domingo, 11 de dezembro de 2022

Cerca de 600 vítimas do cancerígeno amianto têm seus nomes gravados na História: Osasco inaugura memorial

 


As cerca de 600 vítimas do cancerígeno amianto foram homenageadas neste sábado (10/12), em Osasco, São Paulo, com a inauguração de um memorial criado pelo artista brasilense W. Hermusch, que reuniu representações do Brasil e do mundo. A criação do memorial foi uma parceria da Prefeitura de Osasco, por meio da Secretaria de Emprego, Trabalho e Renda (SETRE), com a Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (ABREA). O memorial é uma escultura chamada “Árvore-Pulmão”, que materializa metaforicamente a luta pela vida de milhares de vítimas do mineral, que no final da vida não conseguem mais respirar em virtude das doenças provocadas pela fibra mortal. 

“É com imensa emoção que estamos aqui inaugurando esta obra, que representa muito para todos nós do movimento anti-amianto. Ela é majestosa e cheia de significado, pois além de homenagear nossos amigos mortos,  celebra a vida, que tanto nossos heróis buscaram em suas lutas diárias contra as terríveis doenças do amianto”, comentou a engenheira civil e de Segurança do Trabalho, Fernanda Giannasi, uma das fundadoras da ABREA, ativista reconhecida internacionalmente por seu trabalho pelo banimento do amianto, que lhe conferiu o Prêmio Faz a Diferença de O Globo de 2017. 

Giannasi também destacou: “Foi a luta destes heróis que tombaram envenenados por esta fibra maldita que é o amianto, assassinados por empresas inescrupulosas que, quando se instalaram em nosso país, já sabiam de sua nocividade, aproveitando-se da boa-fé de nossa gente e, mais ainda, contando que, pelo nosso atraso tecnológico, subserviência e dependência econômica, não iríamos nos contrapor à sua produção suja e perigosa”. 

Além da Árvore-Pulmão, com sete metros de altura, o Memorial em um painel com o nome de mais de 600 pessoas que morreram em virtude da exposição ao amianto. “Nesta tragédia do amianto, os obreiros entregavam inocentemente o seu cotidiano ao trabalho, que acreditavam estar garantindo o seu sustento e de suas famílias e, por conseguinte, a vida. A cada dia, entretanto, estavam sendo lentamente envenenados. Esta contradição cruel é o que a Árvore-Pulmão expressa”, lembrou Hermusch. 

O Memorial está instalado na Praça Expedicionário Mario Buratti, nas proximidades de onde se situava a Eternit, a maior das unidades da multinacional suíça nas Américas, conhecida produtora de telhas, tubulações, caixas d'água e outros artefatos de cimento-amianto, e que permaneceu na cidade por 56 anos, entre 1937 a 1993, deixando para trás um enorme passivo socioambiental, um legado de contaminação e morte, como fez em vários países, principalmente Itália e Bélgica. O local escolhido para plantar esta ÁRVORE-PULMÃO foi em frente de onde se instalou a maior fábrica do grupo suíço-belga, ETERNIT, fora da Europa.

 “Era sua galinha dos ovos de ouro! Numa área de 150 mil metros quadrados, explorando nossos fartos recursos naturais, instalaram-se em 1939 e por aqui ficaram 54 anos, deixando-nos uma herança maldita de doenças e rejeitos da produção de cimento-amianto espalhados por aí. Vira e mexe alguém nos traz pedaços de telhas quebradas encontradas nos cursos dos rios, em especial o Buçocaba, tão próximo de nós e que desagua no Tietê, depois de percorrer seus 5 km, e onde a ETERNIT despejava sem pruridos seus resíduos tóxicos a céu aberto, poluindo nossos cursos d´água como fazia diuturnamente com o nosso ar, sem se preocupar se isto poderia causar impactos ao meio ambiente ou produzir doenças”, relembrou Giannasi. 

Para a ativista, a inauguração do memorial é um marco: “É o momento de celebrarmos juntos aos familiares e ex-empregados da Eternit, Brasilit, Lonaflex, Thermoid e de tantas outras empresas que se utilizaram do cancerígeno amianto e que permanecem impunes, utilizando-se de todos os subterfúgios e da morosidade de nossa Justiça para fugir de suas responsabilidades de tratar e indenizar suas vítimas”. Segundo ela, a data da inauguração não foi escolhida por acaso: “É a celebração em todo o mundo do Dia Internacional dos Direitos Humanos. Será o quinto Memorial das Vítimas do Amianto em todo o mundo, onde as vítimas deixarão definitivamente de ser meros números de estatísticas de doenças profissionais do INSS e nunca mais anônimos”. 

O secretário de Emprego, Trabalho e Renda de Osasco, Gelso Lima, também lamentou: “É uma tristeza sermos conhecidos como a capital nacional das vítimas do amianto, e em nada este memorial repara a perda dessas vidas, mas nossa intenção é eternizar seus nomes num espaço público para que sirvam de exemplo e que suas famílias saibam que reconhecemos a luta. Quem sai de casa todo dia em busca do sustento do lar, e morre em função do trabalho que desempenha, é um verdadeiro herói, e nada mais justo que haja um memorial em homenagem a isso”. 

Para o presidente da ABREA, Eliezer João de Souza, o Memorial visa manter viva a memória destas vítimas inocentes e representa um símbolo de resistência e luta contra o mineral que mata milhares de pessoas anualmente, não só no Brasil como em todo o mundo. “'É mais um momento histórico na luta contra o amianto, contra empresas, contra o capital, que visam apenas o lucro em detrimento da saúde e vida de seus trabalhadores. O Memorial é uma homenagem aos que se contaminaram com a fibra assassina e um alerta para as futuras gerações, para que possam evitar que tragédias como essa não se repitam. Essa catástrofe sanitária do século XX não pode se repetir”, finalizou. 

FOTO: INAUGURAÇÃO MEMORIAL – ABREA – 

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