Ato público ocorre nesta quinta-feira (17), das
15h30 às 16h, em frente à Reitoria da UFRPE, durante a 77ª Reunião Anual da
SBPC, em protesto contra o PL 2159, que fragiliza o licenciamento ambiental e
ameaça conquistas constitucionais. A SBPC
convoca todas e todos que defendem o meio ambiente, a ciência, os direitos
constitucionais e o futuro das próximas gerações para se juntarem, nesta
quinta-feira (17/7), à manifestação contra o Projeto de Lei 2.159/2021, que
desmonta o sistema de licenciamento ambiental brasileiro. O ato acontece
durante a 77ª Reunião Anual da SBPC, em frente ao prédio da Reitoria da
Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), das 15h30 às 16h.
A proposta
aprovada pelo Senado e prestes a ser votada na Câmara representa o maior retrocesso
das últimas décadas na política ambiental brasileira. Se aprovado, o PL 2159:
Fragiliza
o controle sobre grandes obras com potencial destrutivo; Dispensa o
licenciamento para atividades do agronegócio com base em autodeclarações; Ignora
compromissos internacionais do Brasil no combate às mudanças climáticas; Coloca
em risco biomas inteiros, como a Amazônia, o Cerrado e a Mata Atlântica; Ameaça
diretamente os direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais; Viola
princípios constitucionais, desmonta o papel do Estado na proteção ambiental e
sabota o futuro da educação, da ciência e do desenvolvimento sustentável.
“A
SBPC não aceitará que conquistas históricas da sociedade brasileira sejam
desmontadas por interesses imediatistas”, afirma a entidade. É hora de reagir.
Vamos às ruas defender o Brasil que queremos. Um país com justiça
socioambiental, soberania, ciência e compromisso com as próximas gerações. Ponto
de encontro: Reitoria da UFRPE, às 15h30.
Leia também:
MANIFESTO DA CIÊNCIA BRASILEIRA SOBRE O PROJETO DE
LEI (PL) Nº 2.159/2021.
O
licenciamento ambiental vigente está sob séria ameaça. Ele é o principal
instrumento da Política Nacional de Meio Ambiente (Lei nº 6.938/ 1981) que
garante proteção constitucional sobre direitos da coletividade brasileira,
sobre o meio ambiente ecologicamente equilibrado, para as suas presentes e
futuras gerações. E esta ameaça vem, infelizmente, do Congresso Nacional.
Está
para ser votado, na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei (PL) nº 2.159/2021.
Este PL representa o mais grave retrocesso ao sistema de proteção ambiental do
país. Ele fragiliza as regras e mecanismos de análise, controle e fiscalização.
E, ainda, ignora solenemente o estado de emergência climática em que a
humanidade se encontra e o fato de que quatro biomas brasileiros (floresta
Amazônica, Cerrado, Pantana e Caatinga) estão muito próximos dos chamados de
“pontos de não retorno”. Se ultrapassados estes pontos, estes biomas poderão
entrar em colapso ambiental deixando de prestar seus múltiplos serviços
ecossistêmicos. A ciência já demonstrou, com fartas evidências, que para
evitarmos o tal colapso é necessário, urgentemente, zerar a destruição da
vegetação nativa, combater os incêndios e a degradação ambiental e iniciar a
restauração em grande escala destes biomas, incluindo, entre eles, a Mata
Atlântica. A propósito, o PL altera também a Lei da Mata Atlântica, bioma que
já perdeu 76% de sua cobertura original, deixando os remanescentes de floresta
madura vulneráveis ao desmatamento.
Além de ameaçar os biomas e o bem-estar dos
brasileiros, a aprovação desse PL mostrase incompatível com os compromissos
assumidos pelo Brasil no âmbito do Acordo de Paris e do Marco Global da
Biodiversidade de Kunming-Montreal, entre outros atos internacionais, inclusive
aqueles que protegem os direitos humanos fundamentais. Se aprovado, o Poder
Legislativo do país estará colocando em dúvida o papel de liderança do Brasil
no âmbito dos esforços globais de mitigação e adaptação com respeito às
mudanças climáticas. E isto em plena recepção, em solo nacional, da COP 30, a
ser realizada em Belém do Pará no final deste ano.
Claramente, o PL é uma
ameaça à Constituição Federal e aos direitos dos brasileiros. Mas, também, é
uma afronta à ciência produzida pelos cientistas do Brasil e do mundo, incluindo
aqueles reunidos no âmbito da Academia Brasileira de Ciências (ABC), da
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), do Painel Científico
da Amazônia e do IPCC. Esta afronta é brevemente ilustrada abaixo caso o PL
seja aprovado.
Aumento potencial de emissões de carbono. A proposição de uma
Licença por Adesão e Compromisso (LAC) permitirá emissões de licenças
automáticas, com base apenas na autodeclaração do empreendedor, para
empreendimentos de médio porte e médio potencial poluidor. Esse processo
desconsidera análises técnicas prévias e sobre os efeitos futuros da LAC sobre
as emissões nacionais de gases de efeito estufa e sobre recursos naturais,
incluindo a rica biodiversidade do país. O PL, ainda, coloca em risco papel do
Estado em exercer sua capacidade e dever de prevenir danos, já que o
empreendedor será dispensado de grande parte de suas obrigações.
Dispensa de
licenciamento para o agronegócio. O simples preenchimento de um formulário
autodeclaratório (LAC) passará a ser suficiente para garantir a dispensa de
licenciamento, sem qualquer verificação sobre impactos ambientais ou
compromissos firmados no âmbito dos programas de regularização ambiental. Do
ponto de vista científico, esta proposta submete os biomas, já ameaçados por uma
trajetória de “não retorno”, em situação crítica. Algo que prejudicará o
próprio agronegócio. Por exemplo, já há evidências científicas suficientes de
que o regime de chuvas no país sofreu alterações (redução) significativas com
impactos na produção de alimentos e commodities. Estas alterações não estão
sendo provocadas somente pela mudança global do clima, mas por alterações na
vegetação nativa que cobrem estas áreas. Considerando que no Brasil 90% da
agricultura não é irrigada, depende da vegetação nativa para produzi-la, o
enfraquecimento do licenciamento ambiental será, literalmente, um “tiro no pé”
da agricultura nacional.
Desvinculação do licenciamento da outorga de uso da
água. A proposta do PL em tramitação na Câmara, determina que o licenciamento ambiental
fique desvinculado de outorgas, desconsiderando que a outorga de uso da água é
um instrumento da Política Nacional de Recursos Hídricos, de gestão da água,
fundamental para garantir segurança hídrica e o acesso à água em qualidade e
quantidade. Dessa maneira, a análise do licenciamento ambiental ficará
totalmente prejudicada para empreendimentos que utilizam a água (como
hidrelétricas, reservatórios de abastecimento público, estações de tratamento
de esgotos e de efluentes). Tal desvinculação ignora, por completo, a
progressiva redução de disponibilidade de água no solo devido ao avanço da
redução de chuvas já sofridas por vastas regiões do país. Em alguns biomas
(Cerrado, por exemplo) mais da metade dos municípios já apresentam uma redução
de água superficial da ordem de 30%. Ainda, a fragmentação do licenciamento, de
forma isolada das outorgas, potencializará conflitos e tende a agravar impactos
relacionados a eventos climáticos no que se refere à água.
Ameaça às Unidades
de Conservação (UCs). O texto em tramitação na Câmara prevê a avaliação de
impactos e definição de condicionantes somente quando, nas regiões diretamente
afetadas pelos empreendimentos, existirem UCs ou suas zonas de amortecimento.
Da forma como está, portanto, o texto exclui todas as UCs, federais, estaduais
e municipais, da avaliação de impactos ambientais indiretos. Esta é uma visão
míope, uma vez que ignora a conectividade espacial e funcional entre diferentes
regiões com coberturas de vegetação nativa distintas. Os pareceres dos órgãos
de gestão (ICMBio e órgãos estaduais e municipais competentes) envolvidos não
terão caráter vinculante, permitindo que os órgãos licenciadores sem
competência legal e capacidade técnica para dispor sobre as temáticas referidas
o façam.
Ameaças a direitos dos povos e comunidades tradicionais. Se o PL for
aprovado, cerca de 80% dos territórios quilombolas (TQs) e 32,6% das Terras
Indígenas (TIs), que são áreas aguardando titulação e homologação, serão
ignoradas nos processos de licenciamento ambiental. Não estão previstas
quaisquer medidas de prevenção, mitigação e compensação de impactos
socioambientais ou de controle do desmatamento. Isto coloca em xeque, não
somente os direitos, mas também o papel que estes povos e comunidades têm na
conservação ambiental e na prestação de serviços ambientais. Por exemplo, uma
boa parte do regime de chuva e do armazenamento de carbono em vegetação nativa
são mantidos por estas populações. Terras indígenas na Amazônia, por exemplo,
funcionam como um grande “ar-condicionado” da paisagem. As temperaturas dentro
das Tis chegam a ser 2-5 oC mais baixas do que nos arredores. O PL não atenta a
estes serviços, pois a atuação das autoridades envolvidas, assim como a análise
técnica e a exigência de condicionantes, fica restrita apenas aos casos de
impactos nas áreas de influência direta do empreendimento potencialmente
degradadores, não considerando impactos indiretos ou na escala da paisagem.
Condicionantes
ambientais fragilizadas. O PL limita a responsabilidade do empreendedor diante
dos danos causados ou agravados pelo próprio empreendimento, inclusive em casos
de grandes obras que pressionam serviços públicos ou estimulam desmatamento e
grilagem. Esta falta de responsabilização poderá agravar ainda mais o avanço do
desmatamento ilegal e da grilagem, em especial na Amazônia. Atualmente, cerca
de 50% do desmate nesse bioma ocorre em terras públicas, em especial nas
chamadas “Florestas Públicas não Destinadas. São aquelas florestas que
aguardam, por lei, a destinação, pelos governos federal e estaduais, para
conservação ou uso sustentável de recursos naturais.
Inexistência de uma lista
mínima de atividades sujeitas ao licenciamento: A proposta do PL é que Estados
e municípios decidirão, isoladamente, o que licenciar. Isto levará a distorções
profundas entre regiões, com atividades semelhantes sendo tratadas de formas
distintas, onde o critério técnico-científico é ignorado dependendo da pressão
política local. O resultado será um sistema fragmentado, ignorante do ponto de
vista científico e sujeito à lógica meramente do poder público local e
regional. A falta de harmonização das regras também aumentará a insegurança
jurídica.
Criação da Licença Ambiental Especial (LAE): A emenda transfere ao
Conselho de Governo, órgão político vinculado à Presidência da República, o
poder de definir diretrizes nacionais e enquadrar projetos como “estratégicos”,
sem critérios claros, transparência ou controle social, rompendo com os
princípios técnicos e legais do licenciamento ambiental. Aqui, novamente, a
ciência será, no máximo, coadjuvante. A LAE será concedida por procedimento
monofásico, ou seja, sem a análise prévia, de instalação e de operação em fases
distintas. Sem maiores detalhes, tal emenda pode institucionalizar a liberação
acelerada de projetos que necessitam de análise mais aprofundada. Inúmeros
estudos científicos já demonstraram, por exemplo, o grave efeito socioambiental
de investimentos em infraestrutura mau planejados. Isto mesmo sob a vigência do
sistema atual de licenciamento que é mais rigoroso do que aquele proposto pela
Câmara. Sabe-se, por exemplo, que 70% de todo o desmatamento na Amazônia está
concentrado ao redor de obras de infraestrutura. A tal LAE poderá, portanto,
agravar esta condição, em especial nas inciativas que buscam a abertura e
pavimentação de rodovias (Ex. BR-319) e ferrovias (Ex. Ferrogrão) e a
exploração de petróleo e gás em áreas ecologicamente sensíveis (Ex. Margem
Equatorial).
Finalmente, além da clara ameaça a preceitos Constitucionais, o PL
proposto fere uma série de legislações fundamentais para proteção dos
ecossistemas e sua biodiversidade, como a Política Nacional de Meio Ambiente (Lei
6938/1981), o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Lei 9985/2000), a
Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998), além de fragilizar o Sistema
Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA). Assim, a discussão sobre aprimoramentos no
licenciamento ambiental precisa ser feita com responsabilidade e ampla
participação da sociedade, em especial da comunidade científica.
Considerações
finais. As alterações propostas no sistema de licenciamento ambiental pelo
Projeto de Lei (PL) nº 2.159/2021 parecem favorecer a interesses particulares
ou setoriais, pois ignoram as inúmeras evidências científicas que demonstram a
gravidade da crise climática e ambiental em curso no país. A Constituição
Federal de 1988 prevê o licenciamento ambiental como matéria para garantia do meio
ambiente ecologicamente equilibrado, direito fundamental, e impõe ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo. O PL ameaça esse
direito que é de todos os brasileiros. Um direito fundamental para um futuro
minimamente promissor num mundo sob estado de “emergência climática”. Recife, 14
de julho de 2025. Diretoria da SBPC.
(FONTE E FOTO –
SBPC) –
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