O grupo Nêutrons Politérmicos, da Escola Politécnica (Poli) da USP, foi o vencedor da categoria medicina nuclear nas Olimpíadas Nucleares Brasileiras de 2024, organizadas pela Associação Brasileira para Desenvolvimento de Atividades Nucleares (ABDAN). A competição teve início em abril deste ano e os vencedores foram anunciados no início de novembro, no evento Nuclear Summit 2024, com o desafio do tema Tratamento de câncer: como o Brasil pode avançar na implementação de novas tecnologias?.
“Optamos por participar na categoria de medicina por ser algo novo para nós e por não termos tanto contato com esse setor na graduação”, conta Luana Gomes da Silva, uma das integrantes do grupo, do curso de Engenharia de Materiais. A equipe ainda tem os estudantes Álvaro Sant’Anna Ferreira Neto, Enzo Yamamoto, João Pedro Oliveira Glóder Prado e Thais Kaori Yazawa, todos da primeira turma do curso de Engenharia Nuclear da Poli, ingressantes de 2021.
Eles desenvolveram a NPoli, um conjunto de softwares de agendamento de consultas médicas, exames e sessões de
radioterapia que visa reduzir as barreiras e acelerar as etapas do tratamento
nessa área da medicina. “Algumas das funções oferecidas pela plataforma são: o
Agendamento Inteligente de Radioterapia; Integração com Sistemas de Regulação e
Gestão de Exames; Painel de Controle para Médicos e Profissionais de Saúde; e
Notificações Automatizadas e Interatividade com Pacientes”, explica Luana.
Inspirada nas principais soluções privadas internacionais, como o Varian’s ARIA e a Elekta’s Mosaiq, e nos sistemas utilizados no SUS, como o Sisreg e o e-SUS APS, a NPoli apresenta uma interface simplificada, facilitando
o seu uso por diversos públicos, e integra-se aos sistemas de regulação de
saúde já existentes no Brasil. A ideia foi criar um sistema que se adaptasse à
realidade descentralizada do SUS, atendendo tanto a grandes centros quanto a
regiões menos favorecidas. Outro diferencial é que, ao contrário das soluções
privadas, o foco da NPoli está na inclusão e acessibilidade, facilitando a comunicação
com pacientes. A plataforma também oferece a possibilidade de gerenciar o uso
de recursos hospitalares, como máquinas de radioterapia, otimizando sua
utilização e reduzindo o tempo de espera.
Acesso desigual ao tratamento:
Atualmente, segundo o Ministério da Saúde, o câncer é a segunda principal causa de morte no Brasil, podendo se tornar a primeira em 2030. Com este cenário, se destaca a desigualdade no acesso à radioterapia, tratamento que atende 52% dos pacientes oncológicos na fase inicial. No Brasil, em que mais de 75% da população depende do SUS, apenas 25% dos atendimentos de medicina nuclear, essencial para o diagnóstico, são realizados pelo sistema público de saúde e cerca de 70% dos serviços de medicina nuclear e radioterapia se concentram nas regiões Sul e Sudeste.
Para desenvolver a plataforma, o
grupo passou por diversas etapas que incluíram testes, palestras e reuniões
mensais com mentores – indicadas pela ABDAN e divididas nas subáreas das
Olimpíadas – para direcionar o desenvolvimento das ideias e discutir
possíveis soluções. Os estudantes também tiveram a oportunidade de participar
de palestras com especialistas renomados do setor de radioterapia, que
trouxeram uma visão técnica e prática sobre os desafios dessa área no Brasil.
Ao longo do processo, os grupos tiveram que desenvolver um artigo científico e apresentar suas ideias e avanços em formato de pitches (apresentação curta em vídeo) para os mentores e coordenadores. “Não apenas adquirimos um conhecimento técnico aprofundado sobre a área de radioterapia, um campo até então desconhecido para nós, como também tivemos contato com a realidade enfrentada pelos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS)”, afirma Luana.
O projeto está no estágio de desenvolvimento de Produto Mínimo Viável e apresenta viabilidade econômica, com potencial de escalabilidade, alinhando-se aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. “Acreditamos que iniciativas como essa são fundamentais para conectar a ciência e a engenharia a soluções reais que podem impactar positivamente a sociedade”, afirmam os integrantes do grupo.
Olimpíadas Nucleares Brasileiras:
As Olimpíadas Nucleares Brasileiras têm duração de oito meses. Ao final, cada equipe apresenta um artigo científico escrito e um vídeo-pitch explicando a solução proposta. Um painel composto de cinco especialistas para cada tema analisa os artigos de acordo com critérios estabelecidos.
O objetivo é impulsionar a indústria nuclear ao promover a interação entre representantes da indústria, reguladores, academia e outros stakeholders (indivíduos e organizações impactados pelas ações de uma empresa). A competição cria bases para um ecossistema nuclear com resultados importantes para o Brasil e busca atrair jovens motivados e com potencial para serem os futuros gestores de projetos complexos na área nuclear.
Em 2024, a competição contou com um número recorde de participantes, com um total de 78 candidatos elegíveis de 29 universidades, distribuídos em oito estados e no Distrito Federal. Além do grupo da Poli, os vencedores da edição foram o NucleAtech – que propôs soluções para acelerar a construção de usinas nucleares – e a ANVerde – que buscou soluções para aumentar a sustentabilidade dos projetos de mineração de urânio.
As soluções vencedoras foram homenageadas no evento Nuclear Legacy 2024, organizado pela ABDAN, no Rio de Janeiro, nos dias 5 e 6 de novembro de 2024. Além disso, foram selecionadas para participar de um período de incubação durante seis meses, de março a setembro de 2025, no Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia (Cietec), localizado no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen). “Estamos determinados a dar continuidade ao desenvolvimento da plataforma, que acreditamos ter o potencial de transformar a realidade da radioterapia no Brasil”, conclui Luana.
(REPRODUÇÃO JORNAL DA USP – FOTO: CAROLINA BORIN – TEXTO -Estagiária sob supervisão de Thais H Santos e Claudia Costa) –
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