Pouco lembrado nesses dois anos de pandemia (COVID-19), o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP) saiu do ostracismo para ser revisto em sua 10* Conferência de Revisão, em Nova Iorque, iniciada ontem (4/1/2022), que irá até o dia 28. Registro o atraso de dois anos, quando deveria ser relembrada a sua entrada em vigor, em 1968.
Trata-se de uma reunião, no âmbito do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas - ONU, incluindo os cinco países Mais Iguais e que são membros permanentes deste Conselho, bem como detentores dos maiores arsenais nucleares do mundo e os primeiros a assinar o referido tratado. Estes países detêm arsenais contendo as seguintes quantidades aproximadas de ogivas nucleares, em 2021, com as respectivas datas das primeiras detonações:
Estados Unidos da América: 5.550, ogivas (primeira detonação, 1945, sendo o único país a usá-las militarmente, na Guerra contra o Japão); República Federativa da Rússia: 6.255 ogivas (primeira detonação, 1949); Reino Unido: 225 ogivas (primeira detonação,1952); França: 290 ogivas (detonação, 1960); e República Popular da China: 350 ogivas (primeira detonação, 1964).
O norte americano Linus Pauling, especialista em química quântica e ganhador de dois Prêmios Nobel, de Química e da Paz, este último pela sua campanha contra as armas nucleares, mas acreditando sempre nos usos pacíficos desta forma de energia, há mais de 70 anos, dizia: “Acredito que logo se reconhecerá que a descoberta da fissão controlada de núcleos atômicos é maior de todas, desde o uso controlado do fogo, pelo ser humano primitivo”.
Quando criado, o TPN tinha como objetivo restringir a detenção de armas nucleares aos cinco sócios atletas, mas, atualmente, o desenvolvimento de armas nucleares se encontra longe de tais preceitos, uma vez que seus detentores dobraram nestes 50 anos, conforme a seguinte cronologia e o número de ogivas de cada um: Índia: 156 ogivas (primeira detonação,1974); Paquistão: 165 ogivas (primeira detonação, 1998); Israel: não confirma, nem desmente a posse de 90 ogivas; África do Sul: teria desenvolvido mais de dez ogivas, mas desativou-as, antes do fim do regime do Apartheid; e Coréia do Norte: 40 a 50 ogivas (primeira detonação, 2006).
Atualmente, o TNP tem 191 signatárias, incluindo os cinco primeiros membros com assento permanente no Conselho de Segurança da ONU.
Após o lançamento do TNP, havia um sentimento antinuclear muito intenso, ainda, como consequência das bombas de Hiroshima e Nagasaki, que chocaram o mundo. Com o TNP pensou-se que o Tratado iria extinguir as armas nucleares, porém isto não aconteceu com a adesão de novos dez sócios no Clube Atômico.
Adicionalmente, países como a França, que não aderiu ao Tratado, em um primeiro momento, continuou a modernizar e expandir seu arsenal, inclusive incentivando o Iraque de Sadam Russein a seguir esta trajetória.
Depois um acordo entre EUA e Rússia contribuiu para a redução de ogivas nos dois países, porém desequilibrado pelo crescimento do arsenal chinês e da entrada da Coréia do Norte no Clube Atômico.
Por outro lado, o fim da Guerra Fria, com a extinção da União Soviética, seria um sinal da diminuição dos arsenais nucleares. Porém, EUA, Rússia, Grã Bretanha, China e França continuaram a aumentar seus arsenais.
A previsão do TNP de reduzir a quantidade de armas nucleares aconteceu de forma quantitativa, pois tanto EUA, quanto a Rússia reduziram seus arsenais, mas investiram em armamentos muito mais potentes, em termos de capacidade de destruição.
Outras premissas do Tratado não realizadas se referem à proteção dos países desnuclearizados, bem como a disponibilização da tecnologia para fins pacíficos para estes países. Uma das principais razões para o fracasso da implementação do TNP foram os casos de França e China que continuaram a aumentar suas capacidades de detenção de ogivas nucleares, induzindo, talvez, a entrada da Coreia do Norte a associar-se ao Clube Atômico.
O Governo Barack Obama enfraqueceu muito o TNP, quando minimizou as autoridades da ONU e da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) na questão do Programa Nuclear Iraniano, criando uma entidade não oficial, o P5+1, composta pelos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU e a Alemanha, para iniciar um diálogo com Teerã. Posteriormente, o Governo Trump iniciou negociações com a Coréia do Norte, sem sequer considerar o P5+1, o que deixou, ainda, mais incerta as negociações sobre desarmamento.
Esses 52 anos da criação do Tratado deverá ser uma ocasião para uma reflexão sobre o seu fracasso de inibir a difusão de armas nucleares e não propiciar o desmantelamento dos arsenais, então existentes. Nesse momento, não sabemos se estamos, ou não, diante de uma nova corrida armamentista, que poderia liberar armas nucleares para dezenas de países que detêm capacidade tecnológica para tanto.
A despeito da capacidade terrestre de deter um número de ogivas nucleares capazes de causar uma hecatombe universal, os otimistas seres humanos estão centrados em consequências catastróficas de mudanças climáticas. As mudanças, como sabemos, poderiam comprometer a vida na Terra, devido à emissão de gases provenientes das atividades humanas, que causariam um aquecimento terrestre de cerca de 1,5 graus centígrados, na temperatura do Planeta., até o fim deste século.
Olga Simbalista: engenheira eletricista e nuclear, com mestrado em energia nuclear, ex-presidente da Associação Brasileira de Energia Nuclear (ABEN) e membro do Board of Directors of the American Nuclear Society - Fontes: Associação de Controle de Armas Nucleares e Gatestone Institute.
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Olga, parabéns pelo seu artigo, lúcido e didático.Espero que seja muito util para a formação dos mais jovens, que ora se iniciar nesta maravilhosa tecnologia.
ResponderExcluirObrigada por comentar. Agradecemos a sua participação.
ExcluirSó mesmo a sempre atenta e brilhante Olga Simbalista para dissecar a farsa do TNP e sua trajetória decepcionante...
ResponderExcluirAgradecemos a sua participação! Participe sempre!
ExcluirSó mesmo a sempre atenta e brilhante Olga Simbalista para dissecar a farsa do TNP e sua trajetória decepcionante...
ResponderExcluirA brilhante Olga Simbalista de maneira ssertiva demonstra o risível TNP do qual o Brasil, infelizmente e de forma servil, assinou se curvando a interesses menores.
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