A Indústrias Nucleares do Brasil (INB) promove evento nesta terça-feira (01/12) para comemorar a retomada da produção de urânio no Brasil, a partir da lavra a céu aberto de uma nova mina na Unidade de Concentração de Urânio de Caetité (URA), na Bahia, a Mina do Engenho. A INB não mencionou as medidas de segurança que serão tomadas durante o evento por conta da propagação do coronavirus. A solenidade terá a presença do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque.
A expectativa é que sejam produzidas 260 toneladas de concentrado de urânio por ano, quando a Mina do Engenho atingir a sua capacidade plena, informou a INB, mas não divulgou quando isso ocorrerá. O urânio, depois de enriquecido pela própria INB, em Resende (RJ) e no exterior, é combustível que abastece as usinas nucleares.
Em Caetité, são realizados a mineração e o beneficiamento de urânio, atividades que correspondem à primeira etapa do Ciclo do Combustível Nuclear. De 2000 a 2015, foram produzidas 3.750 toneladas de concentrado de urânio a partir da Mina Cachoeira. Com a exaustão dos recursos passíveis de lavra a céu aberto, a empresa decidiu licenciar uma nova área, a Mina do Engenho.
A Autorização para lavra da nova mina foi concedida pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) em dezembro de 2019. E o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) renovou no mês seguinte a Licença de Operação da Unidade.
A CNEN condicionou a licença operacional para a volta à produção na Unidade à realização de testes funcionais (TF), que ocorreram a partir de 2018. Em setembro de 2020, como parte dos testes, foi realizado o entamboramento do concentrado de urânio (U3O8), produto final da INB Caetité. No total, foram produzidas 17,5 toneladas durante os testes funcionais realizados na Unidade.
RESERVAS BRASILEIRAS -
O Brasil detém uma das maiores reservas de urânio do mundo. Já esteve em quinto lugar, mas no ranking da Agência Internacional de Energia Atômica, de 2017, caiu para nono, o que ainda é bem significativo. Porém, por falta de pesquisas, o país pode ter muito mais urânio do que se contabiliza.
Hoje, os recursos nacionais são estimados em 244.788 toneladas de concentrado de urânio (U3O8). Desse total, 32,5% estão localizados no município de Itataia, no estado do Ceará, e 40,6%, em Caetité, na Bahia. São duas grandes jazidas, também conhecidas como Províncias Uraníferas, nas quais há diversas áreas potenciais a serem exploradas.
Na baiana Caetité, o governo intencionava há anos começar os trabalhos na Mina do Engenho. Para isso, embora não tenha divulgado, assinou contrato com a empresa Tracomal Terraplenagem e Construções Machado, para a prestação de serviços de lavra. As negociações para a mina do Engenho começaram em 2017, mas a INB se viu às voltas com exigências da CNEN e do Ibama, agora acertadas.
Já a mina cearense de Santa Quitéria, em Itataia, é outra história. Para tocar o projeto emperrado há décadas, a INB firmou parceria com a empresa privada Galvani. Juntas, montaram o Consórcio Santa Quitéria, para extrair urânio associado ao fosfato. O negócio deve começar até 2024, com previsão de produção de até 1.600 toneladas de yellow cake por ano, com a aplicação de tecnologia de separação de fosfato do urânio.
As licenças estão em estudo pela CNEN e o Ibama, mas o ministro de Minas e Energia, Bento de Albuquerque, se reuniu recentemente com as duas empresas que formam o consórcio, o que representa um aval para o novo modelo de negócio. Extração de urânio vale lembrar, ainda é monopólio da União.
MINA FECHADA -
Na baiana Caetité, além de potenciais minas a serem exploradas, na Jazida de Caetité, a INB mantém a Unidade de Concentração de Urânio (URA), única mineração de urânio em atividade no país. Nessa unidade, se realizava as duas primeiras etapas do ciclo do combustível nuclear: mineração e o beneficiamento do minério, que resulta no produto chamado concentrado de urânio ou yellowcake.
A URA ocupa uma área de 1.700 hectares, na província mineral com recursos que chagam a 99,1 mil toneladas de urânio e onde estão identificados 17 depósitos minerais, segundo a INB. De 2000 a 2015, a URA produziu 3.750 toneladas de concentrado de urânio a partir da extração a céu aberto de uma outra mina chamada Cachoeira, fechada em 2009, por falta de segurança.
CRITICAS AMBIENTAIS -
Pesquisadores e ambientalistas têm contestado a forma com que os projetos nucleares brasileiros têm sido realizados. Pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC) fundaram o núcleo Tramas, para debater questões ambientais. Um dos focos é a mina do Consorcio Santa Quitéria, na jazida de Itataia. O pesquisador Rafael Dias Melo, do núcleo, apontou os riscos de contaminação do solo e dos recursos hídricos na região.
“Ao longo dos anos, somente pela checagem de viabilidade, a parte do solo ao redor da jazida já estaria apresentando níveis de urânio acima do normal”, alertou. Ele também alerta sobre os problemas que serão provocados pela radiação aos moradores da região, “amentando a incidência de vários tipos de câncer, como o de pulmão”.
O professor associado do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo, doutor em Engenharia Mecânica, Célio Bermann, também contesta a exploração das minas na Bahia e no Ceará. “Essas minas começaram a ser exploradas em 2000, até 2009, quando registraram pelo menos cinco acidentes que contaminaram parte dos rios e solo da região, de acordo com um relatório da Secretaria de Saúde daquele estado. Vários casos de câncer nos trabalhadores das minas foram notificados pelos serviços de saúde local, muito embora a relação causa-efeito com a exposição a material radioativo nunca tenha sido estabelecida”.
Bermann também coloca sob suspeição a intenção pacifica dos projetos e o objetivo econômico. “Essa não deve ser a razão de retomada, pois o preço do minério no mercado internacional não deixou de cair, notadamente após o acidente de Fukushima em março de 2011”, comenta. Em sua avaliação, a previsão de acréscimo de 10.000 MW nucleares anunciada pelo Ministério de Minas e Energia até 2050, envolvendo neste propósito a construção de uma central nuclear em Itacuruba, no estado de Pernambuco, às margens do Rio São Francisco, é mais um problema grave. “Aumentará os riscos de disponibilidade hídrica naquela região do semiárido nordestino, além das incertezas e riscos intrínsecos das usinas nucleares”. A usina de Itacuruba é uma das quatro que o governo intenciona construir no Nordeste.
O professor aposentado da Universidade Federal de Pernambuco, Heitor Scalambrini, engrossa a lista de pessoas renomadas, que contestam as ações do atual governo. “A diversificação da matriz elétrica se dá através das fontes como a solar, eólica, agroenergia, entre outras, fontes renováveis. Mas face a uma péssima informação, que muitas vezes é deliberadamente omitida para a sociedade; estamos diante de mais uma catástrofe que poderá acontecer no território nacional, diante das políticas que estão sendo implementadas, e que caminham contrária aos interesses mais amplos da sociedade”, avisa Scalambrini, graduado em Física na UNICAMP, com mestrado em Ciências e Tecnologias Nucleares na UFPE e Doutorado na Universidade de Marselha/ Comissariado de Energia Atômica-França.
A Articulação Antinuclear Brasileira e da Coalização por um Brasil livre
de Usinas Nucleares, reúne cerca de 30 entidades, que tem debatido em “lives”,
por conta da pandemia, a posição contrária aos atuais projetos do governo. O
ativista e militante Chico Whitaker, faz parte do movimento. Whitaker já
batizou as usinas de “chaleiras atômicas” e prevê o crescimento do movimento,
com a comprovação da viabilidade e importância do uso das energias
alternativas. (FOTO - INB CAETITÉ)._
Que matéria interessante e cheia de infomações que o público náo tem na Imprensa diária. Vc conseguiu atingir um n´vel de especialização na área nuclear incrível. Quando sairá o novo livro? Parabéns
ResponderExcluirAgradecemos o seu comentário. A sua participação é muito importante e muito nos honra!
ExcluirNão tinha a menor ideia sobre esses projetos na área nuclear. Colocação dos nós em risco, ainda mais as populações locais. O desastre no Japão mostrou ao mundo o risco às vidas com usinas nucleares. A Alemanha se comprometeu a desativar suas usinas. Temos energia solar para explorar entre outros sistemas mais seguros. Obrigada por nos manter informados. A grande imprensa não mostra esses temas.
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