEN produz uma parte dos radioisótopos, mas gastava cerca de R$ 60 milhões (de acordo com a alta do dólar) importando o produto da África do Sul, Rússia, Holanda e Argentina. O Brasil importava 4% da produção mundial do radioisótopo molibdênio-99. O decaimento radioativo do molibdênio-99 produz o radioisótopo tecnécio-99m utilizado nos radiofármacos mais empregado na medicina nuclear. Até 2021, o IPEN gastava US$ 15 milhões por ano com essa importação, que gerava um faturamento de R$ 120 milhões, ano, recursos que seguiram direto para o caixa do governo. 

Para se ter ideia da importância do RMB, basta verificar a demanda dos radioisótopos para a população. Cerca de dois milhões de procedimentos médicos são realizados, por ano, utilizando radioisótopos, em 440 clinicas cadastradas para realizar o trabalho semanalmente. Cerca de 460 mil pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e o restante pela rede privada. 

RETROSPECTIVA - PRIVATIZAÇÃO- 

Por não ter o RMB, o Brasil precisa importar os insumos fabricados no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN). Enquanto isso, no ano de 2021, crescia o lobby para a privatização da produção, que cairia nas mãos da iniciativa privada nacional e internacional, elevando os preços do tratamento. Em dezembro de 2021, avançou a discussão sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC- 517), na Câmara dos Deputados, propondo a flexibilização do monopólio da União na fabricação de radiofármacos. 

A PEC do senador Álvaro Dias (Podemos-PR) deu muita dor de cabeça, foi adiante, mas parece que caiu no esquecimento. Segundo fontes do setor, o setor privado não conseguiu se preparar para acabar com a iniciativa pública. Em setembro de 2021, por falta de verbas para a importação dos radioisótopos, o tratamento de milhares de pacientes foi interrompido gerando uma crise sem precedentes. Com a liberação dos recursos, o abastecimento se normalizou. Mas veio à tona com força o lobby para a quebra do monopólio da produção dos medicamentos. Foram relevantes as críticas à privatização da produção dos radioisótopos. 

Em artigo para o blog, publicado em 16/12/21, o deputado Alexandre Padilha (PT/SP), atual ministro da Saúde, escreveu: “Além da área da saúde, a proposta (de privatização) dá uma facada no projeto do reator multipropósito, que garante soberania de produção do insumo para que o Brasil não precise mais importar”. 

O BLOG PUBLICOU DIVERSAS MATÉRIAS SOBRE O RMB. EIS ALGUMAS: 

03/03/2020 – Reator nuclear para salvar vidas não saiu do papel; 

24/08/2021: Bento Albuquerque reafirma prioridades; usinas atômicas e construção de reator para medicina, emperrada há anos por fata de verbas; 

16/09/2021: Governo adia construção de reator capaz de produzir insumos para a medicina nuclear. Desabastecimento em clínicas de tratamento contra o câncer pode ocorrer nos próximos dias; 

20/09/2021: Falta de verba na medicina nuclear começa a paralisar o diagnóstico e tratamento contra o câncer. Ricos só terão atendimento e outros países; 

22/09/2021: Governo libera R$ 19 milhões para a compra de insumos destinados à medicina nuclear. Valor é considerado insuficiente para o tratamento de pacientes com câncer até o final do ano; 

15/10/2021; Medicina Nuclear: pacientes com câncer podem ficar novamente sem tratamento semana que vem. Recursos para a produção e radiofármacos ainda não foram liberados para o IPEN/CNEN; 

01/12/2021 – Câmara aprova quebra do monopólio da produção de medicamentos contra o câncer. SBPC alerta sobre irremediáveis prejuízos para a população e ciência; 

16/12/2021 – PEC-517/2010: proposta macabra. Facada no projeto do reator multipropósito. Por Alexandre Padilha. Exclusivo para o BLOG; 31/01/2022 – Medicina Nuclear; reator para salvar vidas, verbas ficam nas promessas. 

(FOTOS: CNDES -MCTI) –

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sábado, 20 de dezembro de 2025

Terras raras: ativista fala de sua tristeza quanto ao avanço dos projetos de empresas australianas

 


A ativista ambiental Helena Sasseron, membro da CARACOL, Organização da Sociedade Civil em Andradas, município mineiro, conta o seu sentimento de tristeza quanto às decisões do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) de Minas Gerais que aprovou ontem (19/12) as licenças prévias dos projetos de mineração de terras raras no Sul do Estado, das empresas australianas Viridis Mining and Minerals e Meteoric Resources.

“Definir o sentimento perante à forma como foram votados hoje os pareceres únicos dos Projetos Colossus (Viridis) e Caldeira (Meteoric), aprovando a Licença Prévia dos empreendimentos na reunião do COPAM, é muito difícil. Ele habita entre a tristeza, a raiva, a revolta e a incompreensão do que aconteceu. Mesmo com todas as informações e questionamentos trazidos por pessoas com vasto conhecimento da área de mineração, as inseguranças e denúncias faladas por representantes da sociedade civil, os órgãos responsáveis por defender o meio ambiente e escutar a população, simplesmente ignoraram as nossas vozes, as vozes de vereadores e Câmaras Municipais, e o MPF, e disseram sim às empresas. 

Os estudos hídricos ficaram para a fase seguinte, de licenciamento ambiental, mas mesmo assim as Licenças Prévias foram aprovadas - e se não tiver água suficiente para o volume absurdo que eles dizem precisar, eles voltarão atrás? Os órgãos responsáveis irão paralisar o projeto? Ou seguirão secando nascentes e o nosso ponto de recarga hídrica até que o projeto termine, e a gente fique sem água e com os rejeitos, como as mineradoras costumam fazer? 

Existem lacunas nos EIA e nos pareceres dos projetos, e existe uma pressa que nunca foi explicada para que isso seja aprovado antes de que haja uma legislação específica para terras raras, hoje inexistente no nosso país. Além disso, todo o estudo dos impactos ambientais parece desconsiderar o fato de que habitamos um planeta vivo, em que a natureza e os ecossistemas estão vivos e em constante transformação e movimento. Parece ignorar que as águas se movem, encontram o seu caminho, não são inertes e não respeitam fronteiras e divisas inventadas pelo ser humano. Me questiono como viverão as próximas gerações... que água irão beber? em que solo irão cultivar? E os nossos agricultores, como seguirão com as suas culturas, de onde tiram o seu sustento e alimentam a população, como ficam? Como ficará o nosso ar? Nós também não somos inertes, e não é uma questão de ser contra ou a favor dos empreendimentos, é apenas uma questão de querer que todas as possibilidades sejam levantadas, investigadas, e devidamente respondidas antes que se aprove qualquer projeto. As empresas e os órgãos têm pressa, nós, sociedade civil, temos precaução.”

   
ARTIGO DE HELENA SASSERON - Membro da CARACOL, Organização da Sociedade Civil em Andradas, MG. Formada em Comunicação pela FAAP (SP) e em Agricultura Biodinâmica pela Biodynamic Association USA.

LEIA NO BLOG: 

Em 20/12/2025 - Terras raras: APS alerta sobre liberação do caminho para empresas australianas em "território ambientalmente sensível", por José Edilberto; 

Em 20/12/2025 - Terras raras: empresas australianas querem a riqueza cobiçada por Donald Trump. Copam mineiro vai abrindo as portas, apesar das críticas

Em 09/09/2023 - Herança maldita da ditadura – 

(FOTO: ACERVO PESSOAL) – 

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Terras raras: APS alerta sobre liberação do caminho para empresas australianas em "território ambientalmente sensível"

 


O presidente do Conselho de Administração da Associação Poços Sustentável (APS), José Edilberto, destacou que os pedidos de Licença Prévia apresentados por dois empreendimentos australianos de mineração de terras raras no Planalto de Poços de Caldas inserem-se em um território ambientalmente sensível, que abrange diversos municípios e possui relevância estratégica no contexto geopolítico global. 

Segundo ele, embora se trate de uma etapa inicial do licenciamento, anterior às fases de instalação e operação, os projetos incidem sobre o mesmo sistema hidrogeológico, o que torna seus impactos necessariamente cumulativos, especialmente sobre os recursos hídricos, principal fator limitante da região. Ressaltou que precedentes recentes da SUPRAM Sul evidenciam a necessidade de rigor técnico, legal e territorial, uma vez que omissões semelhantes — como fragilidades nos estudos ambientais, ausência de manifestação no âmbito municipal que legisla sobre a ocupação do solo e inconsistências no balanço hídrico. 

José Edilberto enfatizou ainda que a sociedade civil organizada, pesquisadores e representantes políticos de Minas Gerais e de São Paulo têm exercido seu papel institucional ao apontar preocupações legítimas quanto aos riscos ambientais, hídricos, geoquímicos e radiológicos associados aos empreendimentos, cujos impactos podem comprometer a qualidade de vida das atuais e futuras gerações. Embora reconheça que o rito formal do licenciamento esteja em curso, alertou que o Ministério Público Federal já se manifestou sobre lacunas não enfrentadas pela assessoria técnica estatal, inclusive quanto à avaliação de impactos cumulativos, à competência do licenciamento em caso de efeitos interestaduais e à ausência de outorgas de uso significativo de água. 

Diante disso, afirmou que a APS e a sociedade civil permanecerão atentas e acompanharão todas as etapas do processo, defendendo decisões pautadas pelo rigor técnico, pela segurança jurídica e pelo princípio da precaução. “Quando a sociedade civil se mobiliza e ocupa os espaços de fala, não o faz por oposição, mas por responsabilidade coletiva — lembrando que cada decisão tomada hoje no COPAM é um compromisso assumido com a vida, o território e as gerações que ainda virão.” Concluiu José Edilberto. 

LEIA NO BLOG: Em 20 12. 2025 - TERRAS RARAS: EMPRESAS AUSTRALIANAS QUEREM A RIQUEZA COBIÇADA POR DONALD TRUMP. COPAM MINEIRO VAI ABRINDO AS PORTAS, APESAR DAS CRITICAS. 

(FOTO: ACERVO PESSOAL) – 

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Terras raras: empresas australianas querem a riqueza cobiçada por Donald Trump. Copam mineiro vai abrindo as portas, apesar das críticas

 

O Brasil detém a segunda maior reserva de terras raras do mundo, perdendo apenas para a China. Há décadas o país abandonou as pesquisas sobre as terras raras, verdadeiro tesouro, “para a fabricação de barras metálicas”, baterias e outros produtos essenciais na área da tecnologia. O tema voltou fortemente à mídia após as declarações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em torno de seu interesse nas terras raras brasileiras.  

Rio de Janeiro, 20 de dezembro de 2025 - 


Apesar de pareceres contrários do Ministério Público Federal (MPF), o Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) de Minas Gerais aprovou ontem (19/12) as licenças prévias dos projetos de mineração de terras raras no Sul do Estado, das empresas australianas Viridis Mining and Minerals e Meteoric Resources. Presidida pelo presidente da Câmara de Atividades Minerárias da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Yuri Trovão, a reunião virtual teve várias contestações, algumas, publicadas pela imprensa e pelo Blog. 



“Se houver algum acidente ali em Poços de Caldas, que é o berço das águas no Sudeste, isso vai contaminar até São Paulo, e vai chegar na Argentina”, alerta a deputada Duda Salabert (PDT). 

Os procedimentos foram alvo de pelo menos quatro recomendações do Ministério Público Federal (MPF), que pediam a retirada dos projetos da pauta da 131ª reunião da Câmara Técnica Especializada de Atividades Minerárias (CMI), do Copam. Conforme o órgão de Justiça, a análise dos projetos Colossus, da empresa Viridis, e Caldeira, da Meteoric, foi “prematura”. Os procuradores demonstraram preocupação com o impacto hídrico no Aquífero Alcalino, em Poços de Caldas, e a proximidade do projeto da Meteoric com a Unidade de Descomissionamento de Caldas (UDC), que abriga rejeitos radioativos das antigas minas de urânio da região. 


Riscos de contaminação radioativa com materiais como urânio e tório, entre outros, incluindo a possibilidade de a cava de mineração poder ocasionar o rebaixamento do nível do lençol freático; a ausência de um estudo de impacto regional sobre os recursos hídricos, por exemplo. São alguns dos alertas que constam nas recomendações urgentes mencionadas em documento do Ministério Público Federal (MPF), através do núcleo ambiental da Região Centro-Sul, à Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam) e ao Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) visando garantir a suspensão da análise de dois processos de licenciamento ambiental referentes aos projetos Colossus, em Poços de Caldas (MG), e Caldeira, em Caldas (MG), ambos de exploração e beneficiamento de terras raras em Minas Gerais. 

CONTAMINAÇÃO RADIOATIVA PODE CHEGAR Á ARGENTINA - 


Em entrevista ao jornal “O Tempo”, a deputada federal Duda Salabert (PDT) afirmou que a aprovação destes projetos não coloca em risco somente os municípios de Caldas e Poços de Caldas, mas um grande número de cidades em Minas Gerais e, até mesmo, São Paulo. “São dois grandes empreendimentos de mineradoras com risco de acidente radioativo. Não só pela retirada das terras raras, que por si só já tem a produção de elementos radioativos, mas, também, por estar ao lado de uma barragem que é uma das maiores com material radioativo do planeta. Se houver algum acidente ali em Poços de Caldas, que é o berço das águas no Sudeste, isso vai contaminar até São Paulo, e vai chegar na Argentina. Então é um risco seríssimo que envolve não só o debate estadual, mas federal”, alertou a deputada. 

Procurado pelo jornal, o governo de Minas, por meio da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), informou que recebeu as recomendações do MPF e que todas elas foram "devidamente avaliadas, garantindo a possibilidade de sanar dúvidas e incorporar ajustes ao rito processual". O órgão ambiental do Estado alegou ainda que a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) declarou "preliminarmente" que as instalações da empresa atendem às normas, uma vez que os "níveis de radiação avaliados estão dentro dos limites toleráveis".  

SUSPENSÃO IMEDIATA - 

A deputada estadual Bella Gonçalves (PSOL) ingressou com uma Ação Civil Pública, junto de entidades da sociedade civil, pedindo a suspensão imediata do colegiado que estaria operando, desde maio deste ano, com mandatos vencidos e prorrogados de forma ilegal pelo governo estadual. “A ação questiona a Deliberação Normativa nº 2.054/2025, publicada pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), que prorrogou por prazo indeterminado os mandatos dos conselheiros do Copam, apesar de a legislação mineira proibir expressamente qualquer recondução ou prorrogação”, denunciou a deputada. “Manter o Copam funcionando com mandatos vencidos é uma ilegalidade grave e abre caminho para danos ambientais irreversíveis”, disse ela. A questão dos mandatos vencidos havia sido denunciada também pelo MPF. 

Segundo a deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT) os empreendimentos deveriam ter passado por análises sobre os seus efeitos cumulativos na região. “Não há uma análise integrada dos efeitos cumulativos e sinérgicos decorrentes da implantação simultânea dos dois projetos no Planalto Vulcânico de Poços de Caldas. Os empreendimentos vêm sendo analisados de maneira fragmentada, sem a devida consideração dos efeitos cumulativos de sua operação conjunta, o que impede a aferição segura da real capacidade de suporte do território”. 

EMPRESAS SE INOCENTAM - 

Em nota, a Meteoric Caldeira Mineração LTDA, responsável pelo Projeto Caldeira, informou que o licenciamento tramita no âmbito estadual porque “o empreendimento não se enquadra nas hipóteses legais que determinam a competência federal do Ibama para o licenciamento ambiental”. A empresa reconhece a ocorrência natural de radionuclídeos associados às argilas que contém terras raras, mas afirma que “os estudos técnicos demonstram que os níveis de radioatividade do projeto estão abaixo dos limites de risco definidos pela legislação brasileira”, condição que, segundo a Meteoric, é comprovada por laudos técnicos desde 2024. De acordo com a empresa, o empreendimento foi “formalmente dispensado de licenciamento radiológico pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), via a atual Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN)”, segundo o jornal. 

A Meteoric sustenta que, “não se tratando de atividade nuclear, nem de empreendimento com material radioativo em níveis que exijam controle federal específico, o Projeto Caldeira não atrai a competência do Ibama por esse critério”. A companhia também afirma que o projeto “está integralmente localizado no município de Caldas (MG), não interfere em terras da União, não se sobrepõe a áreas federais e não apresenta impactos ambientais de abrangência interestadual ou nacional”, condições que, segundo a empresa, justificam o licenciamento estadual. 

Por isso, de acordo com a Meteoric, o processo “vem sendo conduzido pela Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM), que analisou os estudos apresentados, incorporou recomendações técnicas pertinentes e emitiu parecer favorável à apreciação do projeto pelo Copam”. Já a Viridis Mineração, responsável pelo Projeto Colossus, afirmou que os estudos realizados pela empresa e o parecer técnico da CNEN indicam que os níveis de radioatividade do empreendimento estão abaixo do limite que exigiria controles especiais, atendendo às normas vigentes. A empresa também citou nota pública da Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN), na qual o órgão federal afirma que “não há risco radiológico atrelado aos projetos de terras raras no Sul de Minas”. 

Enquanto isso o MPF recomendava a retirada dos processos da pauta de votação do Copam. A medida busca a realização de estudos e consultas complementares que tratem dos riscos ambientais e sociais pendentes, segundo documento do MPF. O MPF solicitou que a Feam exija manifestação da INB e da Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN) sobre o risco à segurança nuclear que decorre da movimentação de argila e veículos pesados nas proximidades. 

“ALTO NÍVEL DE POTENCIAL POLUIDOR” - 

Os projetos Colossus (da Viridis Mineração Ltda.) e Caldeira (da Meteoric Caldeira Mineração Ltda.) estão localizados no Planalto Vulcânico de Poços de Caldas. Ambos são classificados como empreendimentos de mais alto nível de potencial poluidor, classe 6. 

DANOS GRAVES – 

As empresas preveem a movimentação e o processamento químico de 5 milhões de toneladas de argila por ano, cada uma, utilizando a técnica de lixiviação ácida. O MPF baseia-se no “princípio da precaução, que exige a adoção de medidas para prevenir danos graves, visto que o conhecimento científico sobre os impactos da mineração de terras raras na atualidade ainda é limitado”. 

RISCOS DE PROXIMIDADE COM A ÁREA NUCLEAR - 

No Projeto Caldeira, uma das principais preocupações é a proximidade do empreendimento com a Unidade de Descomissionamento de Caldas (UDC) das Indústrias Nucleares do Brasil (INB). A UDC é um complexo desativado, que armazena rejeitos e materiais radioativos. “Embora a área nuclear tenha sido excluída da Área Diretamente Afetada (ADA) do projeto, as instalações estão dentro da Área de Influência Direta (AID) socioeconômica. A mineração está a 1,83 km da Barragem de Rejeitos e a 2,55 km da Barragem D4. 

Em consulta à Agência Nacional de Mineração (ANM), o MPF verificou que as barragens de rejeitos da UDC/INB, especificamente a Barragem D4 e a Barragem "Bacia Nestor Figueiredo" (BNF), estão classificadas em Nível de emergência 1. Além disso, a procuradora da República Flávia Cristina Tavares Torres, que assina a recomendação relativa ao projeto da Meteoric, também demandou estudos complementares para analisar se o processo de lixiviação química, que usa grande volume de água, pode capturar outros metais pesados, como tório e urânio, o que poderia gerar rejeitos radioativos pelo aumento da concentração desses elementos. 

Prejuízos hídricos e tecnologia experimental em Poços de Caldas – 

No Projeto Colossus, o foco está nos riscos ambientais e hídricos. A área de mineração é de recarga do Aquífero Alcalino de Poços de Caldas, que abastece a região e já enfrenta risco de escassez hídrica. A previsão é de supressão de 98 nascentes nesse aquífero. A cava de mineração pode ocasionar o rebaixamento do nível do lençol freático, um efeito classificado como negativo e relevante. O MPF ressalta a ausência de um estudo de impacto regional sobre o recurso hídrico, que seria utilizado no abastecimento do próprio projeto. Outra grande preocupação é o uso do método de lixiviação da argila retirada da natureza. 

O procurador da República Marcelo José Ferreira, que assina a recomendação do projeto Colossus, destaca a falta de estudos que demonstrem a ausência de risco de contaminação das águas subterrâneas pelo nitrato. O MPF também destacou a ausência de estudos sobre os impactos a longo prazo, com a água da chuva ao penetrar no solo, que passou pelo processo de lixiviação, e se a devolução dessa argila compactada impedirá o processo de reflorestamento previsto. "Dada a natureza experimental da tecnologia no Brasil, o MPF recomenda que a Feam inclua como condicionante a instalação de uma planta piloto para o Projeto Colossus e Caldeiras. Essa planta deve comprovar que 99% do sulfato de amônio será removido da argila, atestando quimicamente que o resíduo é compatível com um fertilizante agrícola comum e não um contaminante tóxico". 

OUTRAS IRREGULARIDADS E EXIGÊNCIAS LEGAIS – 

Na recomendação, o MPF alertou para o fato de o Projeto Colossus estar proposto a menos de 300 metros de um hospital e a, aproximadamente, 50 metros de bairros residenciais. A atividade também está dentro da Área de Segurança Aeroportuária (ASA) do Aeroporto de Poços de Caldas, o que requer aprovação prévia do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA) e da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), devido ao risco de colisão com aves e elevação de obstáculos. 

COMUNIDADES TRADICIONAIS – 

No Projeto Caldeira, foi identificada a violação de um direito fundamental de populações locais: a falta de consulta livre, prévia e informada às Comunidades Indígenas e Quilombolas da região. Essa consulta é um requisito legal estabelecido pela Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e sua ausência impede o prosseguimento da licença. O Projeto Caldeira também inclui parte de uma Área de Proteção Ambiental (APA) Santuário Ecológico da Pedra Branca, em Caldas, onde a lei municipal proíbe atividades minerárias. O Conselho Gestor da APA já indeferiu o pedido. 

LICENCIAMENTO FRAGMENTADO – 

Para ambos os projetos, o MPF argumenta que o licenciamento ambiental fragmentado, focado em projetos individuais, é insuficiente para tratar dos impactos cumulativos e sinérgicos da região, que tem múltiplos projetos de mineração. Por isso, o MPF solicitou que a Feam exija uma Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) ou Avaliação Ambiental Integrada (AAI) para o Planalto de Poços de Caldas. A região é sensível e abrange ecossistemas e corpos hídricos interconectados a bacias hidrográficas interestaduais e integra o bioma Mata Atlântica. 

MANDATOS VENCIDOS - 

Por fim, o MPF exige a suspensão dos Pareceres de Licença Prévia já emitidos e que a Feam realize consultas aos órgãos competentes e à população afetada antes de qualquer deliberação. O órgão também destacou que o Copam e sua Câmara de Atividades Minerárias (CMI) estão com mandatos vencidos e sem composição renovada desde maio de 2025, o que afeta o princípio da paridade entre Estado e sociedade civil. O MPF ressalta que as recomendações não encerram sua atuação sobre o tema e que os destinatários estão cientes da situação, podendo ser responsabilizados por omissões futuras. O núcleo ambiental da Região Centro-Sul do MPF reúne as atribuições das Procuradorias da República em Divinópolis e Varginha. 

LEIA REPORTAGEM EXCLUSIVA NO BLOG - 09/09/2023 - Sobre o caso - Herança maldita da ditadura - 

(FONTE – ASCOM MPF – MG - JORNAL O TEMPO) – 

LEIA O LIVRO COBAIAS DA RADIAÇÃO: A HISTÓRIA NÃO CONTADA DA MARCHA NUCLEAR BRASILEIRA E DE QUEM ELA DIXOU PARA TRÁS. CONTATO: 21 99601-5849. 

(FOTOS ORIGINAIS DE PROPRIEDADE DO BLOG - INSTALAÇÕES DA INB EM CALDAS - NÃO PODEM SER PUBLICADAS SEM AUTORIZAÇÃO. A TERCEIRA FOTO FOI DOADA AO BLOG POR FONTES)

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sexta-feira, 19 de dezembro de 2025

Usina nuclear Angra 3: destino só depois do Carnaval

 


Só depois do Carnaval o destino da usina nuclear Angra 3 será conhecido, talvez, de uma vez por todas. Durante mais de um ano as notícias sobre a retomada das obras da central atômica movimentaram o setor, certo de que Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), do Ministério de Minas e Energia, bateria o martelo a favor do empreendimento. As reuniões do  CNPE eram noticiadas com grandes expectativas e logo em seguida, adiadas, jogando baldes de água fria sobre as cabeças de alguns políticos, tecnocratas e interessados de um modo geral. Agora, só depois das festas do Momo haverá a definição, em ano de eleição, quando as pressões poderão ser maiores.  


O mais recente adiamento ocorreu em reunião extraordinária do CNPE, no dia 18 de fevereiro. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não estaria disposto a ter problemas com a ministra Marina Silva, nada simpática à energia nuclear.  Segundo fontes, o assunto foi retirado da pauta. O ministro Alexandre Silveira sempre se posicionou favorável à retomada das obras, visitando, inclusive a central nuclear no ano retrasado. 

Na reunião do CNPE, Silveira apresentou voto pela aprovação da resolução que liberava o empreendimento, mas não venceu a resistência da área econômica por conta dos altos custos que envolvem a usina. A Eletronuclear, gestora das usinas, que “vai de mal a pior” financeiramente. E nem descarta a possibilidade de pedir emprestado ao governo os cerca de R$ 3 bilhões do fundo do descomissionamento, conforme o Blog divulgou na semana passada. 

EQUIPAMENTOS ESTOCADDOS - 


Angra 3 faz parte do acordo nuclear Brasil-Alemanha, assinado em plena ditadura militar (1975), que já consumiu pelo menos R$ 8 bilhões; e dependente de mais R$ 23 bilhões para ser concluída. Abandonar Angra 3 pode representar prejuízos de cerca de R$ 21 bilhões. Não basta aprovar a continuidade das obras, comentou uma fonte. “É preciso saber claramente e com planejamento assumido com responsabilidade de onde virão as cifras bilionárias”, comentaram fontes ao BLOG. 

 Dezenas de equipamentos de Angra 3 estão estocados há anos na Central Nuclear e outros, na Nuclep, em Itaguaí. Angra 3, se for concluída até 2031, segundo novas projeções, terá capacidade para gerar 1.350 Megawatts (MW), o equivalente a cerca de 20% da energia consumida na cidade do Rio de Janeiro, uma vez operando com 100% de sua capacidade, como Angra 2. Já Angra 1, gera a metade, nas mesmas condições, operado a 100%. O total representa 3% da energia consumida no Brasil. Vale lembrar que a energia não fica na cidade do Rio, pois faz parte do Sistema Interligado Nacional (SIN).  

BNDES E CEF – CALOTE? -

Conforme o BLOG vem divulgando há pelo menos quatro anos, a dívida da Eletronuclear com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Caixa Econômica Federal (CEF), era de R$ 6,4 bilhões, por conta de Angra 3. A empresa deve também a Framatome que estava tocando o empreendimento. O BNDES já divulgou quer não quer mais participar de Angra 3. A usina tem sido um poço de problemas, com obras paralisadas por ações judiciais, editais cancelados, denúncias de corrupção, entre outras.  

(FOTOS: ELETRONUCLEAR – NUCLEP) - COLABORE COM O BLOG – SETE ANOS DE JORNALISMO INDEPENDENTE – CONTRIBUA VIA PIX: 21 99601-5849 – CONTATO: malheiros.tania@gmail.com 

quarta-feira, 17 de dezembro de 2025

Trabalhadores terceirizados de Caldas (MG) da INB recebem salários atrasados e voltam ao trabalho

 



Foram pagos hoje (17/12) os salários atrasados, incluindo 13º, dos trabalhadores terceirizados das Indústrias Nucleares do Brasil (INB), via Solve Consultoria e Projetos, da unidade nuclear em Caldas (MG). A paralisação dos trabalhos de limpeza chegou ao fim. As denúncias sobre a falta de pagamento foram divulgadas pelo Blog na semana passada. 

O Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Extrativistas Minerais de Poços de Caldas e Região, em nota, alertou que o fato seria denunciado ao Ministério Público do Trabalho e a Superintendência Regional do Trabalho e Vigilância Sanitária. Normas da empresa mostravam que havia “riscos biológicos e químicos”, com a paralisação dos serviços gerais, que voltaram ao normal com a quitação da dívida. 

(FOTO – INB CALDAS) – 

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