terça-feira, 13 de outubro de 2020

Procurador da República move ação visando parar obras de UAS para armazenar urânio usado de Angra 1 e Angra 2, por falta de licenças ambientais


O Ministério Público Federal (MPF), através do procurador da República, Igor Miranda, acaba de ingressar na Justiça com ação civil pública requerendo a nulidade das licenças para a construção da Unidade de Armazenamento a Seco (UAS), destinada a guarda do combustível usado (urânio enriquecido) das usinas Angra 1 e Angra 2, em Angra dois Reis. Os órgãos licenciadores são a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). 

O procurador informou que o licenciamento obtido nos órgãos ambientais é simplificado, para empreendimentos de pequeno impacto, o que não é o caso da UAS, destinada a armazenar durante 45 anos o urânio já usado.  Na ação, o procurador requer a apresentação do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) para a construção da UAS. Segundo ele, a Eletronuclear, gestora da central nuclear e do UAS, alega que já existe RIMA para as usinas. “Mas não há para a UAS, outro empreendimento, que exige providências importantes pela guarda do urânio”. 

Na ação, o procurador requer novas licenças ao Ibama e a CNEN. Quer que a Eletronuclear paralise as obras até que a documentação seja apresentada. O descumprimento das medidas pode gerar multa de até R$ 18 milhões, de acordo com a ação.  A Eletronuclear não se manifestou sobre a ação. 

ESGOTAMENTO DAS PISCINAS - 

Informou há cerca de 30 dias que ela primeira vez, técnicos começariam a ser treinados este mês para a operação inédita de transferência de combustível usado de Angra 1 e Angra 2 para a UAS. A UAS custará cerca de R$ 246 milhões segundo a Eletronuclear. 

Com o esgotamento da piscina de elementos combustíveis irradiados de Angra 2, previsto para junho de 2021, a Eletronuclear, anunciou que pretende iniciar a transferência do material da usina dois meses antes (março). Já o esgotamento da piscina de Angra 1 está previsto para 2022. A transferência dos combustíveis usados da primeira unidade será no segundo semestre de 2021. 

A Eletronuclear garantiu na época, que não será necessário um esquema de segurança especial para a transferência, porque a UAS está localizada dentro da central nuclear de Angra. “Os canisteres (filtros de carvão) com elementos combustíveis usados serão retirados das usinas hermeticamente fechados, com as tampas soldadas”. 

A UAS está situada dentro da central nuclear de Angra. A instalação da UAS deve ficar pronta até o final deste ano. A estatal informou que a obra segue em ritmo acelerado, mesmo com a crise provocada pelo coronavírus. 

REPROCESSAMENTO – 

As piscinas de Angra 1 e 2 contam apenas com combustíveis usados. Esse material não é considerado rejeito porque ainda existe energia que pode ser aproveitada no futuro, por meio do processo de reprocessamento do combustível. A UAS é considerada um armazenamento complementar ao das piscinas existentes dentro das usinas. Os rejeitos de baixa e média atividade são armazenados em repositórios próprios, localizados dentro do terreno da central nuclear. 

A estatal informou que as obras civis estão avançadas, com trabalho seguindo até dezembro. As atividades envolvem a construção da laje principal e de um almoxarifado e a instalação de uma cerca dupla, de iluminação externa e de uma guarita. Também serão instalados sistemas de monitoração de temperatura e radiação. 

Os principais equipamentos da UAS já chegaram à central nuclear. Inicialmente, a UAS contará com 15 módulos. No total, 288 elementos combustíveis usados serão retirados de Angra 2 e 222, de Angra 1, o que abrirá espaço nas piscinas de armazenamento para mais cinco anos de operação de cada planta. A UAS poderá comportar até 72 módulos. A unidade está localizada dentro da central nuclear de Angra, fora da área das usinas. 

REJEITOS SÓLIDOS - 

A usina Angra 1, comprada da norte-americana Westinghouse, opera comercialmente desde 1985, já poderia estar desligada, mas há estudos para prorrogar a sua vida útil por mais 20 anos, com investimento de cerca de US$ 27 milhões. 

Angra 1 mantém 1.062 elementos combustíveis armazenados em sua piscina, dentro da usina.  Angra 1 já produziu 3.166 metros cúbicos de rejeitos sólidos (de baixa e média atividade), guardados em 7.602 tambores e caixas metálicas no Centro de Gerenciamento de rejeitos. 

Cada recarga de Angra 1 custava aproximadamente R$ 188 milhões, sem contar os investimentos com o transporte. Em 2018, o custo total da parada para a troca de combustível, incluindo mão de obra, era de cerca de R$ 80 milhões. Angra 1 produz 650 MW, quando funciona com 100% de sua potência sincronizada ao Sistema Interligado Nacional (SIN). 

Angra 2, comprada pelo acordo nuclear Brasil Alemanha, em 1975, entrou em operação em 2001. A segunda usina tem capacidade para gerar 1.350 MW.  Angra 2 mantém em sua piscina, 888 elementos combustíveis usados. Armazena 201 metros cúbicos de rejeitos sólidos, embalados em tambores e caixas metálicas. 

FERRUGEM EM INVESTIGAÇÃO - 

Em junho último, Angra 2 foi desligada para a troca de combustível (urânio enriquecido), mas precisou ficar desconectada do sistema um mês acima do previsto: foram detectadas oxidação (ferrugem) em elementos combustíveis. A Eletronuclear ainda não divulgou o que provocou o problema, que continua sendo investigado. Os elementos combustíveis são de responsabilidade da estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB) e da Urenco, consórcio de empresas da Inglaterra, Holanda e Alemanha. 

Angra 2 voltou a operar, usando elementos combustíveis de Angra 3, também alemã, cujas obras estão paradas desde 2015, por denúncias de corrução na operação “lava jato”.  

ANGRA 3 NO OLHO DO FURAÇÃO- 

O Ministério Público Federal (MPF) moveu outra ação civil pública contra a Eletronuclear e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) para obrigar o cumprimento das condicionantes socioambientais, sob pena de nulidade da Licença de Instalação nº 591/2009, concedidas para a construção de Angra 3. Nos bastidores comenta-se que a retomada das obras de Angra 3, dessa forma, entra no olho do furacão. 

O empreendedor utilizou a paralisação da construção de Angra 3 para não cumprir diversas condicionantes socioambientais previstas na Licença Prévia n. 279/2008. Entre os descumprimentos destacam-se a omissão na responsabilidade sobre o custeio de manutenção da Esec Tamoios e do Parque Nacional da Bocaina, o investimento de R$ 50 milhões em saneamento em Angra dos Reis e Paraty. Outra condicionante é o investimento em programa de educação diferenciada, execução de programa de segurança com foco em atividades culturais e de inclusão no mercado de trabalho, ações direcionadas a indígenas, quilombolas e caiçaras e ações voltadas à comunidade de Angra dos Reis e Paraty, entre outras. 

Na ação, o MPF alerta que o cumprimento das condicionantes da licença concedida em determinada etapa obrigatória para a concessão da licença necessária à etapa seguinte. Por isso, o cumprimento dessas condicionantes é fundamental para emissão da licença de operação da usina. 

“Deve-se deixar assentado que a condicionante, assim como todas as outras explicitadas na licença prévia ou de instalação, não pode ser tratada pelo empreendedor como mera ilustração ou obrigação de menor importância, tampouco deve-se permitir que seu cumprimento possa ser diferido indeterminadamente no tempo, divorciado de qualquer cronograma que lhe garanta o efeito atendimento”, afirma o procurador da República. 

Segundo ele, “não havendo o cumprimento ou ocorrendo o descumprimento de qualquer condicionante, a consequência jurídica inevitável deve ser a suspensão, o cancelamento ou a não renovação de qualquer licença eventualmente já expedida”. Ele quer a anulação das licenças para Angra 3 e a concessão de nova documentação. Pede, finalmente, que a Eletronuclear seja obrigada a apresentar ao Ibama o plano básico ambiental atualizado, com a demonstração objetiva do que já foi cumprido, e que a empresa seja condenada ao pagamento de multa por danos morais coletivos no valor de R$ 30 milhões. 

Foto: UAS - Eletronuclear.

4 comentários:

  1. Tania sempre atualizando seus leitores com informações precisas e objetivas.

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    1. Erika, agradeço a sua participação, sempre relevante. Seus comentários são um tremendo incentivo! Muito obrigada.

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  2. Muito importante essa reportagem. Deveria estar nas primeiras páginas dos jornais, mas eles preferem as mazelas de nosso desgoverno, como se o meio ambiente não fosse algo, igualmente, prioritário. Parabéns, minha amiga.

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  3. Grande poeta, grande escritor e observador, com sensibilidade sempre motivando. A sua participação é muito relevante. Agradeço imensamente.

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