quinta-feira, 31 de março de 2022

O Instituto de Radioproteção e Dosimetria comemora 50 anos de fundação. Leia a entrevista exclusiva da niteroiense que comanda o IRD.

 


O Instituto de Radioproteção e Dosimetria (IRD) da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), na Avenida Salvador Allende, 3773, Barra da Tijuca (RJ), comemora seu cinquentenário, com uma trajetória internacional, mas pouco conhecida dos brasileiros. Participou de estudos de impacto ambiental das explosões atômicas ocorridas no Hemisfério Norte na década de 60; de pesquisas para detectar a presença de radionuclídeos provenientes de explosões nucleares francesas, no Atol de Mururoa, no Sul do Oceano Pacífico, em 1968; e de trabalhados envolvendo o acidente com uma cápsula de césio-137, em Goiânia (GO),  em setembro de 1987, por exemplo. É de pouco conhecimento também que o IRD está sob a direção da niteroiense Maria Angélica Vergara Wasserman, gradua em Engenharia Agronômica pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (1982), com mestrado em Geociências (Geoquímica) pela Universidade Federal Fluminense (1985) e doutorado em Geoquímica pela Universite de Bordeaux I (1991). Pesquisadora da CNEN desde 1995, Maria Angélica foi contratada em concurso e hoje comanda 179 funcionários. Em entrevista exclusiva ao BLOG, ela fala sobre a história do IRD, e de sua própria. Preconceito em ambiente predominantemente masculino, ela garante que não enfrentou. Eis a entrevista: 

BLOG: De acordo com as informações oficiais, o IRD teve sua origem na década de 60, em um pequeno laboratório de dosimetria do Departamento de Pesquisas Científicas e Tecnológicas da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), situado nas dependências da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Como foi o início? 

MARIA ANGÉLICA: O começo teve a participação de Edgard Meyer e Anna Maria Campos de Araújo, os primeiros diretores do Laboratório de Dosimetria. Inicialmente com apenas quatro servidores, tinha como atribuição básica efetuar calibração de monitores de radioproteção utilizando fontes de referência e monitoração ambiental do impacto das explosões atômicas ocorridas no Hemisfério Norte. 

BLOG: O IRD continua realizando esses trabalhos? 

MARIA ANGÉLICA: Não resta dúvida de que as atividades realizadas hoje no IRD/CNEN foram nucleadas nas ações do Laboratório de Dosimetria.  Os desafios técnicos e relevância dos temas propiciaram seu crescimento e a criação de um novo espaço, em 1972, que já refletia a complexidade  e a extensão da Radioproteção e Dosimetria, em um cenário que permitiu o crescimento - eu diria que quase em paralelo - das áreas de pesquisa e diversas atividades relacionadas à metrologia, à física médica, à biofísica, à  emergência, à radioecologia e demais ciências correlatas, além do apoio à elaboração de normas. 

BLOG: O que pode relembrar sobre as pesquisas do Laboratório de Dosimetria da PUC- Rio? 

MARIA ANGÉLICA: Podemos citar o trabalho do próprio Edgar Meyer, com o artigo “Espectrometria da radioprecipitação causada por bombas francesas, em 1968”, de 1971, que versa sobre o uso de espectrometria gama para detectar a presença de radionuclídeos provenientes de explosões nucleares francesas, no Atol de Mururoa, no sul do Oceano Pacífico, em 1968. As amostras analisadas foram coletadas da atmosfera. Há artigos anteriores, como o de Gross, B., Meyer, E., Aron, A., (1958), Trends of Long Range Fallout Activities in Rio de Janeiro 1956-1958. 

BLOG: E agora, como está o IRD? 

MARIA ANGÉLICA: Hoje mantemos uma estação de monitoramento global que detecta e identifica partículas radioativas e gases nobres também radioativos liberados na atmosfera provenientes de explosões nucleares. A estação integra rede de dados ligada à Organização das Nações Unidas (ONU) mantida pela Comissão Preparatória para a Organização do Tratado para a Proibição Total de Testes Nucleares, assinado em 1996, e envia regularmente dados via satélite para um centro internacional de dados, em Viena, Áustria. O IRD também realiza importantes pesquisas científicas e desenvolvimento tecnológico sobre dispersão de radionuclídeos em diferentes compartimentos ambientais, modelagem de transporte de contaminantes, modelos ambientais integrados, além de desenvolvimento de ferramentas para análise de radioproteção, com banco de dados e projeção de riscos. 

BLOG: O que há sobre radioatividade ambiental no Brasil? 

MARIA ANGÉLICA: O IRD disponibiliza a pesquisadores e interessados em geral um banco de dados ambiental. E um outro projeto que produz dados sobre radioatividade em amostras originarias de uma malha nacional de amostras de solo, sendo que alguns dos radionuclídeos mensurados são oriundos de fallout. Assim, ambos contribuem para o conhecimento da magnitude do que foi o fallout no Brasil. 

BLOG: O que se apresenta no Espaço Memória da Radioproteção? 

MARIA ANGÉLICA: O Espaço Memória da Radioproteção quer mostrar por meio de objetos, materiais audiovisuais, conteúdos diversos o que significa trabalhar em prol da proteção radiológica do público, dos trabalhadores e do meio ambiente. Temos muitas formas de trazer isso para as pessoas, seja por painéis, por objetos como detectores de radiação, sistemas de rastreamento que mapeiam o perfil de um local do ponto de vista de leitura de níveis de radiação, seja uma construção coletiva de reunir palavras associadas à radioproteção, seja constando fatos da nossa história no IRD/CNEN. 

BLOG: Desafio? 

MARIA ANGÉLICA: Nosso maior desafio é promover uma sólida cultura de segurança, treinar, capacitar pessoas e demonstrar o espírito pela ciência nuclear de qualidade que nos une. Nossas entregas à sociedade nos motivam e têm orientado nosso planejamento, as demandas que são apresentadas e como podemos fazer mais e melhor unindo nossas competências. O IRD tem essa tradição de trabalhar em conjunto, de forma sistêmica. A pesquisa de excelência nos move. 

BLOG: Conte sobre a experiência em relação ao acidente de Goiânia? 

MARIA ANGÉLICA: A nossa atuação ocorreu junto com os demais institutos da CNEN. Todos estiveram envolvidos. Foi um aprendizado técnico e humano gigantesco para quem respondeu a esse evento. Saímos mais fortes, melhores como profissionais e como seres humanos, acredito. Damos ainda mais valor ao que fazemos, ao vivenciarmos na prática o significado desse serviço para a sociedade! Essa motivação nos faz avançar. Os profissionais diretamente ligados ao atendimento à emergência contam como foi extenuante, mas reconfortante poder fazer algo para entregar às pessoas uma situação em que elas pudessem retomar suas histórias de vida. 

BLOG: O acidente serviu de escola? 

MARIA ANGÉLICA: Sim. Muitos trabalhos técnicos foram publicados, projetos foram desenvolvidos com organismos internacionais e muito se aprendeu também com esse acidente, em termos de trabalho conjunto. Creio que o legado foi de amplo espectro, desde o aperfeiçoamento de estruturas, como o desenvolvimento de laboratório móvel de bioanálises, com o detector de corpo inteiro e análises in vivo e in vitro, assim como  de ações de pronta resposta a acidentes nucleares e radiológicos, até a integração de toda a força de trabalho do Instituto, seus domínios de atuação, ferramentas computacionais e laboratoriais, permanentemente revistos em exercícios internos e externos. 

BLOG: Destaques? 

MARIA ANGÉLICA: Creio que também mereçam destaques a popularização do símbolo da radioatividade. Indivíduos do público passaram a entender que o material com o símbolo exige manuseio adequado, como se deve buscar informação, caso se deparem com material sinalizado em local inesperado. 

BLOG: Em sua gestão, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), aumentou em 50% o número de bolsas de doutorado do Programa de Pós-Graduação, indicativo de excelente avaliação do Programa.  

MARIA ANGÉLICA: Sim. Houve um aumento de 50% do número de bolsas de doutorado concedidas pela Capes. Com esse incremento da Capes, passaram a ser 15 bolsas de doutorado. Para o mestrado Capes, existem oito bolsas. Há outras bolsas concedidas por agências de fomento e pela própria CNEN. Temos no total 30 bolsas, sendo 17 de doutorado e 13 de mestrado. A maior procura pela nossa pós-graduação é de alunos do Rio de Janeiro, bolsistas ou não, mas temos alunos na Pós-Graduação em Radioproteção e Dosimetria que são de outras regiões além da Sudeste, quais sejam Norte, Nordeste, Sul e alunos oriundos de países da América Latina. 

BLOG:  O IRD está participando de um consórcio internacional para a elaboração de programa de mestrado em Descomissionamento e Remediação Ambiental? O projeto conta com a participação de instituições de Portugal, Bélgica, Noruega, e EUA, e foi apresentado para financiamento, pelo programa Erasmus da Comunidade Europeia? 

MARIA ANGÉLICA: Assim que soubemos que uma proposta de um programa de mestrado em consórcio internacional estava sendo submetida para o Erasmus, manifestamos o interesse em participar. Só teremos esse convênio com o Erasmus caso essa proposta consorciada seja aprovada e todos os desafios posteriores a essa aprovação sejam vencidos. Ainda estamos aguardando o resultado, mas nos sentimos orgulhosos em poder oferecer essa expertise à comunidade científica e trabalharmos em conjunto em tema tão relevante para a radioproteção. Vamos torcer e nos empenhar para tudo dar certo. 

BLOG: Como tem sido o reconhecimento do IRD como centro nacional e mundial em proteção radiológica. 

MARIA ANGÉLICA: Nossos profissionais são convidados a ministrarem cursos e treinamentos como especialistas da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), trabalhamos em parceria com outros centros nacionais importantes para a radioproteção no país. Temos representantes em comitês técnicos de importância como a Unscear (Comitê Cientifico das Nações Unidas sobre os Efeitos da Radiação Atômica) e a ICRP (Comissão Internacional de Proteção Radiológica). Lembro ainda que sediamos o Laboratório Nacional de Metrologia das Radiações Ionizantes, assim designado pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO). 

BLOG: Outros exemplos? 

MARIA ANGÉLICA: Sim. As atividades deste laboratório contribuem para a confiabilidade das medições no país nas áreas médica, ambiental, industrial e nas pesquisas. Além disso, desde 1996, o IRD é o Instituto de Ligação com a Organização Mundial da Saúde (OMS), no contexto da Rede de Preparação e Assistência Médica a Radioacidentados. Esses são alguns exemplos de reconhecimento que reforçam nossa atuação em radioproteção. O trabalho com instituições científicas nacionais como o Instituto Nacional de Câncer (INCA), universidades e centros de excelência nacionais e muitos outros parceiros, o que só nos motiva a seguir firmes em prol da proteção do público, trabalhadores e do meio ambiente. 

BLOG:  Qual a participação do IRD na atuação da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)? 

MARIA ANGÉLICA: Recebemos especialistas do organismo, enviamos alguns dos nossos profissionais para atuar como especialistas da AIEA, por solicitação da Agência, além da participação em projetos coordenados pela AIEA... enfim, há um intercâmbio bastante profícuo. O IRD fornece suporte de proteção radiológica, dosimetria e monitoração individual interna no tratamento médico a radioacidentados, como ocorreu na resposta ao acidente de Goiânia. Nos acidentes radiológicos ocorridos na Bolívia (2001), Chile (2005), Equador (2009) e Peru (2014), o médico brasileiro de renome internacional, Nelson de Lima Valverde, integrou um grupo de peritos internacionais que, convidados pela AIEA, realizam avaliações dos indivíduos radioacidentados naqueles países. No caso específico do acidente radiológico de Ventanilla, Peru, o IRD, como Instituto de Ligação com a OMS, coordenou uma série de reuniões com especialistas do País que culminou com a decisão de prestar assistência internacional ao Peru no tratamento médico de um profissional acidentado. O tratamento foi realizado no Hospital Naval Marcílio Dias, com o apoio de médicos do INCA e do Centro de Medicina das Radiações Ionizantes. 

BLOG: Outras parcerias e cursos? 

MARIA ANGÉLICA: Em parceria com a AIEA, possuímos o curso de Especialização Lato Sensu em Proteção Radiológica e Segurança de Fontes Radioativas, no qual recebemos com frequência alunos de outros países de língua portuguesa. Além disso, formamos mestres e doutores em nosso Programa de Pós-Graduação em Radioproteção e Dosimetria. Ministramos regularmente cursos para órgãos de saúde, do país e do exterior, órgãos de segurança e defesa e demais públicos que aderem ao tema oferecido. O perfil multidisciplinar do nosso instituto nos capacita para atuações diversas no quesito treinamento e formação de recursos humanos. 

BLOG: Em que momento a metrologia das radiações ionizantes, no Brasil, teve um grande impulso? 

MARIA ANGELICA: A partir da doação a este laboratório, pelo INCA, do primeiro irradiador de cobalto para a calibração de dosímetros clínicos, em 1969. Os pesquisadores Günter Drexler, do GSF/Alemanha, e Martin Oberhofer, do Joint Research Centre (JRC/Itália), foram seus principais colaboradores no início da criação do instituto. 

BLOG: Qual o balanço na trajetória do IRD? 

MARIA ANGÉLICA: A designação do Laboratório Nacional de Metrologia das Radiações Ionizantes, pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO), a participação de pesquisadores em comitês, me parecem alguns exemplos significativos de um balanço positivo. 

BLOG: desafios? 

MARIA ANGÉLICA: A área da metrologia das radiações ionizantes sofre uma pressão muito forte e permanente para manter instalações, equipamentos e materiais totalmente adequados para atendimento às exigências das normas do nosso sistema de qualidade e para atender aos nossos compromissos nacionais e internacionais. Também em relação às necessidades de mantermos nossos recursos humanos alinhados com o estado da arte. Não tem sido fácil, mas com a visão sistêmica da alta direção CNEN, incentivando o trabalho em rede, o diálogo entre os diferentes agentes, temos conseguido superar desafios e também aproveitar oportunidades. Com a dinâmica evolutiva da ciência e tecnologia, a modernização sempre urge, mas trabalhamos para otimizar nossos recursos e focar em soluções para demandas da sociedade. Em metrologia, por exemplo, estamos modificando nossos sistemas de analógicos para digitais. 

PERFIL: Maria Angélica Vergara Wasserman.

A Diretora do IRD possui graduação em Engenharia Agronômica pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (1982), mestrado em Geociências (Geoquímica) pela Universidade Federal Fluminense (1985) e doutorado em Geoquimica pela Universite de Bordeaux I (1991). Desde 1995 é pesquisadora da CNEN. Tem experiência na área de Química Ambiental, com ênfase em Análise de Traços e Química Ambiental, e na área de Radioecologia, atuando principalmente nos seguintes temas: radioecologia de ecossistemas tropicais, transferência solo-planta de radionuclídeos, mecanismos de sorção de poluentes radioativos e estáveis em solos e sedimentos, extração sequencial, proteção radiológica ambiental e avaliação de risco. 

BLOG: Em termos práticos, qual a sua maior experiência? 

MARIA ANGÉLICA: Em radioecologia tropical. Imagino que adquiri uma visão sistêmica pelo fato de realizar vários experimentos com radionuclídeos em sistemas aquáticos e terrestres, além de interpretar e conectar dados que integram relações complexas, do micro ao macro. 

BLOG: liderança? 

MARIA ANGÉLICA: Trabalho com um grupo de pesquisa na área de radioecologia que tem por objetivo gerar subsídios técnicos e científicos para a tomada de decisão, nas áreas contaminadas por atividades industriais ou em decorrência de acidentes nucleares ou radiológicos. Essa liderança foi construída com a evolução de algumas atividades, como a orientação de alunos de doutorado, mestrado e iniciação científica, coordenação de projetos de pesquisa com a IAEA, por mais de 10 anos. 

BLOG: Seu maior desafio? 

MARIA ANGÉLICA: Desenvolver e manter um perfil acadêmico em um universo de poucos recursos, limitações de natureza diversas e trabalhar com experimentos que podem levar anos para gerar informações consistentes, validadas e significativas é um grande desafio. Nem todas as áreas conseguem gerar dados e publicações, na métrica e timings exigidos para obter recursos por editais, por exemplo. Manter o perfil acadêmico tem sido desafiador. Trabalhar como diretora do IRD/CNEN tem sido também um desafio, algo único, e extremamente compensador. 

BLOG: Balanço da trajetória. 

MARIA ANGÉLICA:  Conhecer o IRD/CNEN foi um verdadeiro presente, pois ali consegui integrar toda minha formação e dar um significado maior para tudo. Nossa contribuição para a sociedade é tão visível e tão apaixonante que foi a minha virada de chave para optar pelo IRD e desistir da universidade. No mesmo dia do concurso para a CNEN, teve o concurso para professor na UFF. Eu tinha um domínio maior em geoquímica do que em radioproteção, mas já estava apaixonada pela área e pelo ambiente de trabalho, então aceitei o desafio. Aliás vivo saindo da minha zona de conforto. Os desafios sempre fizeram parte da minha vida. 

BLOG: Como analisa o mercado de trabalho na sua área? Mulheres têm oportunidades iguais?

MARIA ANGÉLÌCA: Acho fabuloso. Acredito que a demanda será crescente e cada vez mais oportunidades irão surgir para bons e qualificados profissionais. Minha experiência tem sido restrita ao IRD, CNEN, AIEA e nesses espaços não tenho identificado barreiras de gênero, ao contrário. A AIEA mantém oportunidades interessantes para mulheres, que as encoraja a se candidatarem. A história do IRD/CNEN sempre foi marcada pelo respeito ao protagonismo das mulheres. 

BLOG: Uma das únicas mulheres a ocupar cargo de chefia, como se define? Já sofreu preconceito? 

MARIA ANGÉLICA: Na verdade, no IRD/CNEN, dos 12 diretores que passaram pela casa, cinco são mulheres, minha substituta é mulher, dos seis chefes de divisão, três são mulheres, o que reflete equilíbrio nos valores. Desde o início temos uma história muito bonita, com muitas mulheres que se destacaram. Não tenho nenhum registro significativo de preconceito na vida profissional. 

BLOG: Como analisa o futuro da Radioproteção e Dosimetria no Brasil? 

MARIA ANGÉLICA: Precisamos fortalecer a radioproteção no país, popularizar o tema, carregar de significado a palavra, trazer a cultura de segurança cada vez mais para o nosso  cotidiano, pois as aplicações da radiação estão muito presentes, quando fazemos um exame médico utilizando radiação ou quando conseguimos obter produtos melhores por conta do uso da radiação em processos de controle de qualidade ou mesmo na produção. Alimentos e até bens de patrimônio histórico e cultural podem ser preservados graças à radiação. Tudo isso só é possível porque muita gente trabalha para promover segurança no uso da tecnologia das radiações. Além, é claro, da tecnologia nuclear que gera energia e envolve todo um sistema de radioproteção, profissionais, equipamentos, enfim, ambientes que integram as mais diversas áreas de conhecimento, fundamentais para que a sociedade usufrua, com segurança, de todos os benefícios da área nuclear. 

BLOG: O que representou a sua nomeação, a partir de processo de Comitê de Busca para seleção de diretores das seguintes unidades técnico-científicas da CNEN: IEN - CDTN - CRCN/NE - IRD, referente ao Edital nº 004? 

MARIA ANGELICA: Uma grande alegria. Colocar minha experiência, minha vontade, contribuir um pouco mais para uma área que aprendi a valorizar, respeitar, admirar. Trabalho com pessoas incríveis, competentes e dedicadas. Esse ambiente me motiva demais para buscar todas as condições necessárias, para materializar projetos de impacto e relevância para a sociedade brasileira e também garantir o desenvolvimento das nossas atividades no cotidiano. 

BLOG: Planos para o futuro? 

MARIA ANGELICA: Continuar servindo à sociedade da melhor maneira possível. 

BLOG:  Qual a sua mensagem às mulheres? 

MARIA ANGÉLICA: A mesma que ouvi da minha mãe: o conhecimento que adquirimos é nosso maior patrimônio, nossa maior arma e herança ... Em um mundo em que o direito à educação é negado em muitos países, aproveitem toda a oportunidade de aprendizagem, pois é o conhecimento que nos ajuda a modificar nosso futuro, superar desafios, ultrapassar barreiras e adquirir respeito, visibilidade e parcerias em tudo na vida. 

FOTOS: Crédito para Bianca Wendhausen/IRD. – 

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quarta-feira, 30 de março de 2022

Governo quer estudo no Sistema de Alarme por Sirenes no Plano de Emergência do Programa Nuclear Brasileiro

 


Um novo modelo de gestão do Sistema de Alarme por Sirenes do Plano de Emergência Externo do Estado do Rio - onde estão localizadas as usinas Angra 1 e Angra 2, e as instalações de enriquecimento de urânio, em Resende - será estudado por um grupo de trabalho, em prazo inicial de 180 dias. A determinação do ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, Augusto Heleno Ribeiro Pereira, foi publicada ontem (29/3) no Diário Oficial da União. 

O grupo fará o trabalho no âmbito da Comissão de Coordenação da Proteção ao Programa Nuclear Brasileiro. De acordo com a publicação, o grupo de trabalho é composto por representantes dos seguintes órgãos e entidades: Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, que o coordenará; Ministério da Economia, por meio da Secretaria de Coordenação do Patrimônio da União; Ministério de Desenvolvimento Regional, por meio da Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil; Eletrobras Termonuclear S.A. – Eletronuclear; Governo do Estado do Rio de Janeiro, por meio da Secretaria de Estado de Defesa Civil; e Secretaria Executiva de Proteção e Defesa Civil da Prefeitura Municipal de Angra dos Reis. 

Cada titular do grupo de trabalho poderá ter até dois suplentes, que o substituirá em suas ausências e impedimentos. O grupo terá duração de 180 dias, contados a partir da data de publicação do ato de designação de seus representantes e por solicitação do coordenador do grupo de trabalho, o prazo para a conclusão do trabalho poderá ser prorrogado, uma única vez, por igual período. O produto final do grupo de trabalho será a apresentação de proposta do novo modelo de gestão do Sistema de Alarme por Sirenes, ao representante do órgão coordenador da Comissão de Coordenação da Proteção ao Programa Nuclear Brasileiro. 

FOTO: Central Nuclear de Angra – Abdan – 

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Presidente da Eletronuclear acha que tomada da Rússia à central atômica na Ucrânia pode afetar setor nuclear

 


Até que ponto a tomada pela Rússia, no dia 4 de março, da central nuclear de Zaporizhzhia – a maior da Europa, localizada na Ucrânia, pode afetar o setor nuclear? O presidente da Eletronuclear, Leonam dos Santos Guimarães, estatal responsável pela gestão de Angra 1 e Angra 2, em funcionamento – e  Angra 3, em obras – acha que “países que constroem usinas nucleares com a cooperação da Rússia, com a Turquia e Finlândia, por exemplo, poderão reconsiderar esses compromissos de longo prazo, em parte porque os russos podem não ser capazes de financiá-los, mas também por razões de segurança nacional”.  

Na avaliação de Leonam, o ataque russo à central Zaporizhzhia, “desencadeou eventos desestabilizadores que, na pior das hipóteses, poderiam levar a um acidente nuclear”. No entanto, os governos europeus e a indústria nuclear – inclusive da Ucrânia – intervieram para que isso não acontecesse, tomando medidas de segurança técnica e proteção física. 

Além disso, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) pediu que a segurança nas usinas nucleares da Ucrânia fosse mantida em sete áreas específicas. Para Leonam, essa é uma mensagem que pode servir de base para futuras negociações multilaterais, de modo a lidar com ameaças de guerra a esse tipo de instalação. 

Para o presidente da Eletronuclear, é mais provável que os governos europeus respondam a uma maior preocupação com suas usinas nucleares não fechando-as ou cancelando projetos de novas unidades, mas reforçando sua defesa nacional contra uma invasão russa. “Ademais, os governos e a indústria devem revisar novamente o estado de preparação das instalações nucleares à luz de novas informações sobre o que acontece na Ucrânia”. As opiniões do presidente da Eletronuclear estão em artigo publicado ontem no Linkedin.

USINA FLUTUANTE -  

Vale lembrar que em setembro do ano passado, a Eletronuclear e a Rosatom, estatal de energia atômica da Rússia, assinaram um memorando de entendimento durante a Conferência Geral da AIEA, Viena, na Áustria, para a expansão futura de negócios, especialmente no atendimento à necessidade de ampliação da geração nucleoelétrica no Brasil. 

O memorando previa a troca de informações para se desenvolver uma cooperação em áreas como a construção e manutenção de usinas nucleares de grande e pequena potência no Brasil, extensão da vida útil de usinas, soluções nas etapas iniciais e finais do ciclo de combustível nuclear e o tratamento de combustível usado, informou a Eletronuclear na época. 

Com o acordo, as duas empresas também buscavam construir uma parceria em projetos de reatores modulares terrestres e flutuantes; estudos sobre a economia do hidrogênio; gestão de pesquisa, desenvolvimento e inovação; e o aumento da aceitação pública da energia nuclear, entre outras frentes. A partir de agora, com a ameaça russa sobre a central nuclear na Ucrânia, difícil avaliar qual será o destino do memorando assinado em setembro.

 FOTO – Central Nuclear de Zaporizhzhia – Crédito: Poder 360 - 

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segunda-feira, 28 de março de 2022

SBPC pede a deputados para votarem "não" à liberação da produção dos radioisótopos a empresas privadas



A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) enviou nesta segunda-feira, (28/3) carta aos deputados federais solicitando que votem ‘não’ à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 517/10, que trata da produção de radioisótopos de uso médico pela iniciativa privada.  A votação está prevista para ocorrer amanhã (29/3).

No documento, a entidade lista alguns argumentos importantes e reafirma que o IPEN, instituição pioneira e responsável pelo desenvolvimento da Radiofarmácia no País, continue fornecendo produtos essenciais para a população brasileira, especialmente à atendida pelo SUS. 

Eis a carta aos parlamentares: 

Temos certeza do seu compromisso com a saúde da população do nosso país, já tão debilitada. Pedimos seu apoio para votar NÃO na segunda votação da PEC 517/2010 agendada para a próxima semana.

Confiamos no seu voto fundamentado no interesse público. Entretanto, pedimos sua atenção para argumentos importantes, mas desconhecidos pela relatoria até o momento: 

O monopólio da União em vigor restringe-se somente à importação de molibdênio-99 (99Mo) para industrialização dos geradores de 99Mo/99mTc em território nacional, papel exclusivo e desempenhado pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN/CNEN/SP). Portanto, as instituições públicas e privadas podem produzir e comercializar os demais radiofármacos, desde que os mesmos sejam registrados na ANVISA. 

Atualmente, o preço do gerador de 2 Curies de 99Mo/99mTc produzido pelo IPEN é de R$ 6.835,00 e o importado pela iniciativa privada é de R$ 17.200,00. Mesmo com correções de variação cambial do 99Mo o preço do gerador do IPEN não passaria de R$ 8.885,50. 

Há possibilidade de autonomia nacional na produção de radioisótopos com a construção e operação do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB) viabilizando a ampliação e democratização da oferta de diagnósticos e terapias pelo SUS. Atualmente, de cerca de dois milhões de procedimentos/ano, somente 25% são destinados ao sistema público. 

O IPEN possui um plano de ação com a ANVISA e, com recursos públicos, vem trabalhando para modernizar as instalações da produção de geradores de 99Mo/99mTc no Centro de Radiofarmácia até 2025, capacitando-se para duplicar sua produção. A iniciativa privada, ao registrar seus produtos na ANVISA, poderá provocar a interrupção do IPEN, fato já ocorrido com alguns produtos do Instituto. Isso pode acarretar desperdício de recursos públicos. 

Nesse sentido, a Sociedade solicita seu voto NÃO à PEC 517/2010 para que IPEN, uma instituição pioneira e responsável pelo desenvolvimento da Radiofarmácia no país, continue fornecendo produtos essenciais para a população brasileira, especialmente à atendida pelo SUS. FOTO: Portal IPEN – FONTE: SBPC - 

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terça-feira, 22 de março de 2022

Dezesseis mil tambores com material radioativo continuam na fila para serem trocados em Caldas

 


Cerca de 16 mil tambores com Torta II (material radioativo), com problemas de corrosão estão na fila para serem reembalados na Unidade de Caldas (MG), da Indústrias Nucleares do Brasil (INB). A estatal acaba de concluir a troca de 1.500 tambores. A próxima etapa mira o mesmo trabalho com 2.500 tambores. O valor do investimento não foi divulgado.

Em junho do ano passado o blog noticiou o plano da empresa de substituir o telhado que abrigava os tambores, pois havia risco de vazamento de radiação no local até mesmo para o meio ambiente.  A Torta II (contendo urânio e tório) é procedente da ex-Nuclemon, em São Paulo, e vinha sendo depositada em Caldas há pelo menos 30 anos. 

A China já tentou comprar a Torta II, mas o negócio não foi fechado. O destino final desse material é um problema a ser resolvido. A INB já tentou transferir outras toneladas de Torta II da Nuclemon, até hoje armazenadas na Usina de Interlagos (USIN) e num sítio em Botuxim, ambos em São Paulo, mas o prefeito de Caldas, Ailton Goulart, ambientalistas e parlamentares não aceitaram receber o que eles chamam de “lixo atômico”.

O superintendente de descomissionamento da INB, Diógenes Salgado Alves, informou que “não existem mais pilhas instáveis” e que “os escoramentos foram eliminados”. Adicionalmente à operação em questão, segundo ele, três galpões usados na estocagem da Torta II passaram por manutenções em seus telhados, sendo que um deles teve todas as telhas da cobertura e dos fechamentos laterais substituídos”. 

Segundo a literatura disponível e a própria INB, a exploração do urânio no Brasil teve início em 1982, em Poços de Caldas.  Em 1995, a INB constatou que era economicamente inviável a operação da unidade e encerrou suas atividades. Dez anos depois, foi iniciada a descontaminação de suas instalações e terrenos. O material denominado de Torta II é um resíduo radioativo, proveniente do tratamento químico da monazita. 

“Um dos acidentes que pode ocorrer é a queda de telhas com suspensão de Torta II no ar durante as atividades de troca de telhas, com ou sem vítimas. Abalroamento, cortes, esmagamentos, fraturas, atropelamentos, asfixias também são possíveis”, consta em documento.

 A empresa garante que as instalações, o solo, as águas e os equipamentos da antiga mineração são permanentemente monitorados, assim como os materiais radioativos que ali estão estocados (os tambores com Torta II), para “proteger o meio ambiente e assegurar a saúde dos trabalhadores da unidade e dos moradores da região”.  

FOTO: INB – CALDAS - 

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segunda-feira, 14 de março de 2022

INB e Eletronuclear: contrato "ganha-ganha" fecha venda de 10 recargas para usinas nucleares

 


A Indústrias Nucleares do Brasil (INB) e a Eletronuclear acabam de assinar um contrato para o fornecimento de elementos combustíveis para cinco recargas de Angra 1 (28ª a 32ª) e Angra 2 (19ª à 23ª), totalizando o compromisso de entrega de dez recargas para as usinas nucleares. O último contrato de fornecimento de combustível nuclear tinha sido realizado em 2011.  O valor do contrato não foi informado. “Foi um contrato ganha-ganha, onde conseguimos ajustar as condições de fornecimento e acertamos os passos das duas empresas”, disse João Carlos Tupinambá, superintendente de Planejamento Estratégico e de Comercialização da INB, João Carlos Tupinambá.  

Além de equilibrar os preços e condições comerciais, bem como ajustar detalhes técnicos, o novo contrato se adequa à necessidade de ambas as empresas, informou a empresa. O presidente da INB, Carlos Freire Moreira, falou que o contrato é importante para o futuro da estatal. “É mais um passo para atingirmos a nossa principal meta estratégica que é a autossuficiência". 

ELEMENTO COMBUSTIVEL - As pastilhas de urânio são empilhadas em varetas (FOTO) de uma liga super resistente, o zircaloy. Um conjunto destas varetas, mantidas por grades espaçadoras, forma o elemento combustível.  Um elemento combustível permanece no reator durante três ciclos, ou seja, aproximadamente três anos. Após este período eles são armazenados dentro das usinas, nas piscinas de combustíveis usados. 

A usina Angra 1 (tecnologia norte-americana Westinghouse) utiliza 121 elementos combustíveis com quatro metros de comprimento, cada um contendo 235 varetas rigidamente posicionadas em uma estrutura metálica, formada por 10 grades espaçadoras, uma grade protetiva, 20 tubos guias e mais um tubo de instrumentação; e dois bocais, um inferior e um superior. Na usina Angra 2 (tecnologia Siemens, alemã) são utilizados 193 elementos combustíveis com cinco metros de comprimento, cada um com 236 varetas posicionadas em uma estrutura metálica, formada por nove grades espaçadoras, uma grade protetiva, 20 tubos guias e dois bocais, um inferior e um superior. 

FOTO: ELEMENTO COMBUSTÍVEL/INB - 

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quarta-feira, 9 de março de 2022

Marcelo Linardi: foi "arbitrária" a exoneração do superintendente do IPEN, Wilson Calvo, defensor da produção pública de remédios contra o câncer

 


Ex-diretor do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), o pesquisador emérito do Instituto, Marcelo Linardi, fala sobre a “arbitrária” exoneração do superintendente Wilson Calvo, durante o carnaval, pelo ministro Marcos Pontes. Graduado em Engenharia Química pela Universidade Estadual de Campinas (1983), com mestrado em Ciências Nucleares pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (1987), doutorado em Engenharia Química - Universitat Karlsruhe (1992) e Pós-Doc pela Universidade de Darmstadt, Alemanha em 1998, Linardi, conta ao BLOG os desdobramentos da exoneração e comenta sobre a firme posição de Calvo em relação à produção dos radiofármacos (medicamentos com radiação para diagnóstico e combate ao câncer) a favor da saúde pública brasileira. Eis a entrevista.

BLOG: Qual a sua opinião sobre a exoneração do superintendente do IPEN, Wilson Calvo, durante o carnaval? 

MARCELO LINARDI:  A exoneração de Wilson Calvo do cargo de Diretor de Unidade da CNEN (IPEN) deixou perplexa quase a totalidade de funcionários do Instituto. Ocorreu de forma unilateral por parte do governo federal, quebrando um rito processual e também uma tradição, que envolvem a Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Governo do Estado de São Paulo (SDE), a Universidade de São Paulo (USP, da qual o IPEN antes fazia parte) e, por fim, do Conselho Superior do IPEN, colegiado máximo da Instituição que seleciona o seu Superintendente, num rito determinado, com regras claras.  

BLOG: Informe mais sobre a importância do Conselho. 

LINARDI: O Conselho é formado exatamente pelas partes desrespeitadas pela CNEN neste ato de exoneração, ou seja, a SDE, a USP, a FIESP e a própria CNEN, claro. Assim, qualquer decisão de mudança de Superintendente passa, necessariamente pelo Conselho Superior, que sequer foi notificado. Este ato arbitrário do governo federal significou um desrespeito, não só a estes órgãos, mas também ao próprio Calvo, pessoa quase unânime na casa, pela sua eficiência, dedicação e atenção a todos. Questionada a esse respeito, a CNEN afirmou, em reunião interna, que não é obrigada a dar satisfação deste ato. Discordo. O convênio entre as partes (CNEN e Governo de SP) dita o rito (não cumprido) e, mesmo que não o fizesse, há uma obrigação moral de termos explicações do ocorrido. 

BLOG:  Quais interesses poderiam ter provocado a exoneração? 

LINARDI: Como a CNEN não esclareceu os fatos, ficou um vácuo. Transitamos entre mais uma atitude destrutiva do governo federal à ciência e tecnologia nacionais ou então interesses de foro particular, que não justificam o ato em si, ou ainda o que se quer esconder? A não explicação somente gera incertezas e desconfianças. A atitude do Ministro do MCTI, Marcos Pontes, que assina a exoneração, também não combina com suas pretensões políticas, numa campanha positiva em prol da ciência. 

BLOG:  Sabemos que foi à revelia do Governo do São Paulo, que, aliás, está criticando o governo federal, acusando de intervenção etc. LINARDI:  É verdade, mas deixando interesses políticos de lado, foi uma atitude que traz graves prejuízos ao Instituto. Os funcionários estão revoltados e já realizaram, inclusive, manifestações, via Associação, de desagravo à exoneração. BLOG: Até agora o governo de SP não tomou medidas reais. Sabe o motivo? O que acha? 

LINARDI: Não tenho conhecimento sobre as reações das partes desrespeitadas como um todo. Sei apenas que o Conselho Superior não concordou com a atitude da CNEN/Governo Federal. Aliás, vale a pena lembrar que a exoneração do cargo de Superintendente da Autarquia Estadual não foi realizada, apenas de Diretor de Unidade da CNEN. Antes, estes dois cargos se reuniam numa só pessoa. Agora, dividiu-se e isso é inédito. 

BLOG: Como assim? 

LINARDI: Calvo continua sendo o Superintendente, somente o governador do Estado pode exonerá-lo. O cargo de Diretor de unidade passou para o adjunto, que é a Isolda Costa, que pode, perfeitamente dispor do trabalho do ainda Superintendente Calvo na administração do IPEN. Entretanto, só ela pode assinar os documentos do instituto. Eu me pergunto como a CNEN reagiria a esta situação esdrúxula, caso viesse a ser desrespeitada da mesma forma?

BLOG:  Até que ponto a exoneração pode afetar as atividades do IPEN? 

LINARDI: Será prejudicial ao IPEN como um todo. Primeiro pela insegurança de governança por parte da CNEN. Com esta exoneração arbitrária, todos os dirigentes se sentem ameaçados. Não é com atitudes como essa que se forma um time forte para cumprir seus objetivos, que no caso do IPEN são nobres e caros à sociedade. 

BLOG:  Wilson Calvo defendia a produção dos radiofármacos via radioisótopos importados pelo Ministério/CNEN. Essa defesa pode ter contribuído para a exoneração? Ele seria uma “pedra no caminho” dos interessados em quebrar o monopólio? 

LINARDI: Calvo sempre defendeu o interesse público e também a saúde da população brasileira. Todas as suas atitudes e decisões foram neste sentido, não poupando esforços, sacrifícios e incontáveis horas extras (não remuneradas) para a consecução destes objetivos. A quebra do monopólio em si não é um problema. A forma de como está sendo proposta, sim. Não fomos ouvidos nem chamados a participar deste processo. Há medidas importante a se considerar nesta quebra, que garantam a continuidade da produção e pesquisa públicas de radiofármacos, como por exemplo, a continuidade e expansão de seu fornecimento ao SUS (Sistema Único de Saúde) pelo IPEN a preços reduzidos. Temo que isso não ocorrerá e o Calvo sempre fez alertas a esse respeito. 

BLOG:  O que acha da quebra do monopólio, a partir da PEC 517/2010, do senador Álvar Dias (Podemos-PR)? 

LINARDI: Como está formulada vai trazer prejuízos ao país. Embora tenha o forte argumento de garantir a não interrupção de fornecimento de radiofármacos à população, já que cortes de verbas públicas anteriores trouxeram estes contratempos. Mas, e se uma empresa fechar as portas? Não se trata de um produto de prateleira! Não se importa produtos radioativos da noite para o dia! E se nossa infraestrutura de produção já estiver desmontada? E mais, imediatamente após a quebra do monopólio os preços vão quase que triplicar no mercado. E o SUS como fica? O IPEN não produzirá mais, pois embora nossos produtos já sejam de uso consagrado e seguros, a ANVISA aprovará, a partir de então, apenas os produtos devidamente registrados, que as empresas privadas possuem. O IPEN também procura registrar nossos produtos, mas são processos lentos e custosos que envolvem testes clínicos caros. Já registramos alguns, mas precisamos de tempo par para todos ou outros. A PEC não nos dá este tempo. 

BLOG: Eles alegam que o preço do radiofármaco ficará mais em conta para o mercado e SUS... 

LINARDI: Por quê? As empresas farão caridade? 

BLOG:  Agora, como fica o IPEN? 

LINARDI: Não sabemos. Este fato nunca aconteceu antes. Confio na capacidade da Isolda e na sua vontade de ajudar. Como já mencionei, o Calvo pode ainda participar da vida do instituto se assim quiser, claro. De qualquer maneira, a insegurança e o descontentamento instaurados nos seus funcionários é visível e lamentável para o futuro da instituição. O melhor seria, sem dúvida nenhuma, a revogação da exoneração e a abertura de diálogos, tão raros e difíceis no governo federal atual. Ficamos a pensar: será que o governo federal objetiva um desmonte da pesquisa científica e do ensino do país como um todo, ou seriam mesmo atitudes típicas de autoridades de épocas não democráticas de outrora? 

BLOG:  Conte um pouco sobre as suas experiências no IPEN. E por que saiu? 

LINARDI: Me aposentei por motivos exclusivamente particulares. Tenho experiência na área de Química, com ênfase em Eletroquímica, atuando principalmente nos seguintes temas: célula a combustível, eletroquímica, eletrocatálise, hidrogênio e etanol. Orientei 10 teses de doutorado, dez dissertações de mestrado, quinze trabalhos de iniciação científica, sete estágios e cinco pós-doc, na CPG USP/IPEN. Atuei no PROH2, Programa Brasileiro de Células a Combustível e Hidrogênio do Ministério de Ciência e Tecnologia. Escrevi o primeiro livro em língua portuguesa sobre ciência e tecnologia de células a combustível. De 2013 a 2019 fui diretor de P&D e Ensino do IPEN, atuando nas áreas de inovação, ensino, projetos institucionais e gestão de tecnologias. Coordeno dois projetos institucionais: um FAPESP, chamada da Secretaria do Estado de SP, no valor de R$ 16 milhões, na área de radiofarmácia e nanotecnologia; e um FINEP, de equipamentos multiusuários, no valor de R$ 15 milhões, baseado numa unidade móvel para um irradiador de elétrons multifuncional. Como diretor no IPEN criou várias iniciativas para o fomento de P&D e Ensino como: projetos meritocráticos; editais internos, prêmio de inovação tecnológica, vários prêmios de reconhecimento profissional individuais;  ações de Internacionalização do instituto; livro sobre o passado, presente e futuro da inovação tecnológica no IPEN, entre outras ações visando alavancar nossos programas, mantendo qualidade, por exemplo.

FOTO: ARQUIVO PESSOAL – MARCELO LINARDI. 

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segunda-feira, 7 de março de 2022

Corporação da Rússia acaba de fornecer radioisótopos ao Brasil

 

Apesar da guerra entre Rússia e Ucrânia, não foi afetado o fornecimento ao Brasil na semana passada (3/3) de radioisótopos (insumos) para a produção de radiofármacos (medicamentos com radiação para diagnóstico e tratamento contra o câncer). 

A corporação Rosatom, uma das maiores empresas russas que mantém contrato com o Brasil desde 2009, forneceu os radioisótopos iodo e Molibdênio ao Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares da Comissão Nacional de Energia Nuclear (IPEN-CNEN). 

EXONERACÃO - 

Há um conflito interno no IPEN com a exoneração pelo Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações, Marcos Pontes, do superintendente do IPEN, Wilson Calvo, em pleno carnaval. Há um movimento visando o retorno de Wilson Calvo, que condena a privatização da produção de radioisótopos, como estabelece a PEC-517/2010, do senador Álvaro Dias (Podemos PR). 

FOTO: Portal Ipen – 

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quinta-feira, 3 de março de 2022

O Brasil perde um dos maiores físicos, o cientista, professor Luiz Pinguelli Rosa. Reitoria da UFRJ declara luto oficial de três dias.

 


Reitoria da UFRJ declara luto oficial de três dias pelo falecimento do ex-presidente da Eletrobras e diretor da Coppe/UFRJ por quatro mandatos. 

Foi com profundo pesar que a Reitoria teve ciência do falecimento do professor emérito Luiz Pinguelli Rosa, ocorrido nesta quinta-feira, 3/3, aos 80 anos. A Reitoria declarou luto oficial de três dias pela partida de Pinguelli. O velório ocorrerá às 17h desta quinta-feira, no Átrio do Palácio Universitário, no campus Praia Vermelha (avenida Pasteur, 250). 

Graduado em Física pela UFRJ, mestre em Engenharia Nuclear pela Coppe/UFRJ e doutor em Física pela PUC-Rio, Pinguelli foi diretor da Coppe por quatro mandatos e presidente da Eletrobrás, entre 2003 e 2004. O docente também era membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC). Orientador de dezenas de dissertações de mestrado e teses de doutorado, o professor recebeu diversos prêmios, entre eles o de personalidade do ano de 2014, da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). 

Professor emérito e titular do Programa de Planejamento Energético da Coppe, foi professor do Programa de História das Ciências e das Técnicas e Epistemologia da UFRJ, além de secretário executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, organismo científico do Governo do Brasil para estudar o problema do aquecimento global em suas implicações para o país, auxiliar na criação e promoção de políticas. Além disso, Pinguelli foi fundador da Associação de Docentes da UFRJ (Adufrj), tendo sido seu primeiro presidente. 

Suas áreas atuais de pesquisas se concentravam em planejamento energético, mudanças climáticas, além da epistemologia e história da ciência. As pesquisas de Pinguelli já se dedicaram à engenharia nuclear, física de reatores, física teórica e física de partículas. 

Disseminando o conhecimento aprendido e desenvolvido na UFRJ, Pinguelli foi pesquisador e professor visitante de diversas universidades mundo afora: Universidade Stanford (EUA), Universidade da Pensilvânia (EUA), Universidade Grenoble Alpes (França), Universidade Cracóvia (Polônia), Centro Internacional de Pesquisa em Meio Ambiente e Desenvolvimento (França), Centro de Estudos Energéticos Enzo Tasselli (Itália), Agência Nacional de Energia Nuclear e Fontes Alternativas (Itália) e Fundação Bariloche (Argentina). 

Luiz Pinguelli foi ainda membro do Conselho do Pugwash, entidade fundada por Albert Einstein e Bertrand Russel, a qual ganhou o Nobel da Paz em 1995 e estava participando do Painel Intergovernamental de Mudanças do Clima (IPCC), instituição que recebeu o Nobel da Paz em 2007. 

A Reitoria da UFRJ lamenta profundamente a partida de Pinguelli, defensor nato da universidade brasileira e da difusão da ciência e da tecnologia. Seu compromisso com uma universidade de qualidade que transpira pesquisa deixará uma lacuna entre nós e um aprendizado permanente. Transmitimos força aos familiares, aos amigos e à comunidade acadêmica neste momento de consternação. 

3/3/2022
Reitoria da UFRJ

terça-feira, 1 de março de 2022

Governo de São Paulo repudia tentativa de intervenção federal no caso de exoneração no IPEN-CNEN

 


A Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia do Estado de São Paulo afirmou há pouco ao blog que “repudia a tentativa unilateral de intervenção do governo federal”, por meio do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, no IPEN (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares), burlando as regras administrativas do instituto. À revelia da Secretaria, o Ministro Marcos Pontes exonerou, em pleno carnaval, o superintendente do IPEN, Wilson Calvo, “sem consulta aos órgãos constituintes do Conselho - formado por diversas entidades nacionais – o que resulta em desrespeito ao convênio firmado para gestão de recursos”. 

Segundo a Secretaria, a iniciativa “reforça ainda a tendência do governo federal em manter o enfraquecimento da ciência, com cortes recorrentes nos recursos e decisões arbitrárias”. Em contraponto, acrescenta, o Governo de São Paulo “destinou o maior orçamento da história do Estado no setor, aumentando em 40% nesta gestão os recursos para Ciência e Tecnologia". 

A exoneração de Wilson Calvo tem provocado indignação na área nuclear. A presidente da Sociedade Brasileira de Biociências Nucleares (SBBN), Silvia Maria Velasques de Oliveira, se manifestou em nota nesta segunda-feira 28/2). Segundo ela, a principal razão da exoneração é que Wilson Calvo estaria sendo “pressionado por defender a radiofarmácia pública hoje instalada no IPEN". 

"Ele se posicionou contrariamente à PEC 517/2010 da forma que ela está proposta, referente à quebra do monopólio da União no que diz respeito à produção de radioisótopos e radiofármacos de meia-vida longa, alertando para a necessidade de se manter a radiofarmácia pública para garantir atendimento a pacientes do sistema público", continuou. 

"A SBBN lamenta mais este episódio contrário ao interesse público e conclama o MCTI pela revogação da exoneração e que haja diálogo com todos os envolvidos na gestão da área estratégica da produção de radiofármacos", afirmou Silvia Maria. Os radioisótopos são insumos utilizados pelo IPEN para a produção de radiofarmacos – medicamentos com radiação para diagnosticar e combater o câncer. Wilson Calvo seria uma “pedra no sapato” daqueles que buscam acabar com a produção no IPEN para a inciativa privada, principalmente. 

O IPEN, da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), é um dos mais importantes institutos da América Latina, com 60 anos de existência, que poderá ser reduzido significativamente com a paralisação das pesquisas, segundo fontes da própria CNEN. Leia matérias sobre o assunto no BLOG. 

FOTO: Portal do IPEN-CNEN. 

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