O Ministério Público Federal (MPF), através do procurador da República, Igor Miranda, acaba de ingressar na Justiça com ação civil pública requerendo a nulidade das licenças para a construção da Unidade de Armazenamento a Seco (UAS), destinada a guarda do combustível usado (urânio enriquecido) das usinas Angra 1 e Angra 2, em Angra dois Reis. Os órgãos licenciadores são a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
O procurador informou que o licenciamento obtido nos órgãos ambientais é simplificado, para empreendimentos de pequeno impacto, o que não é o caso da UAS, destinada a armazenar durante 45 anos o urânio já usado. Na ação, o procurador requer a apresentação do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) para a construção da UAS. Segundo ele, a Eletronuclear, gestora da central nuclear e do UAS, alega que já existe RIMA para as usinas. “Mas não há para a UAS, outro empreendimento, que exige providências importantes pela guarda do urânio”.
Na ação, o procurador requer novas licenças ao Ibama e a CNEN. Quer que a Eletronuclear paralise as obras até que a documentação seja apresentada. O descumprimento das medidas pode gerar multa de até R$ 18 milhões, de acordo com a ação. A Eletronuclear não se manifestou sobre a ação.
ESGOTAMENTO DAS PISCINAS -
Informou há cerca de 30 dias que ela primeira vez, técnicos começariam a ser treinados este mês para a operação inédita de transferência de combustível usado de Angra 1 e Angra 2 para a UAS. A UAS custará cerca de R$ 246 milhões segundo a Eletronuclear.
Com o esgotamento da piscina de elementos combustíveis irradiados de Angra 2, previsto para junho de 2021, a Eletronuclear, anunciou que pretende iniciar a transferência do material da usina dois meses antes (março). Já o esgotamento da piscina de Angra 1 está previsto para 2022. A transferência dos combustíveis usados da primeira unidade será no segundo semestre de 2021.
A Eletronuclear garantiu na época, que não será necessário um esquema de segurança especial para a transferência, porque a UAS está localizada dentro da central nuclear de Angra. “Os canisteres (filtros de carvão) com elementos combustíveis usados serão retirados das usinas hermeticamente fechados, com as tampas soldadas”.
A UAS está situada dentro da central nuclear de Angra. A instalação da UAS deve ficar pronta até o final deste ano. A estatal informou que a obra segue em ritmo acelerado, mesmo com a crise provocada pelo coronavírus.
REPROCESSAMENTO –
As piscinas de Angra 1 e 2 contam apenas com combustíveis usados. Esse material não é considerado rejeito porque ainda existe energia que pode ser aproveitada no futuro, por meio do processo de reprocessamento do combustível. A UAS é considerada um armazenamento complementar ao das piscinas existentes dentro das usinas. Os rejeitos de baixa e média atividade são armazenados em repositórios próprios, localizados dentro do terreno da central nuclear.
A estatal informou que as obras civis estão avançadas, com trabalho seguindo até dezembro. As atividades envolvem a construção da laje principal e de um almoxarifado e a instalação de uma cerca dupla, de iluminação externa e de uma guarita. Também serão instalados sistemas de monitoração de temperatura e radiação.
Os principais equipamentos da UAS já chegaram à central nuclear. Inicialmente, a UAS contará com 15 módulos. No total, 288 elementos combustíveis usados serão retirados de Angra 2 e 222, de Angra 1, o que abrirá espaço nas piscinas de armazenamento para mais cinco anos de operação de cada planta. A UAS poderá comportar até 72 módulos. A unidade está localizada dentro da central nuclear de Angra, fora da área das usinas.
REJEITOS SÓLIDOS -
A usina Angra 1, comprada da norte-americana Westinghouse, opera comercialmente desde 1985, já poderia estar desligada, mas há estudos para prorrogar a sua vida útil por mais 20 anos, com investimento de cerca de US$ 27 milhões.
Angra 1 mantém 1.062 elementos combustíveis armazenados em sua piscina, dentro da usina. Angra 1 já produziu 3.166 metros cúbicos de rejeitos sólidos (de baixa e média atividade), guardados em 7.602 tambores e caixas metálicas no Centro de Gerenciamento de rejeitos.
Cada recarga de Angra 1 custava aproximadamente R$ 188 milhões, sem contar os investimentos com o transporte. Em 2018, o custo total da parada para a troca de combustível, incluindo mão de obra, era de cerca de R$ 80 milhões. Angra 1 produz 650 MW, quando funciona com 100% de sua potência sincronizada ao Sistema Interligado Nacional (SIN).
Angra 2, comprada pelo acordo nuclear Brasil Alemanha, em 1975, entrou em operação em 2001. A segunda usina tem capacidade para gerar 1.350 MW. Angra 2 mantém em sua piscina, 888 elementos combustíveis usados. Armazena 201 metros cúbicos de rejeitos sólidos, embalados em tambores e caixas metálicas.
FERRUGEM EM INVESTIGAÇÃO -
Em junho último, Angra 2 foi desligada para a troca de combustível (urânio enriquecido), mas precisou ficar desconectada do sistema um mês acima do previsto: foram detectadas oxidação (ferrugem) em elementos combustíveis. A Eletronuclear ainda não divulgou o que provocou o problema, que continua sendo investigado. Os elementos combustíveis são de responsabilidade da estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB) e da Urenco, consórcio de empresas da Inglaterra, Holanda e Alemanha.
Angra 2 voltou a operar, usando elementos combustíveis de Angra 3, também alemã, cujas obras estão paradas desde 2015, por denúncias de corrução na operação “lava jato”.
ANGRA 3 NO OLHO DO FURAÇÃO-
O Ministério Público Federal (MPF) moveu outra ação civil pública contra a Eletronuclear e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) para obrigar o cumprimento das condicionantes socioambientais, sob pena de nulidade da Licença de Instalação nº 591/2009, concedidas para a construção de Angra 3. Nos bastidores comenta-se que a retomada das obras de Angra 3, dessa forma, entra no olho do furacão.
O empreendedor utilizou a paralisação da construção de Angra 3 para não cumprir diversas condicionantes socioambientais previstas na Licença Prévia n. 279/2008. Entre os descumprimentos destacam-se a omissão na responsabilidade sobre o custeio de manutenção da Esec Tamoios e do Parque Nacional da Bocaina, o investimento de R$ 50 milhões em saneamento em Angra dos Reis e Paraty. Outra condicionante é o investimento em programa de educação diferenciada, execução de programa de segurança com foco em atividades culturais e de inclusão no mercado de trabalho, ações direcionadas a indígenas, quilombolas e caiçaras e ações voltadas à comunidade de Angra dos Reis e Paraty, entre outras.
Na ação, o MPF alerta que o cumprimento das condicionantes da licença concedida em determinada etapa obrigatória para a concessão da licença necessária à etapa seguinte. Por isso, o cumprimento dessas condicionantes é fundamental para emissão da licença de operação da usina.
“Deve-se deixar assentado que a condicionante, assim como todas as outras explicitadas na licença prévia ou de instalação, não pode ser tratada pelo empreendedor como mera ilustração ou obrigação de menor importância, tampouco deve-se permitir que seu cumprimento possa ser diferido indeterminadamente no tempo, divorciado de qualquer cronograma que lhe garanta o efeito atendimento”, afirma o procurador da República.
Segundo ele, “não havendo o cumprimento ou ocorrendo o descumprimento de qualquer condicionante, a consequência jurídica inevitável deve ser a suspensão, o cancelamento ou a não renovação de qualquer licença eventualmente já expedida”. Ele quer a anulação das licenças para Angra 3 e a concessão de nova documentação. Pede, finalmente, que a Eletronuclear seja obrigada a apresentar ao Ibama o plano básico ambiental atualizado, com a demonstração objetiva do que já foi cumprido, e que a empresa seja condenada ao pagamento de multa por danos morais coletivos no valor de R$ 30 milhões.
Foto: UAS - Eletronuclear.
Tania sempre atualizando seus leitores com informações precisas e objetivas.
ResponderExcluirErika, agradeço a sua participação, sempre relevante. Seus comentários são um tremendo incentivo! Muito obrigada.
ExcluirMuito importante essa reportagem. Deveria estar nas primeiras páginas dos jornais, mas eles preferem as mazelas de nosso desgoverno, como se o meio ambiente não fosse algo, igualmente, prioritário. Parabéns, minha amiga.
ResponderExcluirGrande poeta, grande escritor e observador, com sensibilidade sempre motivando. A sua participação é muito relevante. Agradeço imensamente.
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