Além
da falta de recursos financeiros para finalizar as obras da usina nuclear Angra
3, em Angra dos Reis (RJ) e construir outras quatro no Nordeste, o governo tem mais
um nó para desatar: a carência de recursos humanos específicos e qualificados
para operar as centrais atômicas. Por conta das interrupções no programa
nuclear, não houve investimento visando à formação dessa mão de obra. Além
disso, muitos profissionais se aposentaram, enquanto outros entraram no
programa de demissão voluntária.
A Eletronuclear, gestora das usinas, contrata
cerca de 250 técnicos especializados estrangeiros para dar suporte nas paradas para
reabastecimento de combustível (urânio enriquecido) e manutenção de Angra 1 e
Angra 2. Foi o que aconteceu em abril, na parada de Angra 2, e vai acontecer em
janeiro, quando Angra 1 for desligada com o mesmo objetivo.
Em junho de 2020,
será a vez de Angra 2, com outra contratação de estrangeiros. Hoje, 21
estrangeiros e 64 brasileiros trabalham no projeto de extensão de vida útil de
Angra 1, a maioria da norte-americanos da Westinghouse, que vendeu a usina para
o Brasil em 1970.
Segundo a Eletronuclear, cerca de 600 empregados concursados
trabalham em cada uma das duas usinas. Os concursados para operar Angra 3 “foram
relocados em outras áreas da empresa por conta da paralisação das obras”.
BOLSAS DE ESTUDO
“A luz amarela” está ligada, comentou o diretor do
Departamento de Informações e Estudos Energéticos, do Ministério de Minas e
Energia (MME), André Luiz Rodrigues Osório, no 5º Seminário sobre Energia
Nuclear, realizado dias 26 e 27/11, na UERJ, no Maracanã (RJ). Segundo ele, que apontou a carência de
recursos humanos, apenas para operar, atuar na área de sistemas e manutenção,
serão necessários cerca de 500 profissionais altamente qualificados, que ainda terão
de ser formados. “São necessários oito anos, no mínimo, para se capacitar um
técnico operador”, observou.
“Nós perdemos muito capital humano”, acrescentou o
diretor do Ministério. A carência desse capital, ocorre também porque “ninguém
esperava” que as obras de Angra 3 fossem interrompidas durante mais de 20 anos.
Lembrou que a construção retornou em 2010, mas foi novamente paralisada em
2015, por falta de recursos, de denúncias de corrupção envolvendo a operação
“lava jato”, por exemplo.
Para o coordenador do Grupo de Estudos do Setor
Elétrico (Gesel), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), professor
Nivalde de Castro, que participou do seminário, uma das soluções para o
problema é a concessão de bolsas de estudos para capacitação nas diversas áreas
prioritárias do setor.
IMBRÓGLIO -
Angra
3 faz parte do acordo nuclear Brasil –Alemanha, firmado pelo Governo do general
Ernesto Geisel, em 1975, com a criação da extinta Nuclebras, considerada “elefante
branco”, que chegou a ter cinco mil empregados. Outras empresas, projetos e
seis usinas integravam o “pacote” do acordo, mas apenas Angra 2 começou a
operar comercialmente em 2001, com capacidade de gerar 1.350 megawatts (MW).
Angra
3 tem cerca de 60% de suas obras civis concluídas e os principais equipamentos
prontos, nas instalações da Eletronuclear, em Angra. A terceira usina já
consumiu cerca de R$ 7 bilhões e precisa de outros R$ 15 bilhões para ser
inaugurada em 2026, conforme o governo tem anunciado. Sem caixa, o governo
busca parcerias internacionais. A mais recente expectativa é de que as obras
comecem em 2020, se o imbróglio for resolvido. Técnicos do setor convivem
também com a expectativa de a holding Eletrobras seja privatizada.
IATO -
A falta de capital humano pode ir mais longe, abrangendo outras categorias
profissionais. “Os engenheiros que
fizeram Angra 1 e Angra 2 foram formados na década de 70”, comentou o diretor
da área de geração da Eletrobras, Pedro Jatobá. “Há todo esse iato desde a
década de 80”, observou. Para se ter ideia do tempo passado entre acordos e finalização
das obras, Angra 1, comprada na década
de 70, entrou em operação comercial em
1985, gerando 650 MW, quando funciona 100% sincronizada à rede elétrica. Naquela
época, houve grande impasse porque os EUA se negaram a vender o combustível
para a usina. O governo teve que comprar na África do Sul.
SEMINÁRIO -
O evento foi promovido pelo Programa de
Pós-Graduação em Geografia do Instituto de Geografia da Universidade do Estado
do Rio de Janeiro (IGEOG-UERJ), com correalização da Eletronuclear. Teve como
objetivo debater temas diversos, desde a geração de energia ao Programa de
Submarinos Nucleares, a retomada das obras de construção de Angra 3 e de novas
usinas no país, além de outros temas como a aplicação da radiação na medicina,
indústria e agricultura. Visava ainda estimular o interesse de novos
profissionais neste mercado de trabalho e incentivar o desenvolvimento
tecnológico e a inovação. Foi organizado pela Caa Viva em parceria com a
Pressway Produções.